quarta-feira, 18 de agosto de 2010

POETAS DA MINHA TERRA

AUGUSTO GARCIA TOUCINHO


MOTE

O que nasce é para morrer
Seja qual for o vivente
Tudo tem princípio e fim
Nada vive eternamente.

Traz o destino marcado
O vivente quando nasce
Pois se nada cá findasse
Tudo vivia afrontado.
Estava o mundo amontoado
Até mais cá não poder caber
Nada se podia mover
E tudo vivia oprimido,
Está assim compreendido
“O que nasce é para morrer”.

Racionais e irracionais
E os vegetais reverdecendo
Tudo vai desaparecendo
Dando lugar a vir mais.
Estão então os minerais
No mesmo ser para sempre
É coisa que não se sente
Não se move nem se queixa,
O mais tudo o mundo deixa
“Seja qual for o vivente”

À morte não escapa nada
E a tudo mete medo
Todos mais tarde ou mais cedo
Fazem a mesma jornada.
Depois da vida acabada
Nada mais cá dá motim
A ordem do mundo é assim
E a morte não tem prudência,
Pelo destino da providencia
“Tudo tem princípio e fim”.

Depois de a vida acabar
Tudo se vai esvaindo
Mas novos seres vêm vindo
P´ró mundo não acabar.
Assim tem que continuar
Enquanto o mundo for existente
Sabe-se verdadeiramente
Que tudo morre de certeza,
Pela ordem da natureza
“Nada vive eternamente”.

MOTE

Temos os astros em guerra
Turvam-se as águas do mar
Quando é que reina na terra
A paz de que ouço falar.

Aonde é que isto irá parar
Com o decorrer dos tempos
Assim com tantos inventos
No que é que isto tudo irá dar.
Anda um conflito no ar
O que é que dali se espera
Cruzam a atmosfera
Os satélites e os foguetões,
Devido a tantas invenções
“Temos os astros em guerra”.

Estão os povos alarmados
Com o que se passa no mundo
Navios metidos no fundo
E marinheiros afogados.
Muitos barcos naufragados
Sem se poderem salvar
As pessoas que lá possam estar
Ali têm o seu fim,
Com estes sinistros assim
“Turvam-se as águas do mar”.

Não devia haver falsidade
Devia haver boa união
Quando é que os povos se entenderão
Como sendo uma irmandade?
Se houvesse só lealdade
Que muito bom que isso era
O povo pergunta e espera
Um futuro mais conveniente,
Sossego para toda a gente
“Quando é que reina na terra?”

Luta-se por todo o lado
Muitos querem o poleiro
Outros lutam pelo dinheiro
Está o mundo desgraçado.
O que é explorado
Também anda a lutar
Não se pode conformar
Com isso tal como está,
Pergunto eu quando virá
“A paz de que ouço falar”.

Poeta Popular, Guarda Fiscal de profissão e militante do Partido Comunista, Augusto Garcia Toucinho, mais conhecido por Cabo Toucinho, foi meu vizinho durante dez anos no Largo de São Bento em Alandroal.

Era com muito prazer e atenção que ouvia as suas décimas e as histórias do tempo da Guerra Civil de Espanha.
Contava-me que os presos espanhóis à sua guarda para entregar no outro lado da fronteira, lhe faziam doer a alma. Como homem da liberdade e revoltado com as ditaduras de Portugal e Espanha, Cabo Toucinho encaminhava os seus presos por outros caminhos ao longo da raia, para assim puderem escapar e a sua alma ficar um pouco mais leve. Muitas vezes me disse: "só um que escapasse às garras da ditadura espanhola era como se um filho meu fosse salvo."
A propósito de filho, quis o destino que nas segundas eleições autárquicas pós 25 de Abril, na mesa de voto da antiga Escola Primária, eu e o amigo Toucinho fomos convocados para fazer parte da mesa de voto. Eu conferia nos cadernos eleitorais os nomes dos eleitores, e ele tinha a seu cargo a presidência da mesa. Cada vez que um eleitor entrava na sala e ele o identificava como sendo do seu lado político, dizia-me de surdina ao ouvido: "filho de bons tomates". Ao invés, se entrava um que fosse de outro partido que não o seu, o bom do Cabé levava uma canelada por debaixo da mesa. Foi assim que o (filho) ficou com as canelas todas negras.
Quis o destino que fosse novamente no Largo de São Bento, lugar onde acabei por comprar casa e habito, para recordar as décimas muito boas do Cabo Toucinho, publicadas pelo amigo Chico Manel no Al Tejo.
Foi um prazer reler a poesia e contar esta história de um velho amigo já desaparecido!

Cabé

2 comentários:

Anónimo disse...

Muito boas as décimas de Augusto Garcia Toucinho e a história que o amigo Cabé contou para o recordar!

Anónimo disse...

Soberbo cérebro do POETA, AUGUSTO TOUCINHO que tais versos escreveu (de tantos, tantos outros) e que nunca se afastou dos seus ideais COMUNISTAS (de honestidade, de fraternidade, de igualdade e, de humanidade).
O que se não vê nas mentes corruptas e "fingidas" de outros espaços.
A hora do seu espaço de pensamento não tardará.
QUE A TERRA...LHE SEJA LEVE