MOÇÃO DE REJEIÇÃO
N.º _/XIII
Exposição de motivos:
I - Entre 2011 e 2015, o governo da XII
legislatura usou o programa de ajustamento negociado com a troika como pretexto
para implementar uma agenda radical e experimentalista, que foi muito além do
que o programa previa, não por necessidade, mas por uma consciente e deliberada
opção ideológica. O corte nos rendimentos de trabalhadores e pensionistas, a
degradação dos serviços públicos, o desinvestimento na Educação e Saúde
públicas, os cortes na ciência, a desvalorização salarial, a promoção do
trabalho precário e o ataque à Segurança Social tiveram como principal
objetivo, não a sustentabilidade das contas públicas, mas sim a alteração da
relação de forças em Portugal, contra os interesses dos trabalhadores, das
famílias, das classes medias e dos mais pobres. A política seguida gerou a
maior compressão na procura interna alguma vez regista no nosso país. As pequenas
e médias empresas sofreram as consequências: milhares delas enfrentaram o
encerramento, enquanto outras sobreviveram com dificuldade comprimindo o
emprego e o investimento. As consequências desta governação estão hoje à vista.
Entre 2011 e 2015, a riqueza gerada no Pais recuou mais de uma década, o
investimento recuou para níveis de meados dos anos 80, perderam-se mais de 200
mil empregos e emigraram mais de 2 350 mil pessoas. Reduziu-se o valor pago
pelas prestações sociais, bem como o número dos seus beneficiários. Aumentou o
risco de pobreza, em particular nas crianças, aumentaram as taxas de retenção e
desistência no ensino básico. Intensificaram-se as desigualdades. As famílias
viram os seus rendimentos descer e sentiram muito mais dificuldades em pagar os
empréstimos contraídos, perdendo muitas a sua própria habitação, ao mesmo tempo
que sofreram a maior carga fiscal de sempre.
Portugal vive ainda mergulhado
numa crise social e económica prolongada que exige uma resposta política capaz
de inverter a estratégia de desvalorização salarial e social, de degradação das
condições de vida das famílias e de desinvestimento nos serviços públicos que
marcou a governação da legislatura anterior.
II - Os resultados das eleições
legislativas realizadas no passado dia 4 de outubro de 2015 significaram uma
derrota das políticas de austeridade conduzidas pela coligação do PSD-CDS ao
longo dos últimos quatro anos e da estratégia de empobrecimento adotada. A
maioria dos eleitores recusou expressivamente o programa político que pretendia
prosseguir o caminho de risco para o nosso modelo social e que arriscava
entrar, uma vez mais, em confronto com o texto da Constituição em áreas
determinantes para o nosso futuro coletivo. A essa clara maioria de votos nos
partidos que pretendem virar a página e mudar o rumo da governação do país
corresponde também uma clara maioria parlamentar de sentido divergente com 3
aquele que se encontra espelhado no Programa do XX Governo Constitucional
submetido a apreciação da Assembleia da República. Longe de constituir uma base
para uma mudança de orientações políticas ou o reconhecimento do juízo de
censura maioritária colhido nas urnas, o Programa que foi dado à Assembleia da
República apreciar insiste numa trajetória de desinvestimento nos serviços
públicos. Onde é necessário um sistema de proteção social robusto, universal e
tendencialmente gratuito, continuamos a encontrar uma opção por modelos
assentes numa leitura meramente assistencialista, tão ineficientes quanto
negadores dos verdadeiros direitos sociais que lhe deveriam estar na base, e
uma negação do estado de degradação em que se encontra o Sistema Nacional de
Saúde. Onde é necessário uma política de valorização do conhecimento e da
investigação científica, continuamos a deparar-nos com um texto que não
consegue inverter a perda de qualidade da escola pública, que canaliza recursos
para o setor privado e que se demonstra incapaz de chamar de volta as gerações
qualificadas que o país foi perdendo nos últimos anos. Onde é necessário uma
política de modernização da economia que aposte na produção de conhecimento e
na sua transferência para as nossas empresas, aquilo a que assistimos é à
insistência numa política em que o principal instrumento de recuperação da
competitividade perdida continua a ser a compressão salarial. Onde se impõe a
dignificação dos rendimentos das famílias, capaz de lhes permitir responder às
exigências do dia-a-dia e, reflexamente, oferecer novo dinamismo à atividade
económica, continuamos a encontrar uma insistência no modelo que nos 4 tem
empurrado para um aumento do fosso das desigualdades e dificultado a vida às
empresas. Onde se justificava a adoção de medidas destinadas a combater a
precariedade laboral e a dignificar o trabalho, encontramos o silêncio ou a prossecução
do caminho inverso. Analisado o Programa do XX Governo Constitucional, o
Partido Socialista constata que traduz, uma vez mais, sem qualquer inflexão, as
opções políticas dos últimos 4 anos, confirmando a impossibilidade de
construção dialogante de qualquer modificação substancial de rumo. Neste quadro
parlamentar resultante do ato eleitoral, confrontando-se com a referida vontade
dos partidos políticos que suportam o XX Governo Constitucional em prosseguir o
caminho rejeitado pela maioria dos cidadãos eleitores, e tendo em conta as
profundas dificuldades que Portugal atravessa e que decorrem de uma crise
social e económica prolongada o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda, o
Partido Comunista Português e o Partido Ecologista “Os Verdes”, decidiram
conferir tradução política à vontade de mudança expressa pelos eleitores,
empenhando-se na construção de uma solução governativa distinta, capaz de
reconciliar o Governo com a Constituição e com o País. Desta convergência entre
os referidos partidos, resultou um acordo que cria uma maioria parlamentar,
capaz de sustentar a formação e a ação de um Governo comprometido com a mudança
reclamada nas urnas, trilhando um caminho claramente distinto daquele que é
preconizado no Programa do XX Governo Constitucional. 5 Neste cenário, importa
pois assegurar uma convergência capaz de virar a página das políticas de
austeridade que traduziram a estratégia de empobrecimento seguida pelos
partidos da direita, salvaguardando a defesa da Constituição da República e
apontando para prioridades consentâneas com as necessidades das pessoas, das
famílias e das empresas, gizadas em torno de quatro ideias fundamentais,
diametralmente opostas ao que o Programa do XX Governo Constitucional nos
apresenta: a) Defender o Estado Social e os serviços públicos, com destaque
para a segurança social, a educação e a saúde, promovendo um combate
determinado à pobreza e às desigualdades sociais e económicas; b) Conduzir uma
estratégia de consolidação das contas públicas assente no crescimento e no
emprego, no aumento do rendimento das famílias e na criação de condições para o
investimento público e privado; c) Promover um novo modelo de progresso e
desenvolvimento para Portugal, que aposte na valorização dos salários e na luta
contra a precariedade; relance o investimento na educação, na cultura e na
ciência; e devolva à sociedade portuguesa a confiança e a esperança no futuro.
d) Valorizar a participação dos cidadãos, a descentralização politica e as
autonomias insulares. III Neste contexto, concluído o processo de discussão e
negociações com o BE, o PCP e o PEV, estão criadas as condições para a formação
de um Governo de iniciativa do Partido Socialista, sustentado por uma maioria
parlamentar, garantindo ao País um Governo estável, responsável, coerente e
duradouro, na perspetiva de uma legislatura. Perante as posições acordadas e
publicamente assumidas pelo PS, BE, PCP e PEV está garantida: 6 a) A formação e
viabilização parlamentar de um Governo do PS, com o Programa de Governo
aprovado na Comissão Nacional do PS de 7 de Novembro de 2015, que inclui as
alterações resultantes das negociações com os partidos da esquerda parlamentar
e que respeita os compromissos nacionais e internacionais do Estado Português;
b) A existência de condições de estabilidade na perspetiva de Legislatura com a
garantia de não aprovação de eventuais moções de rejeição ou censura da
iniciativa do PSD e do CDS; c) A existência de condições de governabilidade com
a apreciação conjunta dos instrumentos fundamentais de governação,
designadamente os Orçamentos do Estado. Este compromisso entre as referidas
forças políticas permite corresponder simultaneamente a três desideratos: dá
sentido à vontade expressa nas urnas de mudança de rumo político do País,
assegura o compromisso do Partido Socialista de apenas apresentar uma moção de
rejeição se estivesse em condições de formar um Governo alternativo e dá
tradução ao repto lançado pelo Presidente da República de construção de uma
maioria parlamentar de apoio a qualquer futuro Governo enquanto condição de
estabilidade. A rejeição do Programa do XX Governo Constitucional que através
desta moção se coloca à consideração da Assembleia da República permitirá abrir
o caminho a uma solução governativa alternativa. IV Assim, confrontado, por um
lado, com a proposta de Programa de Governo apresentado pelo XX Governo
Constitucional e suportada pelos dois partidos da coligação de direita, agora
sem maioria parlamentar, insistindo no aprofundamento da sua estratégia de
radicalização programática e ideológica para 7 os próximos quatro anos; e face
à existência, por outro lado, de um projeto político alternativo e credível,
liderado pelo Partido Socialista e apoiado pela maioria absoluta dos Deputados
à Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, em
coerência com o seu compromisso eleitoral, inviabilizará a prossecução da
estratégia para a economia e para a sociedade portuguesa apresentada pelo PSD e
pelo CDS-PP neste debate. Nestes termos, ao abrigo do disposto n.º 3 do artigo
192.º da Constituição da República Portuguesa e das demais normas
constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Partido
Socialista propõe que seja rejeitado o Programa do Governo apresentado à
Assembleia da República pelo XX Governo Constitucional.
Palácio de São Bento,
10 de novembro de 2015
Os Deputados e Deputadas do Partido Socialista
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