As aventuras de dois marroquinos no Reino dos All-Garbes.
" Hay que endurecerse,
pero sin perder la ternura,
jamás. "
Che Guevara, 1967.
Porque começamos esta crónica sobre dois marroquinos, no Reino dos All-Garbes, com uma citação de Che Guevara ?
Vamos tentar dar a explicação em meia dúzia de linhas :
Porque a Tita, aquela moça bonita, de quem o Onid não tirava os olhos de cima, era argentina ;
Ora o Che Guevara também era argentino ;
Porque a Tita tinha nascido na cidade de Rosário de Santa Fé ;
Ora o Che Guevara também tinha nascido na cidade de Rosário de Santa Fé ;
Porque a Tita tinha nascido em 14 de Junho de 1978 ;
Ora o Che Guevara também tinha nascido em 14 de Junho de 1928, portanto, cinquenta anos antes ;
Porque os pais da Tita - que eram comunistas - lhe chamaram Ernesta, em homenagem ao Che ;
Ora o Che também se chamava Ernesto ;
Porque a Ernesta rapidamente ficou conhecida por Ernestita e, depois ainda, por Tita ;
Ora o Ernesto Guevara também ficou universalmente conhecido por Che.
Acabam aqui as coincidências na vida destes dois, pois como todos sabemos o Che foi assassinado na Bolívia em 1967, pelas tropas bolivianas, com a colaboração dos ianques, e a Tita está vivinha da costa, conforme vão ver, e nós lhe vamos contar.
A Tita servia à mesa num bar que se chama Havana Club, e que tem uma esplanada debruçada sobre as lagunas da Ria Formosa. Vestida com umas calças, cujo cós ficava muito abaixo da cintura, e uma t'shirt muito curta, que lhe deixava a descoberto um bom palmo de barriga, movimentava-se, ligeirinha, por entre as mesas, encantando o pessoal. ( por pessoal, vocês devem entender os nossos dois marroquinos e, por extensão, este humilde escriba )
Para que justiça seja feita à beleza da Tita, não nos contentamos com o que já foi dito. Vamos lá tentar ser mais justos. Era uma rapariga alta, com tudo no lugar. No devido lugar e em doses perfeitas e bem calibradas, acrescente-se. Tinha os cabelos muito negros, curtos e anelados, e o nariz pintalgado com um punhado de sardas. A cor da pele era de tom castanho claro, dourado e brilhante.
O Onid já fumava cigarro atrás de cigarro. As " sagres " sucediam-se. Era como se não houvesse frescura capaz de acalmar aquele braseiro. O outro marroquino, A. M. F. C. de seu nome, aqui abreviado, dizia-lhe em surdina : === " Vê lá os pulmões, pá. E lembra-te da dor no peito " === . Qual nada, tinha sido paixão à primeira vista. Paixão não, talvez lubricidade... nem sabemos se a palavra existe.... deixa.... aqui fica na mesma.
E o raio da miúda a corresponder aos avanços do Onid.
Na nossa mesa beberam-se as cervejas mais frescas da casa. A Tita providenciava para que assim fosse e, quando as trazia, e depois se afastava, atendendo outras mesas, toda ela um bailado erótico, olhava de esguelha para o Onid, comprovando o efeito.
Provocante, muito provocante.
O resto não contamos. Até porque também não sabemos o que se passou. Só sabemos que em determinada altura, o Onid desapareceu, só voltando meia hora depois com um ar muito afogueado. Curiosamente, a empregada das mesas também desapareceu durante essa meia hora, deixando o autor destas linhas e o outro marroquino sem cervejas.
A noite não acabou como o Onid gostaria. Quando o bar estava a fechar, apareceu o namorado da Tita.
Vinha buscá-la. Exactamente quando ela nos contava as coincidências da sua vida com a vida do Che.
Partiram montados numa bruta moto.
Sean O'flaherty D. R. K.
P. S. === O outro marroquino também não se livrou de entrar no baile. Depois vos contaremos.
4 comentários:
Olha que trio!
"Esse" Onid sempre me saiu cá uma "prenda"....
Bela descrição Sr Sean, quase que me sentia lá a viver esses momentos que tanto gosto.
Olha:
»»»E DEPOIS CANTOU-SE O FADO»»»
Um grande abraço para os três
Chico
grande prosa.
gostei especialmente da frase de introdução do Che.
Gostei da cena.
Gostei do tom brejeiro.
Gostei da forma descritiva.
Gostei da ousadia. Não ofende.
Contudo, pelo que conheço, não me parece que o Che gostasse de ver-se misturado com quecas de praia. Afinal, o homem morreu por aquilo em que acreditava.
Muito embora eu saiba que ele não foi nenhum santo, a verdade é que, queiramos ou não, foi uma das maiores personalidades do século XX.
Ao contrário do que muitos pensarão e à primeira vista possa parecer, o nome de Che Guevara não fica deslocado num texto desta natureza. Habituaram-nos a fixar o mito, a lenda, o revolucionário. E a essa imagem colaram uma aparência de austeridade e dureza, esquecendo o homem. Pois aqueles que o conheceram bem, e sobre ele escreveram depois da sua morte, os seus amigos, são bem claros no que dizem. Era um ser humano brincalhão, divertido, que nunca desdenhava uma boa farra. Estava muito longe daquela imagem que depois nos venderam, com a metralhadora empunhada e pronta a disparar. Esse era o guerrilheiro, para quem as questões eram sempre de vida ou morte. O outro, o homem, era como todos nós. Teve cinco filhos. Como é que pensam que ele os fez ? Nessa altura não havia inseminação artificial !.. Para quem, porventura, tenha interesse em saber quem era o homem, por detrás do guerrilheiro, aqui deixo o nome de três ou quatro livros que são bem esclarecedores.
" O Meu Amigo Che " de Ricardo Rojo. ( edição brasileira )
" Ernesto CHE Guevara " de Regis Debray. ( edição brasileira )
" El año que estuvímos en nínguna parte " de Paco Ignacio Taibo II ( edição espanhola )
" El Che - Uma Lenda do Século " de Pierre Kalfon ( editora Terramar ) edição portuguesa.
Todos estão à venda na FNAC.
( passe a publicidade )
Terminei
Enviar um comentário