sexta-feira, 14 de junho de 2013

CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE NA RÁDIO DIANA/FM


                             Ligação à terra
 Sexta, 14 Junho 2013 09:52
No discurso do dia de Portugal de 2013, o Senhor Presidente da República resolveu abordar o assunto da agricultura. Sucede que o Senhor Presidente da República se chama Aníbal Cavaco Silva, como Aníbal Cavaco Silva se chamava o Primeiro-ministro, durante a vigência do qual a agricultura portuguesa mais regrediu em Portugal. Dir-se-á que não terá sido por sua - e do seu Governo - exclusiva responsabilidade, mas a verdade é que nem no discurso político Cavaco Silva a defendia, quando outros, em Portugal, chamavam a atenção, em vão, para o rumo que a agricultura portuguesa levava.
Pode perceber-se que a agricultura strictu sensu é, desde há bastante tempo e para países de pequena e média dimensão, um sector de risco para a nação e para quem dele vive. Basta imaginarmos um país de grandes dimensões a produzir um determinado cereal para podermos ver como, vivendo em economia aberta, se torna impossível a países como Portugal produzirem esse mesmo cereal a custo idêntico e, portanto, a colocarem no mercado esse mesmo cereal a preços idênticos. Este raciocínio, levado ao limite, fez com que, a nível europeu, se tivesse optado por aquilo que todos ouvimos durante muito tempo e que nos parecia uma incongruência, isto é, “pagar para não produzir”. Ou seja, a União Europeia pagava aos agricultores para abandonarem certas culturas, pagava-lhes para não produzirem outras e pagava-lhes também para produzirem outras ainda. Não estarei enganado se disser que a União Europeia chegou mesmo a pagar para produzir e para não produzir uma mesma cultura num mesmo Estado-membro, embora em anos diferentes. É preciso, no entanto, dizer em abono da verdade que, à luz da doutrina que se ia desenvolvendo a nível europeu, esta lógica até fazia sentido, já que o objectivo era o de fazer uma reconversão completa da agricultura europeia, ajudando os agricultores a deixarem de o ser, uma vez que se considerava o abandono das terras uma fatalidade face à evolução da economia mundial, com a pressão dos consumidores a quererem comprar a um preço cada vez mais baixo.
E se, hoje, a lógica europeia continua a mesma, o que entretanto aconteceu, foi que, fruto da crise profunda que se instalou nos países periféricos, países como Portugal perceberam que há muitas virtualidades que a agricultura encerra em si mesma e que Portugal achava já ser coisa de antigos. Sim, porque, como é evidente, Portugal estava destinado a ser um país de serviços! Um país moderno, dizia-se! Neste quadro, até a União Europeia se tornou mais prudente e realista. E da agricultura evoluiu para o Desenvolvimento Rural, justamente porque sendo certo que nem todos poderiam viver da agricultura em si mesma, era, no entanto, possível viver-se de actividades que, existindo já ou não, poderiam desenvolver-se em torno da agricultura. Por conseguinte, aqueles que, de forma natural ou forçados a fazê-lo, iam deixando a agricultura tradicional, poderiam encontrar nas actividades que gravitam em torno da agricultura, independentemente de serem mais ou menos recentes, um modo de vida.
Esta aliança com o mundo rural que tinha ainda a enorme vantagem de fixar populações no interior dos países, reclamada por alguns há bastante tempo e que finalmente volta a despontar em Portugal – agora já todos acham que a agricultura já não é coisa de primitivos – mostra bem o quão desorientados andámos ao longo de todos estes anos em que a agricultura foi o parente pobre da economia portuguesa. E digo desorientados na verdadeira acepção da palavra, já que foi de total falta de orientação por parte de quem nos governou que se tratou. E se é a quem governa que se pode e deve exigir linhas de orientação, é a quem governou que se pode e deve pedir explicações, agora.
Mas o que mais custa não é constatar o facto de os governantes dizerem uma coisa num dia e outra noutro – a isso já nos habituámos! O que mais custa é ver a mesma pessoa dizer uma coisa e o seu contrário, sem que, ao menos, faça um mea culpa pelo erro que cometeu. Mesmo, claro, que continue convencido de que nunca se engana e raramente tem dúvidas.
É claro que há outros agentes políticos a pensar e a agir desta forma... Será que custa assim tanto assumir um erro? Ou o que verdadeiramente custa é aceitar a razão que outros tinham?
Seja como for, saúda-se a ligação à terra.
 Cabanas de Tavira, 13 de Junho de 2013
Martim Borges de Freitas

Um Comentário que deve ser lido e ponderado e como tal o destaco para primeira página:

Poderá parecer uma ironia cínica citar o dr. Álvaro Cunhal para comentar uma crónica assinada pelo dr. Martim Borges de Freitas. E se assim falamos é porque ambos sempre se situaram em posições políticas antagónicas. O curioso é que partindo ambos de princípios ideológicos opostos, acabam os dois por ter razão.
O cronista tem toda a razão no que hoje escreve. (aliás, recomendamos a leitura desta crónica da Rádio Diana/FM com toda a atenção. Só demonstra que o dr. Martim está atento ao que se passa na nossa agricultura e à forma como a União Europeia e os governantes portugueses a trataram ao longo dos anos).

Mas se o dr. Martim tem hoje razão, já o dr. Álvaro Cunhal, por nós aqui chamado à colação, também a tinha há 26 anos - repetimos: vinte e seis anos - , quando proferiu as seguintes palavras:

«(....)PORTANTO, PROCURAM AMARRAR-NOS A CRITÉRIOS SUPRANACIONAIS, CRITÉRIOS SUPRANACIONAIS QUE NÃO SERÃO ESTABELECIDOS POR NÓS, NEM PELOS GREGOS OU PELOS ESPANHÓIS, MAS O SERÃO PELA RFA, PELA FRANÇA, OU AINDA PELA INGLATERRA - POR PAÍSES MAIS DESENVOLVIDOS QUE, ACIMA DE TUDO, ACAUTELARÃO OS SEUS INTERESSES, E QUE TERÃO SEMPRE UMA PALAVRA MAIS FORTE E A DECISÃO NAS SUAS MÃOS. (....) A CONTINUAR A MESMA POLÍTICA DOS ÚLTIMOS DEZ ANOS NÃO HAVERÁ DESENVOLVIMENTO NACIONAL, ANTES PORTUGAL SE ATRASARÁ AINDA MAIS EM RELAÇÃO AOS PAÍSES DESENVOLVIDOS, SACRIFICARÁ A SUA AGRICULTURA, A SUA INDÚSTRIA, AS SUAS PESCAS E, A PRAZO, PERDERÁ A SUA INDEPENDÊNCIA NACIONAL....»

Estas palavras estão escritas no livro cujo título é "Desenvolver Portugal-Ano 2000", editado pela Editorial Avante, em Junho de 1987, e cujo depósito legal tem o número de registo 10766/85. As palavras atrás citadas vêm na página 24.

Chama-se a isto "ter razão antes do tempo", e se alguém tiver dúvidas é procurar na Net. O livro está lá.

Um alandroalense

1 comentário:

Anónimo disse...

Poderá parecer uma ironia cínica citar o dr. Álvaro Cunhal para comentar uma crónica assinada pelo dr. Martim Borges de Freitas. E se assim falamos é porque ambos sempre se situaram em posições políticas antagónicas. O curioso é que partindo ambos de princípios ideológicos opostos, acabam os dois por ter razão.
O cronista tem toda a razão no que hoje escreve. (aliás, recomendamos a leitura desta crónica da Rádio Diana/FM com toda a atenção. Só demonstra que o dr. Martim está atento ao que se passa na nossa agricultura e à forma como a União Europeia e os governantes portugueses a trataram ao longo dos anos).

Mas se o dr. Martim tem hoje razão, já o dr. Álvaro Cunhal, por nós aqui chamado à colação, também a tinha há 26 anos - repetimos: vinte e seis anos - , quando proferiu as seguintes palavras:

«(....)PORTANTO, PROCURAM AMARRAR-NOS A CRITÉRIOS SUPRANACIONAIS, CRITÉRIOS SUPRANACIONAIS QUE NÃO SERÃO ESTABELECIDOS POR NÓS, NEM PELOS GREGOS OU PELOS ESPANHÓIS, MAS O SERÃO PELA RFA, PELA FRANÇA, OU AINDA PELA INGLATERRA - POR PAÍSES MAIS DESENVOLVIDOS QUE, ACIMA DE TUDO, ACAUTELARÃO OS SEUS INTERESSES, E QUE TERÃO SEMPRE UMA PALAVRA MAIS FORTE E A DECISÃO NAS SUAS MÃOS. (....) A CONTINUAR A MESMA POLÍTICA DOS ÚLTIMOS DEZ ANOS NÃO HAVERÁ DESENVOLVIMENTO NACIONAL, ANTES PORTUGAL SE ATRASARÁ AINDA MAIS EM RELAÇÃO AOS PAÍSES DESENVOLVIDOS, SACRIFICARÁ A SUA AGRICULTURA, A SUA INDÚSTRIA, AS SUAS PESCAS E, A PRAZO, PERDERÁ A SUA INDEPENDÊNCIA NACIONAL....»

Estas palavras estão escritas no livro cujo título é "Desenvolver Portugal-Ano 2000", editado pela Editorial Avante, em Junho de 1987, e cujo depósito legal tem o número de registo 10766/85. As palavras atrás citadas vêm na página 24.

Chama-se a isto "ter razão antes do tempo", e se alguém tiver dúvidas é procurar na Net. O livro está lá.

Um alandroalense