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Martim Borges de Freitas - A (In)segurança das penas
Sexta, 09 Julho 2010 11:15
A Segurança é um dos temas que vai fazendo parte da agenda política nacional. Sobre este tema há muito a dizer e, sobretudo, muito a fazer. Não pretendo aqui falar em profundidade sobre um assunto que, tanto à esquerda como à direita, mas por razões inversas, se tenta apresentar como tema, não direi fracturante, mas distintivo.
Sou democrata-cristão. À direita, tem vindo a desenvolver-se - e há - uma forte corrente que defende um agravamento substancial das penas de prisão, nomeadamente, mas não exclusivamente, no que toca a crimes de sangue. Há mesmo quem defenda a introdução da pena de morte, sem que, esses, tenham qualquer laivo de maldade ou sejam sequer adeptos da teoria do "olho por olho...". Há quem acredite, pois, por convicção, no efeito dissuasor que o agravamento das penas, em geral, e a introdução da pena de morte, em particular, poderia ter em benefício da segurança.
Sou sensível a muitos dos argumentos usados por quem defende mão pesada para as penas de prisão. E sou ainda mais sensível se quem os esgrime foi vítima directa ou indirecta de crimes mais ou menos graves. Mas, sou contra, frontalmente contra, a pena de morte. Em primeiro lugar, porque considero o valor da Vida como um valor absoluto. E, em segundo lugar, porque sou favorável ao "princípio da segunda oportunidade", isto é, à possibilidade de ser concedida uma segunda oportunidade a quem prevaricou, evidentemente dentro de determinadas condicionantes, essencialmente, precaucionais. Não estou convencido de que a introdução da pena de morte seja mais dissuasora do que, por exemplo, a introdução da prisão perpétua. Além disso, salvo raras excepções, o que se tem verificado é que quem comete homicídios, os comete sem qualquer tipo de premeditação. E se é verdade que esses criminosos ou potenciais criminosos devem ter consciência, prévia, de que ao partirem para o cometimento de um crime menor podem acabar por cometer um crime maior, não me parece que a introdução da pena de morte evite o cometimento desse tal crime menor.
O que é, a meu ver, escandaloso em Portugal, é o não cumprimento efectivo e integral das penas. É aquilo que pode ser visto como a segurança ou, de outro ponto de vista, a insegurança das penas. Segurança na óptica do criminoso e insegurança na óptica da vítima ou da potencial vítima. Ou seja, em Portugal, o criminoso, admitindo que é apanhado e condenado (o que nem sempre acontece) sabe a priori que nunca cumprirá a pena na totalidade. Com sorte, pode ser que cumpra apenas ¼ da pena. Por outro lado, as vítimas, directas, indirectas ou potenciais, essas, sabem quase sempre que, mais cedo ou mais tarde, se vão ainda poder cruzar com o criminoso fora da prisão. Portanto, para o criminoso, é seguro que a pena efectiva é curta; para a vítima ou potencial vítima, a segurança que o criminoso tem na curta pena que efectivamente terá de cumprir, torna-a insegura. Nem uma coisa nem outra contribui para o sentimento de segurança dos cidadãos. As duas juntas constituem, aliás, um cocktail que pode tornar-se explosivo.
Acreditando na tese segundo a qual o que mais deve doer ao prisioneiro é a falta de liberdade (esse bem preciosíssimo a que damos normalmente pouco valor, talvez por dispormos dele a todo o tempo), a ideia que deveria estar instalada em Portugal é a de que as penas de prisão aplicadas são efectivamente cumpridas. Ora, para que essa ideia seja criada, é preciso não apenas que as penas de prisão aplicadas sejam efectivamente cumpridas, mas também que os criminosos sejam apanhados e efectivamente condenados. De outro modo, o sentimento de insegurança prevalecerá.
Martim Borges de Freitas
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