quarta-feira, 6 de outubro de 2010

CRÓNICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM

http://www.dianafm.com/

Luís Sebastião - Eles, coitados, fazem o que podem


Quarta, 06 Outubro 2010 10:49
Ontem, dia em que se comemorava o centenário da implantação da República, depois dos discursos da praxe nos Paços do Concelho de Lisboa, um jornalista perguntou a uma popular o que é que ela pensava do que tinha ouvido e de quem o tinha dito e ela, depois de assinalar a dificuldade dos tempos que se vivem, afirmou que "eles, coitados, fazem o que podem". Com o "eles", estava a referir-se, naturalmente, ao presidente da Câmara de Lisboa, ao Primeiro-ministro e ao Presidente da República, uma vez que o banqueiro Artur Santos Silva só ali perorou na condição de promotor das festividades. Mas estava, também, a referir-se a todos os que, investidos de poder, têm nas mãos a governação do país nos seus mais diversos níveis.
Há, nesta afirmação, algo de simultaneamente épico e trágico. Épico, porque quem a faz homenageia e reconhece o esforço voluntarista, que os zeladores da coisa pública fazem para tentar resolver os problemas que enfrentamos. Ao ouvir aquela senhora a reconhecer que eles fazem o que podem, imaginamo-los logo esforçados, suados, sem dormir nem se alimentarem convenientemente, a fazer os possíveis e os impossíveis par resolverem os nossos problemas, para serenarem as nossa angústias, para manterem fartas as nossas mesas.
Trágico porque, como os resultados não aparecem, forçosamente isso se deve ao nosso triste Fado, a um Destino padrasto empenhado em fazer gorar os seus esforços. Trágico porque nos faz pensar que não temos alternativa, que não vale a pena fugir, porque não nos poderemos esconder. Trágico porque nos remete para o atavismo da nossa condição de povo pobre, periférico e irrelevante.
Sou, por natureza, dos que tendem a acreditar na bondade das pessoas humanas e dos que admitem, sem reservas mentais, que os nossos governantes se esforçam genuinamente por fazerem bem. Mas recuso-me a acreditar, como aquela senhora, que eles fazem o melhor que podem. Fazem, quando muito, o melhor que sabem. E o pior é que sabem pouco. Ou, o que vai dar no mesmo, o que sabem é irrelevante para a governação. E como quem não sabe, pergunta, era bom que os nosso governantes se informassem, perguntassem, ouvissem, envolvessem os cidadãos na solução dos seus próprios problemas e procurassem, para as suas decisões, os mais amplos consensos possíveis.
Ontem celebraram-se os cem anos da República e durante todo o dia se falou do muito que se fez desde esse dia 5 de Outubro de 1910. E durante todo o dia se esforçaram por nos convencer de que "eles fizeram o que puderam". Tenho para mim que teria sido mais útil e vantajoso ter usado a efeméride para pôr em evidência o facto de que eles, de facto, não só não fizeram o que podiam, como o que fizeram, fizeram globalmente mal. Porque se esqueceram de um pequeno detalhe. Que o essencial da República são as pessoas. E que se tivessem chamado as pessoas a decidir sobre as suas próprias vidas, provavelmente, muitos dos nossos problemas teriam soluções mais fáceis, mais eficazes e mais permanentes. E chamarem a atenção de que foi a primeira República quem gerou no seu seio o Estado Novo.
Até para a semana
Luís Sebastião

Sem comentários: