
Quando da publicação dos “OFICIOS”, apareceu uma fotografia duma loja e de imediato pensei em escrever, pareceu-me, como filho de lojista, que me seria muito fácil.
Hesitei até hoje, não por falta de memória ou porque me tenha esquecido das ligações
a esses estabelecimentos e muito menos pelo medo de me ver bipolarizado, em duelo de palavras, como a primeira vez em que um meu artigo apareceu no Blog.
Escrever ou exercer um acto de cidadania, numa intervenção politica ou cívica passa a ser um acto heróico.
Parece que a Democracia se remeteu a um silêncio de quatro em quatro anos, para aparecer estridente, numa acutilância de degradação e ofensas pessoais e recolher-se
novamente. Parece ter donos.
Leviano seria, se não reconhecesse os excessos praticados por alguns anónimos comentarista, que esquecendo-se do fulcro da questão ou não a sabendo discutir, entram em picardias, chocando uns com os outros, motivando o afastamento de pessoas bem intencionadas e que poderiam dar um contributo positivo, nas causas, que a todos são comuns e, por inerência, temos o dever de lutar por elas.
Que se medite e regresse ao respeito e à verdade democrática.
Mais uma vez hesito em começar pelas lojas do Alandroal ou de Terena, pois a minha vivência decorreu e decorre entre estas duas Vilas.
No Alandroal, na rua da Mata, o senhor Bernardino era o protótipo de um comerciante
citadino, alto, bem vestido e de trato afável, a contrastar com o senhor Alexandre, falador em demasia, acompanhava a fala com grande gesticulação, cuja loja, hoje do senhor Coelho, está quase na mesma.
A loja do Valadas, do nosso sempre saudoso Arnaldo, o homem de todas as juventudes
e que aqui já foi recordado, está como a primeira vez que lá entrei.
Outras lojas houve, que poderiam ser mencionadas mas, creio, que seria enfadonho para o leitor, descrever mais.
Contudo, pretendo ainda citar a loja de sapateiro do senhor Morcela, do velho Morcela, na rua da Mata.

A casa era funda e trabalhavam quatro ou cinco oficiais.
A figura do mestre, homem baixo, de calças caídas, com a fralda da camisa saída, com o chapéu um pouco para trás e descaído para o lado direito, impressiono-me
e por isso o recordo. Talvez por ser perto e de eu passar algum tempo em casa do meu padrinho João Francisco, de alcunha o pavão, que era carpinteiro e irmão do António do Lucas, ainda vivo.
Um dia indo com o meu avô Salgado, comprar petróleo à loja do senhor Alexandre, assisti à primeira discussão da minha vida e felizmente poucas mais ouvi.
Este combustível usava-se nos candeeiros, utensílios de vidro, com um depósito, encimado com uma chaminé também de vidro, onde o petróleo, com o auxílio de uma torcida de algodão ardia dando luz e, que pouco a pouco, foi substituindo a velha candeia de azeite.
Nos Montes o candeeiro era um luxo.
O meu avô sem entrar na loja, pede para lhe encherem uma lata de petróleo, os empregados receberam o dinheiro, mas não vieram aviá-lo.
O petróleo em pequenas quantidades, era aviado do outro lado da Praça e em
grandes, perto do outeiro das nozes e por detrás da escola primária.
O empregado, homem baixo e atarracado chamava-se Sebastião.
O meu avô impacienta-se e grita. De repente sai o Alexandre, desatam numa discussão, que eu fiquei sem fala até ao Monte.
Aí chegados perguntei à minha avó, o motivo daquela. Um dia o meu avô, entrara na loja de chapéu e o Alexandre mandara-o tirar, daí o nunca mais lá entrar.
Reparem como se entra, de hoje em dia, em qualquer estabelecimento público ou privado.
“Mercas” esta palavra ouvira-a ao meu avô, quando comprava alguma coisa, num pequeno mercado que se fazia no passeio, em frente do jardim das casas de banho.
Jamais a esquecerei, assim como outra “Sanja,” vala falsa, que só no Alandroal a ouvira.
E recordar é viver, deixem-me apenas recordar outra, ligada ao Colégio e à saudosa Marianita Azevedo. Numa lição de português, num trecho do Malhadinhas. A dona Marianita pediu um sinónimo de brandura, respondi orvalho. Ficou surpreendida e
perguntou, porque sabia. Tinha-a ouvido na Amareleja, quando, novinho, acompanhava o meu pai na compra do melão e apercebi-me que se referiam ao orvalho.
Nessa lição de português fiquei ciente, que as pessoas simples e incultas, também nos
podem dar grandes lições.
Helder Salgado
14-02-2009.
CONTINUA ... amanhã as Lojas de Terena
5 comentários:
Faço questão de o primeiro comentário a este texto ser meu.
Em primeiro lugar agradecer ao Helder a valorização deste espaço enviando textos que poderão vir a constituir um marco na história do nosso Concelho.
Porque sabe destrinçar o trigo do joio e compreender os verdadeiros fins deste blogue: a valorizaão da nossa terra, das nossas gentes.
É bonito pá!
Um pedido de desculpas pela formatação do texto... mas não fui capaz de melhor.
Um abraço
Chico Manel
Como não podia deixar de ser,tambem aqui e agora,vai o meu agradecimento ao HELDER, por todos os belos momentos que nos dá, ao ter a gentileza de nos fazer recordar aqueles, que de alguma forma contribuiram para a nossa formação,educação, crescimento,etc.
um abraço,
HOMERO
Grande Helder,
Também eu não podia deixar de te saudar por essa iniciativa.
Tem que ser a velha guarda a meter esta juventude na linha.
Continua.
Abraços
Chico
Helder
Uma saudação muito especial pela referência que fazes,diria,"às Pequenas vidas de Grandes Homens.O meu avô incluido.
Tanto mais que estás a escrever cada vez com mais profundidade sobre assuntos e pessoas da nossa terra que merecem sempre mas sempre ser lembrados.
A memória do Alandroal, deve-lhe muito da sua e da nossa própria existência, quando a seguir falamos em tentar aprender-lhe e perceber o curso das nossas próprias Vidas.Com aquela pontinha de nostalgia que tanta falta nos vai fazendo.
Mas todos os outros, os que vens referindo e recordando aqui e mais além,com este e aquele nome,com este e mais aquele diferente modo de vida,foram igualmente grandes trabalhadores,grandes pais e seguramente Homens inteiros.
Sempre integros na defesa da sua honra,da sua verticalidade,do seu trabalho e da sua bela integridade moral e humana.
Por outras palavras,diria que temos e sentimos admiração por Eles porque mantiveram sempre a Espinha direita para que os filhos pudessem ver e os netos viessem a admirar.
Tanto na sua postura quanto na sua maneira de serem Homens em corpos trabalhadores,alma inteira e espírito aberto à dureza do Mundo que os envolvia.
Helder
seja pela tua prosa seja pelas tuas poesias, só tens que continuar assim.Dando-te aos outros para também te dares aos Amigos,à vida e a ti próprio.
Escreve mais que a gente gosta muito.
Um abraço
António Neves Berbem
Os jovens na linha???????
Vocês homens maduros não se entendem...vem agora falar dos jovens!?
Há comentários muito infelizes,realmente.
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