Por intermédio de um amigo
de longa data, também Alandroalense e interessado pela sua história, chegou-nos
às mãos o estudo que nos propomos compartilhar com todos os nossos leitores.
A transcrição que se
segue foi elaborada pelo Dr. Luís Faria
no ano de 1981, a
pedido da família Recto (Alexandre e Aurélia), também eles, enquanto vivos,
pessoas interessadas por tudo o que ao Alandroal diz respeito.
Porque julgamos saber que
este mesmo estudo será apenas conhecido por um restrito número de leitores e
porque o numero de interessados cresce, agora que a se procede a obras do nosso
Castelo e se dedica um estudo a sério sobre o Endovélico e tudo o que o envolve
não podíamos deixar passar em claro mais este estudo sobre a nossa Vila.Após a divulgação sobre = FORTIFICAÇÕES DA VILA=, vamos completar com:
SOBRE UM INVENTÁRIO MEDIEVAL DA
PROPRIEDADE RÚSTICA.
O inventário dos bens da
Ordem feito em 1364 descreve as propriedades que a Ordem possuía no termo, que
era delimitado a leste pela ribeira de Pardais, a oeste e sul pelo Lucefece, e
com Castela pelo Guadiana. Na zona de culturas ricas que envolve a povoação,
tinha hortas e vinhas: a horta dos freires, talvez hoje a horta do mestre (Inicialmente uma comenda, a vila passou depois a
pertencer à mesa mestral, o que possivelmente alterou alguns nomes. Num
documento de 1294 (ANTT, Ordem de Avis, doc nº 220), vende-se uma vinha que
partia com o ribeiro da fonte do comendador, nome que hoje não existe.), um cidral ao pé da fonte ( Na planta da povoação assinalei o sítio que hoje é
conhecido por Cidral, e a horta do mestre que se localiza aproximadamente na
zona das tapadas da vista do Sul do desenho de Duarte Darmas), e duas vinhas e uma horta junto da fonte dos freires, que deve
corresponder à actual fonte das freiras (Muitas das propriedades da Ordem pertenciam, no século
XVIII, a conventos de religiosos. As hortas regadas pela fonte das freiras
pertenciam ao convento de St. Cruz de Vila Viçosa e S. Bento de Évora, o que
talvez explique a mudança de nome da fonte).
As herdades situavam-se todas
a leste da vila e são referidas no documento por ordem de crescente proximidade.
A herdade “boo visso”, “En rjba de djana Ao porto de cerva”, talvez se
localizasse na confluência do Lucefece com o Guadiana, onde são hoje os montes
do Aguilhão e da Ordem. Foi pelo porto de Cerva que as tropas do alcaide do
Alandroal atravessaram o Guadiana para fazerem uma incursão no terreno de
Cheles, mas o topónimo parece ter.se perdido. O Padre Bento Ferrão menciona na
mesma zona, na Herdade de Milreu, “Um castelo velho, talvez do tempo dos mouros,
que caía sobre o Guadiana e que está arruinado”.
A Herdade da Granja “a –par
de as masucarjas” conservou o mesmo nome: Massuca é, segundo o Dicionário de Morais, pequena barra de
ferro não purificado, e o prior Bento Ferrão afirma que nessa herdade foi
minerado ferro, ouro e prata. Hoje existe lá uma fonte com o nome de Fonte
Ferrenha.
A herdade “Aaquem das
masurcagens A que chama A Mouta da maae” talvez se localizasse na zona do
actual Monte do Sobral: O mestre da Ordem de Avis, num pedido de D. João I,
diz-lhe “ que no termo do alandroal há hua defesa que chama a Mouta da moo e
Soveral da ordem e granja as quaes defesas som coutadas em cada huum ano de sam
miguel atas natal”, e por haver “peças dégoas” nessas defesas que assim se não
podiam manter. Pretendia que lhe coutasse por todo o ano. Pelo “soveral da
ordem” passou Pêro Rodrigues, alcaide do Alandroal, na volta da expedição a
Cheles.
AS últimas herdades referidas, a das Ferrarias e
o Cabril, mantiveram o nome. Na primeira, diz o Padre Bento Ferrão. “há a
tradição de mina de ferro, e da´se tirou o nome”.
A descrição do contrato da
herdade da Granja chama a atenção: “lauruuãa Gil Martins por quinto do dito Ano”.
Vicens Vive ao descrever a
influência muçulmana nas formas de distribuição do solo, e de exploração
agrária, sublinha a importância do sistema de parceria, inexistente na Europa
feudal.
“ A parceria um contrato
entre dois homens livres, o senhor da terra e o colono […] que se baseava na
entrega por parte deste de uma parte maior ou menor das colheitas. Essa parte
nunca era superior a metade, havendo camponeses que só pagavam a quinta parte e
se chamavam mujammis. (J. Vicens Vives ,
História Económica de Espana, Barcelona, 1977, pag. 102).
Silbert sugere ser essa a
origem da classe dos seareiros alentejanos, ao constatar a sua influência na
sociedade meridional do antigo regime (
Albert Silbert, Le Portugal mediterranéen à la fin de l´ancien regime, Lisboa
1978, pag. 99).
Seareiros são rendeiros
precários, que só têm direito a fazerem uma colheita, o que se assemelha ao
contrato estabelecido entre Gil Martins e a Ordem de Avis.
A extensão e localização da
propriedade concelhia medieval não vem referida nos documentos consultados.
Segundo um tombo realizado em 1776, essa propriedade situava-se em torno e a
oeste da vila. Restam hoje alguns topónimos a recordá-la, como seja o Monte do
Baldio, e uma estreita faixa de uns 15 metros de largura por 2 Km de comprimento chamado
Canada, (Cadastro da Propriedade Rústica, Concelho do Alandroal, freguesia de
Nª Sª da Conceição, folha R, 1952). E que
se segue o traçado da estrada para Terena. O mesmo prior Bento Ferrão localiza
a desaparecida Ermida de S. Gens. (Túlio
Espanca situa a ermida na herdade da Canada, embora este nome não conste no
cadastro. Ver Inventário Artístico. Pag 60).
Canadas eram caminhos para
gado relacionados com a transumância, limitados em alguns casos pelos
concelhos. Em Portugal, o caminho que da Serra da Estrela levava ao campo de
Ourique, passava por Portalegre, Évora, Beja e ainda era percorrido no final do
século XIX. É possível que a canada do termo do Alandroal se destinasse ao gado
castelhano que entrava por Elvas, para se dirigir ao campo de Ourique,
atravessando o Lucefece na ponte de Terena. A transumância de gado espanhol em
território português atingiu o auge nos séculos XV e XVI, declinando
posteriormente por razões politicas e económicas e restringindo-se à margem
esquerda do Guadiana.
As águas correntes do termo
pertenciam à Ordem de Avis, que cobrava foros e rendas nos moinhos e azenhas
que delas se serviam. O inventário de 1364 refere um moinho na ribeira do
Lucefece, e em 1831 o único moinho aì existente era o moinho da Calçada ou dos
Ouros (Tombo de Alcaidaria Mor da villa do
Alandroal, começado em 1831, ANTT, Tombo das Comendas, livro 9)
Em 1968, segundo a Carta
Coreográfica do IGC, só havia um moinho na margem esquerda, o da Ponte dos
Ouros, situando-se os restantes na margem direita, nos antigos termos de Terena
e Redondo.
É possível que esta situação
tenha origem num privilégio dado aos moradores de Terena, e que o foral
manuelino atribui a D. João I (mas seria Anterior?), “de nam pagarem direito
das moendas que fizessemna Rybeira de Lucefes” (ANTT, Livro dos forais novos do Alentejo, fl. 83).
Em 1758, segundo o padre
Bento Ferrão, pela ponte do Moinho dos Ouros passava “ A estrada que vai do
Alandroal para o Redondo quando há cheia”.
ANEXOS:
2 comentários:
Em regra geral, os detentores da informação (da que tem interesse)não a partilham com toda a gente; há sempre um certo egoísmo em cada investigador ("vais fazer figura com o meu trabalho!" pensarão). O caso presente é a feliz excepção, sendo de louvar. Os meus agradecimentos a quem fez, a quem disponibiliza e a quem divulga. MSubtil
POIS É AMIGO SUBTIL HÁ POR AÍ MAIS GENTE COM MUITA INFORMAÇÃO ACERCA DA HISTÓRIA DO ALANDROAL, MAS NÃO A PARTILHAM COM NINGUÉM, TÊM-NA FECHADA A SETE CHAVES LÁ EM CASA. DEVE SER PARA A LEVAREM DENTRO DO CAIXÃO.
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