Terça, 10 Março 2015
Vou falar de bolos. Ou
melhor de sobremesas e metáforas que tantas vezes encontramos, normalmente para
elogiar (mas há surpresas) quem colocamos em ponto de comparar pelas boas
qualidades da doçura.
Já todos, uma vez ou outra e sem ser
preciso irmos para muito longe de casa, nos deparámos com doçaria que, sendo
idêntica, tem nomes diferentes atribuídos por quem a saboreia e confeciona. E
depois também há aqueles que, por julgarmos que têm nome na língua ou alguma
referência do país que visitamos, não conseguimos encontrar em pastelaria
nenhuma quando estamos de viagem. Lembro a “bola de Berlim” que encontramos não
na capital germânica, mas bem aquecidinha pelo astro-rei nas areias de Portugal
e recordo-me eu, sempre com um sorriso, um momento em que, em viagem a Paris
com colegas de curso, um deles insistiu numa patisserie em
perguntar pelos duchesses que tanto apreciava e que queria,
julgava ele, provar no país de origem. Ora sendo a palavra francesa traduzida
por “duquesa”, apressou-se o empregado de balcão, em tom jovial e surpreendido
pela pergunta sobre um bolo de que nunca tinha ouvido falar, a perguntar-lhe se
ele não preferiria uma “marquesa” ou uma “condessa”!
Em Portugal temos
também o nosso “pastel de Belém”, que fora do local secreto e mágico onde tem
origem este nome próprio ganha o nome comum de “pastel de nata”. Ao que parece
a moleza silenciosa do recheio desta iguaria, já que não creio que seja o seu
sabor único ou a estaladiça massa folhada a evocá-lo, darão a alguns a
oportunidade de alcunhar assim um vizinho, figurão de Estado que nunca se
engana e raramente tem dúvidas, que mora a uns metros da fábrica de pastéis de
Belém. É assim algum humor que nos ensina que, para não chorarmos, por vezes
temos mesmo de rir.
Inspirou-me esta
crónica, não algum desejo de adoçar a boca que na precaução do controlo das
calorias resolvi fazer com palavras e sem açúcar, mas por me ter cruzado, nas
redes sociais, com uma daquelas publicações originais dos amigos que fazem boa
companhia nestes lugares virtuais, com quem aprendemos e rimos, com mais
elevação do que muitos, mais avessos a estes novos salões de tertúlia possam
julgar. O colega, amigo virtual recente, escreveu no seu mural à maneira de
muitos slogans que desde o 7 de janeiro circulam o seguinte: «Je ne suis pas
parfait. (Tradução: Eu não sou uma sobremesa gelada.)» A alusão da piada é
clara quanto à imperfeição confessa de outra figura de Estado que, nos últimos
dias tem andado às voltas com o seu passado, a ouvir das boas de todo o lado,
respondendo de olhos em alvo e sobrancelhas em arco de espanto e remetendo-se à
condição de pecador que se enganou e teve dúvidas, num caso em que não lhe é
admissível arranjar desculpas, por melhor que seja a narrativa que nos quer
impingir.
O parfait é
precisamente uma sobremesa gelada, que não vai ao forno, feita à base de natas,
ovos e um cheirinho de licor, compota de fruta ou frutos secos, baunilha e
sabe-se lá mais o quê. Só o nome nos faz antever o prazer de a saborear. A
perfeição é pois apreciada como uma iguaria merecida em final de festim. Uma
espécie de cereja em cima do bolo… Mudando de registo gastronómico para a
atualidade nacional política: não julgue quem evoca a imperfeição como desculpa
da aldrabice pensada que nos engana com falinhas doces. Afinal, são sopas
depois de almoço.
Cláudia Sousa Pereira
Sem comentários:
Enviar um comentário