sexta-feira, 9 de julho de 2010

" VIAGEM ALENTEJO / EXTREMADURA. IDA E VOLTA "

(Continuação do dia anterior)

" VIAGEM ALENTEJO / EXTREMADURA. IDA E VOLTA "

( Ou fragmentos da vida de uma família raiana ).

.... Guadalupe José Rodriguez Potra e Santiago Grazina

Capelins, Outono de 1938
Quando Santiago Grazina acordou, não reconheceu a cama em que estava deitado nem o quarto em que se encontrava. A princípio, pensou que estava a sonhar. Depois, reparou que a cama era larga, de ferro, cama de casal, como se dizia, com confortáveis enxergão de palha e colchão de lã. Os cobertores eram quentes e grossos. O quarto era grande e estava numa semi-escuridão que não permitia definir os seus contornos exactos.
Quando os olhos se foram habituando à penumbra, percebeu que a mobília era de madeira e tinha um ar pesado. Ao fundo um grande guarda-fatos, um lavatório com jarro de água e um bengaleiro com várias peças de roupa pendurada . No lado direito uma cómoda com várias gavetas, duas estantes repletas de livros e discos de vinil, assim como uma mesa pequena com uma grafonola de corda. No lado esquerdo havia uma janela que estava escondida por um enorme cortinado que, muito embora ocupasse a parede do tecto até ao chão, deixava passar uma ténue claridade.
Foi então, quando se capacitou que estava bem acordado, que começou a lembrar-se do que tinha acontecido : Saíra de Aracena há uns dias atrás, juntamente com mais três companheiros, e rumara a norte. Tinham feito, a pé, e caminhando apenas de noite, todo o percurso por território espanhol até Villanueva del Fresno, aonde seriam ajudados por outros companheiros que, com a cumplicidade de alguns camaradas portugueses, asseguravam a passagem para Portugal. Assim acontecera. Porém, ainda em território espanhol, num encontro inesperado com a guarda fronteiriça, tinham sido obrigados a separar-se. Houvera tiros, ele próprio ficara ferido num ombro, desmaiara, e agora acordava naquela cama, atado por ligaduras e com dores muito fortes.
Enquanto tentava recordar-se de mais pormenores, sentiu que alguém entrava no quarto, e com o intuito de ver quem era virou-se repentinamente, provocando com esse movimento uma dor que de imediato o imobilizou. A dor foi de tal maneira forte que lhe turvou a vista e quase o fez desmaiar. Sentiu que lhe aconchegavam a roupa, enquanto ouvia, em português , uma voz de mulher que recomendava calma e lhe dizia que não tivesse pressa porque aquela situação estava para durar. - " Tente dormir, pois daqui a pouco virá de novo o médico e terá ocasião de falar com ele " - Embalado pelo calor da dor, e sem perceber bem o que lhe tinham dito, pois não dominava a língua portuguesa, entrou num sono agitado de que só acordou muitas horas depois.

(Próximo episódio 2ª feira)

Sem comentários: