A distopia é um conceito
filosófico que se aplica a uma sociedade imaginária controlada por meios
extremos de opressão, normalmente criando condições de vida insuportáveis aos
indivíduos e que tem como modelo a realidade da sociedade, idealizada num
futuro que, por definição, é incerto. São não-lugares povoados por seres e
coisas de lugares. De uma forma mais simplificada, e saindo até do domínio da
ficção literária e cultural que é bastante rica em, poderíamos
aplicar o termo àquilo que é feito fora de um contexto real e previsível de uma
norma de costume, e num contexto apenas imaginável num mundo de fantasia.
Olhem, como o PSD votar contra a diminuição da TSU para as empresas, por
exemplo.
Suponho que situações distópicas possam ter acontecido em
circunstâncias várias ao longo da história da Humanidade. Umas por razões
tácticas, mais do que por ideologias políticas, e que revelam sobretudo
atitudes e posturas éticas pouco recomendáveis. Outras porque a realidade é tão
obviamente insuportável para determinados colectivos por opressão de tácticas
de cúpula de petits comités, e que saltam fora
de qualquer solução dentro do que é então o comum pensar-se que aconteceria. As
distopias tornam sempre o mundo um lugar surpreendente e, como está bom de ver,
as surpresas nem sempre são todas boas.
Alguns traços característicos de uma sociedade distópica
ficcionada, e que podemos estender (não sem alguma liberdade de cronista de
opinião sempre boa quando discutível) para momentos delimitados e
contextualizados de uma real sociedade são: o poder político totalitário,
mantido por uma minoria, e o consequente desespero do colectivo que tende a
tornar-se, por instinto de sobrevivência, corruptível. Estou certa que cada um
dos ouvintes/leitores já terá passado por este tipo de colectivo, até
inadvertidamente, por julgar tratar-se de um grupo de gente de bem onde a quase
trissecular liberdade-igualdade-fraternidade serviriam de farol de orientação.
Ora tudo isto só, e mais algumas coisas que entretanto se vão
passando – talvez até influenciada pelo regresso dos musicais de Hollywood ao
top dos mais premiáveis – trouxe-me à memória a canção infantil da Machadinha. Aquela que serve às crianças para
fazerem, em grupo, uma rodinha que lhes permite escolher parceiros, gerando
tantos ciúmes como fugazes relações eternas (uma humana contradição, como terão
percebido). Tudo gira como no poema Autopsicografia de Fernando Pessoa “nas calhas de roda”, “a entreter
a razão, /Esse comboio de corda /Que se chama coração”.
Na cantilena infantil, do coro de vozes, sempre puerilmente
efeminadas, ouve-se por entre as várias repetições típicas do seu paralelismo,
dois pares de versos que nos últimos dias me têm preenchido os silêncios das
rotinas. E dizem assim, os marotos: “Sabendo que és minha, também eu sou tua,
/Salta machadinha, lá p’ró meio da rua”, “No meio da rua não hei-de eu
ficar,/Eu hei-de ir à roda escolher o meu par.” Às vezes isto tudo da vida que
é para se levar a sério parece-me mesmo uma brincadeira de recreio. O defeito
será provavelmente meu e assim, hoje, termino por aqui.
Até para a semana.
Cláudia Sousa PereirA
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