«AS DUAS TRAIÇÕES DE GERALDO
(Geraldo Geraldes, o “Sem Pavor”
É esta então a história de Geraldo, o
cristão que, á frente do seu grupo de salteadores, conquistou muitas povoações
que estavam em poder dos muçulmanos e mantinha os muçulmanos aterrorizados com
as suas investidas. Mas, antes de mais, fique-se a saber como Geraldo actuava
com seus homens. Ele escolhia sempre as noites frias e chuvosas, caminhando
debaixo da chuva e da neve para atacar as cidades de surpresa.
Era assim que, carregando altas escadas
de madeira, o seu grupo de salteadores se aproximava das muralhas da cidade sem
ser apercebido. Encostavam então as escadas aos muros e Geraldo era o primeiro
a subir e a surpreender o vigia muçulmano que, confiado, estava mergulhado no
sono. E Geraldo, que falava perfeitamente a língua árabe, dominava o vigia e,
sob a ameaça da morte, obrigava-o a repetir as palavras de vela, como se tudo
estivesse tranquilo e não ocorresse nenhuma novidade que pudesse alertar a
guarnição do castelo.
E quando todos repousavam confiados, os
homens do bando de Geraldo, a que por sua temeridade alcunhavam de “Sem Pavor”,
encostavam silenciosamente as escadas aos muros e por elas subiam sem serem
ouvidos e uma vez que chegavam ao cimo da muralha davam uma terrível grita de
terror e entravam na cidade, apanhando de surpresa os moradores, chacinando todos
que encontravam e uma vez dominados os defensores saqueavam o que podiam
arrastando consigo presas e cativos.
E foi assim também que Afonso
Henriques, o Senhor de Coimbra, operou para conquistar a rica cidade de
Santarém, no ano de 1147, quando, depois que a entrou com os seus, fez grande
mortandade entre homens, mulheres e moços e o sangue era tanto pelas ruas que
parecia um rio, o que aconteceu em 1147. E
foi assim que, duas dezenas de anos depois, Geraldo tomou a opulenta
cidade de Évora e Cáceres e Trjillo. E tomou Montánchez e Serpa e Juromenha, castelo em que se instalou.
E ainda no ano de 1168, o galego Geraldes
atacou Badajoz que pretendia tomar e obrigou as tropas do governador Abu Ali
Omaribne Temecelite a buscarem refugio na alcáçova. E Geraldo depois chamou em
seu auxílio o Senhor de Coimbra, mas este acabou por ser aprisionado por
Fernando, o Baboso, rei de Leão. E Geraldo foi feito também prisioneiro pelos
Castelhanos, mas foi libertado dando em troco alguns castelos que tinha
conquistado aos Almoádas.
E dizem que o galego Geraldo, tendo
estabelecido o seu poder em Juromenha, continuou
a tentar apossar-se da cidade de Badajoz, tendo travado muitas batalhas e
combatido os socorros que chegavam de Sevilha, ajudado de moçárabes e dos
habitantes da cidade de Santarém que agora estava em poder dos cristãos. E
assim continuou Geraldo a atacar o poder
almoáda, até que, dizem por grandes desavenças com Ibne Arrinc, o senhor galego
de Coimbra, Geraldo Sem Pavor, se foi por ao serviço do califa Iuçufe, que
então governava em Sevilha.
Geraldo em Sevilha, com os seus homens,
submeteu-se a Iuçofe, renegando dos cristãos e de Ibne Arrinc, coisa de que
este teve muito pesar. Depois o príncipe dos crentes partiu para Marraquexe,
levando consigo estes cristãos, mandando-os instalar no Suz, junto à costa do
mar. Mas dizem que daí Geraldo se começou a cartear com o senhor galego que
estava em Lisboa, mas o correio foi interceptado.
E depois que isto soube, o califa
mandou chamar Geraldes a Marraquexe e depois mandou-o para Drá, escrevendo-lhe:
«Quando te enviar Geraldo e os seus companheiros, reparte os seus homens pelas
tribos. E quanto a Geraldo mata-o porque está provada que me fazia traição.»
Chegando ele a Drá, Muça, o governador, mandou cortar a cabeça a Geraldo, como
lhe tinha ordenado o príncipe dos crentes. E dizem que isto sucedeu no ano de
1174.»
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