EDUARDO LUCIANO
O ESPAÇO PÚBLICO E A CONSPURCAÇÃO PRIVADA
A partir de uma determinada altura deixei de utilizar as redes
sociais como forma de tornar públicas as minhas opiniões, gostos e emoções.
Passei
a usar a minha página pessoal apenas para tornar pública esta crónica e para
partilhar acontecimentos públicos que entendo serem de realce.
Há
uns dias não resisti e fotografei uma funcionária municipal que varria uma
montanha de beatas que acumulou com um soprador, para valorizar a sua função e
questionar as pessoas que conspurcam o espaço público com um simples gesto.
A
propósito desta minha tentação li os mais díspares comentários e recebi as mais
diversas sugestões.
Desde
a crítica aos cidadãos que tratam o espaço público como espaço de ninguém até
aos que culpam a câmara por não disponibilizar cinzeiros fixos ou mesmo
portáteis como se vê, segundo alguns, naquele sítio mítico onde tudo é bom. O
estrangeiro.
Depois
muita gente veio sugerir que se aplicassem coimas aos prevaricadores, o que
pressupunha a existência de um ou dois fiscais para cada fumador e a instalação
de um regime policial que permitiria controlar todos os que atiram lixo para o
chão, colocam os sacos ao lado do contentor, urinam nas esquinas ou danificam o
património propositadamente.
Percebo
que pareça mais eficaz o recurso à coerção quando parece incrível que alguém
suje o espaço público sem se questionar sobre o efeito que essa atitude tem na
qualidade de vida de todos. Mas ainda que tal fosse possível será que seria
desejável a instalação de um regime policial ainda que para um fim que parece
bondoso?
Também
houve quem sugerisse a distribuição gratuita de cinzeiros portáteis para evitar
a tentação de atirar as beatas para o chão.
Não
sei se funcionará esta sugestão, mas se fosse eficaz talvez devêssemos também
distribuir umas mochilas em forma de contentor para distribuir pelos cidadãos
que atiram papéis para o chão ou um escarrador portátil para colocar ao pescoço
de quem cospe para o chão.
Sem
por em causa a bondade de sugestões e críticas parece-me que a questão central
não está na disponibilização de material de recolha e ainda menos na
distribuição de fiscais e policias pelas ruas aplicando coimas.
A
questão fundamental encontra-se na percepção de que o espaço público tem dono e
que o dono somos todos nós. Não estou a imaginar alguém apagar o cigarro no
chão da sua casa apenas porque não há cinzeiro disponível ou cuspir para o chão
da sala porque não existe recipiente próprio para o efeito.
Por
muito estranho que pareça a solução está na educação pelo respeito do espaço de
todos. Bem sei que nesta sociedade que híper valoriza a propriedade privada
essas coisas são secundárias e da responsabilidade de alguém que, de
preferência, possamos criticar de forma genérica e anónima.
Também
houve quem dissesse que a culpa morre solteira, porque ninguém quer ser
responsável pela situação. Lamento mas aqui a culpa não morre solteira. O
culpado de uma beata ir parar ao chão é de quem a atira e os culpados de
existir lixo à volta dos contentores é de quem lá o coloca.
A
eficácia ou existência de medidas dissuasoras podem e devem ser corrigidas, mas
a sua existência ou ausência não afasta ou privilegia a culpa de ninguém.
Até
para a semana
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