terça-feira, 17 de março de 2015

CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE NA RÁDIO DIANA/FM

                  Cláudia Sousa Pereira - Ring-fencing

Terça, 17 Março 2015
Ainda a propósito da malfadada triste realidade, e não apenas mero caso, do BES, nesta semana que passou ouvi dois “Miguéis”, um ex, outro ainda, deputados da AR, a utilizarem a expressão ring-fencing.
Achei-a bonita, embora tenha estranhado que o Miguel do PCP a retomasse do discurso do outro Miguel, o do PSD, sabidas que são as divergências que afirmam entre o ser, o estar e o fazer destas duas forças políticas. Mas mais estranhei que utilizasse tal estrangeirismo um eleito pela esquerda nacionalista, que podemos assim classificar pela forma como se exprime em tudo quanto é cartaz – como aliás os novíssimos outdoors do PSD. E, portanto, estranhei o vocabulário pouco nacional relativamente à alma lusa onde tanto se revê a atual coligação CDU. Coligação que, engenhosamente, se “des-coliga” na AR, retomando os Comunistas e os Verdes as suas supostamente verdadeiras identidades, duplicando todas as benesses a que assim podem aceder (e presumo que obrigações também, claro). Mas adiante.
Independentemente do jovial diálogo que os Miguéis travavam, em lados ditos opostos agora mas não sem alguns outros pontos que tiveram em comum, e consertando-se, na sua vida parlamentar passada, ficou-me a expressão ring-fencing a tilintar no ouvido e a curiosidade em conhecê-la melhor. Cito-vos, pois, em segunda mão e através de um acessível jornal eletrónico que trata sobre o mundo dos negócios, um pequeno relato do episódio que ouvi em excertos nas rádios nacionais. Era, então, uma vez neste março primaveril na AR, e cito: «"Separei sempre a actividade de director-coordenador de 'research' do BES e a actividade enquanto parlamentar", afirmou o actual presidente da AICEP na comissão parlamentar de inquérito à gestão do BES e do GES. Frasquilho disse aos deputados, muitos deles antigos colegas de quando estava no Parlamento, que nunca tomou parte em matérias relativas ao sector financeiro. Nesses temas, garantiu, votou sempre alinhado com o seu partido, o Partido Social Democrata (uma informação que o deputado comunista Miguel Tiago defendeu não ser totalmente verdade). O ex-deputado garante que, adoptando essa postura, acabou por votar em aspectos que iam contra os interesses da banca como a sobretaxa ao sector financeiro ou o chumbo do PEC IV, em 2011, que ia contra o que era pedido pelos banqueiros. No BES desde 1996, a convite de Manuel Pinho, Frasquilho afirmou que a separação de funções sempre foi "muito bem" conseguida. E acrescentou: "quer numa quer noutra, era economista". "Sempre prezei muito a minha integridade". "Fazia parte do meu ring-fencing", também foi uma das respostas a questões sobre a ligação entre o banco e o Parlamento.». Fim de citação.
Ora ring-fencing, que se pode traduzir à letra por anel-que-cerca, traduzir-se-á no contexto dos mundos cruzados da finança e política, como uma ou um conjunto de medidas de proteção, isolamento ou separação. Mas soa na minha gramática poética a limites bucólicos. Tipo vedações ecológicas, permeáveis à circulação das espécies entre os ambientes onde vivem e se reproduzem, em equilíbrio necessário a um ecossistema propício à sobrevivência. Ring-fencing está ligado à proteção, daquele que o cria à sua volta, bem entendido. E parece indicar-nos um caminho possível para uma das grandes utopias do mundo contemporâneo e que é conseguir ter o melhor dos dois mundos. Nada a opor a esta busca virtuosa do meio-termo, quando ela é mesmo virtuosa, ou seja quando nos induz, de espírito e forma constante, a exercer o bem e evitar o mal. Não é coisa que se faça assim “com uma perna às costas”, isto de termos o melhor para nós sem prejudicar os outros… E ele é capaz de haver para aí mais praticantes do ring-fencing que esquecem este detalhe do que imaginamos! Às tantas, para voltarmos ao bucolismo da vida campestre, são só hábeis talhantes que “matam dois coelhos de uma cajadada só” Vamos estar atentos.
Cláudia Sousa Pereira


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