A Banda Filarmónica da Sociedade Pedrista
A história das Bandas Filarmónicas
em Portugal está intimamente ligada à história do
movimento associativo, que brotou da Revolução Liberal Portuguesa, ocorrida no
Porto em 24 de Agosto de 1820, que decretou uma Constituição que eliminava as
estruturas do absolutismo e construía uma nova ordem social e política, assente
na igualdade dos homens perante a lei e na soberania da Nação.
As ideias liberais fizeram germinar
por todo o país, as populares Bandas Filarmónicas, que desde então, começaram a
ser vistas como peças fundamentais do nosso Património Cultural.
A alusão mais antiga, feita a uma
banda filarmónica do concelho de Montemor-o-Novo, refere a "Filarmónica
Montemorense", fundada em 1830, para abrilhantar uma festa religiosa.
Face ao desaparecimento de alguns
dos seus componentes, e à velhice dos poucos que restavam, em 30 de Junho de
1861, um outro grupo apareceu como continuador do primeiro, desta vez,
constituindo-se em sociedade, legalmente organizada, ficando a chamar-se
"Sociedade Antiga Filarmónica Montemorense". Foi uma forma simpática
de homenagear a primitiva filarmónica.
Pelo facto de ter sido Carlos o seu
primeiro regente, diz-se, veio depois à filarmónica a alcunha de
"Carlista", nome com que, mais vulgarmente passou a ser conhecida. Dentro da sua sede, a única
divisa era somente a política musical. Dentro deste basilar princípio,
progressistas, regeneradores, republicanos e socialistas, esqueciam os seus
credos políticos e partidários, e apenas actuavam no campo da sua agremiação
musical, a sua Sociedade Filarmónica. Mas, foi irmandade de pouca duração.
No Portugal oitocentista, a vida
política era bastante conturbada, pois os Partidos Progressista e Regenerador
alternavam-se no poder, e as acesas lutas a nível das cúpulas, estenderam-se
por todo o país. Não obstante, os estatutos da Sociedade Filarmónica proibirem
quaisquer discussões menos dignas que, por palavras ou gestos, possam afectar a
moral, as crenças religiosas ou políticas dos seus sócios, alguns associados
transportaram as suas opções políticas para a colectividade, causando um mau
ambiente. Fruto desta situação, um grupo de sócios abandonou a colectividade,
que funcionava na Rua Nova, no edifício onde hoje se encontra a Óptica
Havaneza, e começou a trabalhar, no sentido de formar uma nova agremiação, com
banda filarmónica.
Enquanto na "Carlista"
ficaram as tendências liberais mais conservadoras, na nova colectividade
baptizada de “Círculo Montemorense”, integraram-se membros mais progressistas.
Por meio de acções conseguem os
progressistas construir um soberbo edifício para sede do "Círculo Montemorense",
também conhecido por "Pedrista". Esta designação, deve-se, segundo
consta, ao nome do seu primeiro mestre musical se chamar Pedro. A primeira sede
da Pedrista foi inaugurada em 28 de Junho de 1864, e em 1888 o edifício passou
a ser propriedade da Carlista...
Três anos depois de terem ficado sem
sede, a Pedrista inaugura em 29 de Janeiro de 1891 um luxuoso edifício-sede,
que ainda hoje permanece inalterado.
A guerra entre as duas
colectividades, ainda agora começou, mas o seu resumo, não cabe no texto deste
artigo. Os interessados em conhecerem este longo historial do associativismo
montemorense, podem consultar o meu livro "Sociedade Carlista - pedaços da
sua história".
Depois deste preâmbulo, segue-se um
pouco do percurso da Banda da Pedrista: A Banda, participou regularmente em
vários eventos, concertos, touradas, arruadas e festas religiosas,
principalmente na Vila Notável e também no centro e no sul do país, e ainda, em
encontros e concursos de bandas. No Concurso de Bandas Civis realizado em
Reguengos de Monsaraz em 25 de Agosto de 1935, sob a regência de Henrique Cruz,
a banda filarmónica montemorense obteve o 2.º lugar. O Diploma que testemunha
este feito, encontra-se exposto na Sala da TV da Pedrista (parte da antiga sala
de ensaios).
Em 1937, no tempo do seu laureado
regente Serra e Moura (cuja foto se encontra na mesma sala), a Banda com 42
elementos, foi premiada numa deslocação a Lisboa, onde participou num certame
de Bandas Civis.
Faz ainda parte do seu historial a
actuação na inauguração do Estádio 1.º de Maio do Grupo União Sport em 1 de
Maio de 1927, e na inauguração do coreto do nosso Jardim Público, em 1 de Janeiro de 1933. Mas, a cereja em
cima do bolo foram os concertos realizados em Lisboa: três concertos executados
na Grande Exposição Industrial Portuguesa realizada no Parque Eduardo VII em
Novembro de 1932, e um concerto realizado na antiga Feira Popular em Setembro
de 1946 sob a regência do Maestro Luciano Graça.
Participação da Grande Exposição
Industrial Portuguesa – A Banda do Círculo Montemorense e as centenas de
pessoas que a acompanharam desde Montemor, chegaram à estação de Lisboa cerca
das 14,00 horas do dia 7 de Novembro de 1932. No Formosíssimo hall da estação e
no largo fronteiro eram os viajantes esperados pelos montemorenses residentes
em Lisboa, e que, para homenagearem a Banda, se tinham reunido, dias antes, no
Grémio Alentejano.
Após os cumprimentos e os abraços
entre tantos amigos que há muitos anos não se viam, a Banda, acompanhada pelos
directores da Sociedade, Senhores Luís Leal Pires, Júlio Guerra Pereira,
Horácio Macedo e Agostinho Lopes Borges, e por uma grande multidão, dirigiu-se,
pela rua Augusta e Rossio, para a sede do Grémio Industrial (actual Casa do
Alentejo), executando durante o percurso, magníficos passo-dobles. A passagem
da Banda pelas principais artérias de Lisboa constituiu um sucesso, e, por
isso, a larga rua de Santo Antão se encheu completamente de povo.
Às janelas do Grémio Literário havia
dezenas de senhoras da colónia Alentejana de Lisboa, que deram uma estrondosa
salva de palmas à chegada da Banda.
A Direcção da Sociedade, e o
regente, Senhor Henrique Cruz, receberam, numa das salas do grémio, os
cumprimentos da importante colectividade, que lhe foram apresentados pelos
ilustres directores, Senhores Dr. Estanislau de Almeida e Vítor Santos. Depois
da visita às esplêndidas instalações do Grémio, que a todos maravilhou pela sua
sumptuosidade, a Banda deu um soberbo concerto no Salão Nobre, executando o
seguinte programa: Lisboa, Marcha, H. Cândido; Loin da Pays, Ouverture, Herman;
Cantos do Alentejo, Moraes; Les Cloches de Corneville, Planquete; Marcha
Indiana, Selenik; Pepita Gréns, P.D. Chovi.
A assistência, que era composta por
centenas de alentejanos, aplaudiu calorosamente os filarmónicos e o seu
regente, que também recebeu os cumprimentos de músicos militares, ilustres pela
sua categoria, como os maestros Senhores Tenente Armando Fernandes, Capitão
Pinto Nogueira e outros.
Num dos intervalos do concerto, o
Senhor Dr. Estanislau de Almeida, em nome do grémio, saudou a Banda do Círculo
Montemorense.
. A assistência aplaudiu com entusiasmo o
orador, a quem respondeu, em nome da Banda do Círculo Montemorense, o Senhor
Cipriano d’ Oliveira Barreto que apreciou, num improviso magnífico, a obra
notável do grémio em favor da nossa
província, e o acolhimento carinhoso que os montemorenses tinham recebido.
No Salão de Baile foi oferecido,
após o concerto e pelos montemorenses residentes em Lisboa, um excelente “Porto
de Honra” e “champanhe”.
O Senhor Leopoldo Nunes, falando em
nome da comissão, pronunciou um discurso primoroso, pelas ideias e pelo recorte
literário. Saudando a Banda do Círculo e todos os montemorenses que tinham ido
a Lisboa, acentuou que os seus companheiros só viam neles a terra querida,
aquele Montemor onde tinham perdido as
mais lindas ilusões da mocidade e onde pessoas amadas vibravam na mesma
ternura e saudade.
Analisou, em seguida, o movimento
social, para destacar a importância de todos os núcleos, mutualistas ou
recreativos, que abracem todos os homens no mesmo propósito de cooperação para
o bem estar geral. Recordou alguns nomes de grandes amigos de Montemor-o-Novo e
da Banda do Círculo, que a morte levou, e concluiu, vivamente apoiado pela
assistência, desejando que todos os montemorenses, sem distinção de credos e de
ideologias políticas, se unam para que Montemor-o-Novo retome a direcção do
brilhante destino a que tem direito.
O discurso do Senhor Leopoldo Nunes
causou grande sensação, ouvindo-se muitos vivas a Montemor-o-Novo, ao seu
progresso e à união de todos os montemorenses.
Falou depois, novamente, o Senhor
Dr. Estanislau de Almeida, para saudar a linda e importante vila de
Montemor-o-Novo, onde esteve tantas vezes quando novo, e para destacar a superioridade
artística da Banda do Círculo, e a influência que a música tem na vida social
dos povos.
O Senhor Padre Lopes Manso, distinto
poeta e grande alentejano, fez uma prelecção interessante sobre o sentido
musical dos alentejanos que não é mais do que o reflexo da harmonia, que se
observa em todo o Alentejo.
O Senhor José Gregório de Almeida,
ilustre poeta e publicista, como montemorense, recordou a nossa Terra num
magnífico feixe de imagens literárias, de belo conceito e pureza de forma.
O Senhor Luís Fragoso Amado, propôs
uma saudação à Imprensa de Lisboa e do Alentejo, sendo calorosamente secundado.
Por último, o Senhor Cipriano de
Oliveira Barreto, em nome da Banda e de Montemor-o-Novo, agradeceu as belas
palavras que ouvira, em louvor da sua Terra e dos seus patrícios.
Com muitas palavras e vivas se
encerrou, cerca das 19,00 horas, a encantadora festa, que foi, sem favor, uma
das mais importantes, que se têm realizado no Grémio Alentejano.
Os concertos da Banda do Círculo
Montemorense foram calorosamente aplaudidos – À noite, e no Pavilhão de Honra da Exposição (actual Pavilhão Carlos
Lopes), perante um público bastante numeroso, apesar da chuva abundante e do
frio, a Banda do Círculo Montemorense deu o melhor concerto, de quantos ali se
têm dado até agora. Além das manifestações de carinho da assistência, os
filarmónicos e o seu regente foram homenageados, pelo Comissário da Exposição,
Senhor Major Melo Vieira.
Na terça feira, de manhã, a Banda,
com o Estandarte, os Directores da Sociedade e muitos montemorenses,
dirigiram-se ao cemitério do Alto de S. João, a fim de deporem ramos de flores
na campa do saudoso maestro Francisco Maurício de Magalhães, autor do Hino da
Sociedade Pedrista. Leopoldo Nunes pronunciou
algumas palavras de saudade. Houve lágrimas em todos os olhos e fez-se justiça
ao antigo regente da Banda do Círculo Montemorense e ao grande amigo do
progresso e bom nome de Montemor-o-Novo.
À tarde, e à noite, a Banda da
Pedrista deu mais dois concertos no recinto da Exposição, sendo, de ambas as
vezes, aplaudida com entusiasmo por uma grande multidão.
Antes de ser iniciado o concerto da
noite, foi oferecido pelo Comissário da Exposição, Senhor Major Melo Vieira,
uma linda batuta, com dedicatória ao regente da Banda, Senhor Henrique Cruz.
Na quarta feira, no Salão Nobre do
Grémio, foram, oferecidas, pela sua Direcção, para serem colocadas no
estandarte da Banda, duas lindas fitas, como recordação da ida a Lisboa da
Banda Pedrista.
A Banda retirou-se para
Montemor-o-Novo no comboio de quarta feira à noite, tendo à sua despedida em
Lisboa sido alvo de mais uma grande manifestação por parte dos montemorenses
residentes na capital.
À sua chegada à Vila Notável, era
aguardada por muito povo, que a acompanhou até à sua sede.
No dia 4 de Outubro de 1950, após a
participação na Procissão que conduziu as venerandas relíquias de S. João de
Deus que vieram propositadamente de Granada, da Igreja Matriz até ao Hospital
Infantil, a Banda da Sociedade Pedrista suspendeu a sua actividade ao fim de
oitenta e seis anos de existência, para nunca mais a retomar.
Quando das comemoraçõe do centenário
da Pedrista, a Direcção organizou um
almoço de homenagem aos antigos filarmónicos que honraram a farda da
desaparecida Banda Filarmónica.
Mas, vinte e oito anos depois desta
justa homenagem, só restam três filarmónicos: Mestre José Salgueiro (prestes a
completar 100 anos de idade), seu irmão João, e Nicolau Catita. Porque não,
homenagear estes Sócios de Mérito, na próxima Sessão Solene comemorativa do 128.º
aniversário da Pedrista ?
Augusto Mesquita - in Folha Montemor Maio 2018 - transcrição autorizada pelo Autor
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