segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

RECORDAR O PASSADO - PELO HELDER SALGADO

AS LOJAS - santuário do entendimento -.



Quando da publicação dos “OFICIOS”, apareceu uma fotografia duma loja e de imediato pensei em escrever, pareceu-me, como filho de lojista, que me seria muito fácil.
Hesitei até hoje, não por falta de memória ou porque me tenha esquecido das ligações
a esses estabelecimentos e muito menos pelo medo de me ver bipolarizado, em duelo de palavras, como a primeira vez em que um meu artigo apareceu no Blog.
Escrever ou exercer um acto de cidadania, numa intervenção politica ou cívica passa a ser um acto heróico.
Parece que a Democracia se remeteu a um silêncio de quatro em quatro anos, para aparecer estridente, numa acutilância de degradação e ofensas pessoais e recolher-se
novamente. Parece ter donos.
Leviano seria, se não reconhecesse os excessos praticados por alguns anónimos comentarista, que esquecendo-se do fulcro da questão ou não a sabendo discutir, entram em picardias, chocando uns com os outros, motivando o afastamento de pessoas bem intencionadas e que poderiam dar um contributo positivo, nas causas, que a todos são comuns e, por inerência, temos o dever de lutar por elas.
Que se medite e regresse ao respeito e à verdade democrática.

Mais uma vez hesito em começar pelas lojas do Alandroal ou de Terena, pois a minha vivência decorreu e decorre entre estas duas Vilas.
No Alandroal, na rua da Mata, o senhor Bernardino era o protótipo de um comerciante
citadino, alto, bem vestido e de trato afável, a contrastar com o senhor Alexandre, falador em demasia, acompanhava a fala com grande gesticulação, cuja loja, hoje do senhor Coelho, está quase na mesma.
A loja do Valadas, do nosso sempre saudoso Arnaldo, o homem de todas as juventudes
e que aqui já foi recordado, está como a primeira vez que lá entrei.
Outras lojas houve, que poderiam ser mencionadas mas, creio, que seria enfadonho para o leitor, descrever mais.
Contudo, pretendo ainda citar a loja de sapateiro do senhor Morcela, do velho Morcela, na rua da Mata.



A casa era funda e trabalhavam quatro ou cinco oficiais.
A figura do mestre, homem baixo, de calças caídas, com a fralda da camisa saída, com o chapéu um pouco para trás e descaído para o lado direito, impressiono-me
e por isso o recordo. Talvez por ser perto e de eu passar algum tempo em casa do meu padrinho João Francisco, de alcunha o pavão, que era carpinteiro e irmão do António do Lucas, ainda vivo.
Um dia indo com o meu avô Salgado, comprar petróleo à loja do senhor Alexandre, assisti à primeira discussão da minha vida e felizmente poucas mais ouvi.
Este combustível usava-se nos candeeiros, utensílios de vidro, com um depósito, encimado com uma chaminé também de vidro, onde o petróleo, com o auxílio de uma torcida de algodão ardia dando luz e, que pouco a pouco, foi substituindo a velha candeia de azeite.
Nos Montes o candeeiro era um luxo.
O meu avô sem entrar na loja, pede para lhe encherem uma lata de petróleo, os empregados receberam o dinheiro, mas não vieram aviá-lo.
O petróleo em pequenas quantidades, era aviado do outro lado da Praça e em
grandes, perto do outeiro das nozes e por detrás da escola primária.
O empregado, homem baixo e atarracado chamava-se Sebastião.
O meu avô impacienta-se e grita. De repente sai o Alexandre, desatam numa discussão, que eu fiquei sem fala até ao Monte.
Aí chegados perguntei à minha avó, o motivo daquela. Um dia o meu avô, entrara na loja de chapéu e o Alexandre mandara-o tirar, daí o nunca mais lá entrar.
Reparem como se entra, de hoje em dia, em qualquer estabelecimento público ou privado.
“Mercas” esta palavra ouvira-a ao meu avô, quando comprava alguma coisa, num pequeno mercado que se fazia no passeio, em frente do jardim das casas de banho.
Jamais a esquecerei, assim como outra “Sanja,” vala falsa, que só no Alandroal a ouvira.
E recordar é viver, deixem-me apenas recordar outra, ligada ao Colégio e à saudosa Marianita Azevedo. Numa lição de português, num trecho do Malhadinhas. A dona Marianita pediu um sinónimo de brandura, respondi orvalho. Ficou surpreendida e
perguntou, porque sabia. Tinha-a ouvido na Amareleja, quando, novinho, acompanhava o meu pai na compra do melão e apercebi-me que se referiam ao orvalho.
Nessa lição de português fiquei ciente, que as pessoas simples e incultas, também nos
podem dar grandes lições.

Helder Salgado
14-02-2009.


CONTINUA ... amanhã as Lojas de Terena

5 comentários:

francisco tátá disse...

Faço questão de o primeiro comentário a este texto ser meu.
Em primeiro lugar agradecer ao Helder a valorização deste espaço enviando textos que poderão vir a constituir um marco na história do nosso Concelho.
Porque sabe destrinçar o trigo do joio e compreender os verdadeiros fins deste blogue: a valorizaão da nossa terra, das nossas gentes.
É bonito pá!
Um pedido de desculpas pela formatação do texto... mas não fui capaz de melhor.
Um abraço
Chico Manel

Anónimo disse...

Como não podia deixar de ser,tambem aqui e agora,vai o meu agradecimento ao HELDER, por todos os belos momentos que nos dá, ao ter a gentileza de nos fazer recordar aqueles, que de alguma forma contribuiram para a nossa formação,educação, crescimento,etc.
um abraço,
HOMERO

Anónimo disse...

Grande Helder,

Também eu não podia deixar de te saudar por essa iniciativa.

Tem que ser a velha guarda a meter esta juventude na linha.

Continua.

Abraços

Chico

Anónimo disse...

Helder

Uma saudação muito especial pela referência que fazes,diria,"às Pequenas vidas de Grandes Homens.O meu avô incluido.

Tanto mais que estás a escrever cada vez com mais profundidade sobre assuntos e pessoas da nossa terra que merecem sempre mas sempre ser lembrados.
A memória do Alandroal, deve-lhe muito da sua e da nossa própria existência, quando a seguir falamos em tentar aprender-lhe e perceber o curso das nossas próprias Vidas.Com aquela pontinha de nostalgia que tanta falta nos vai fazendo.

Mas todos os outros, os que vens referindo e recordando aqui e mais além,com este e aquele nome,com este e mais aquele diferente modo de vida,foram igualmente grandes trabalhadores,grandes pais e seguramente Homens inteiros.

Sempre integros na defesa da sua honra,da sua verticalidade,do seu trabalho e da sua bela integridade moral e humana.

Por outras palavras,diria que temos e sentimos admiração por Eles porque mantiveram sempre a Espinha direita para que os filhos pudessem ver e os netos viessem a admirar.
Tanto na sua postura quanto na sua maneira de serem Homens em corpos trabalhadores,alma inteira e espírito aberto à dureza do Mundo que os envolvia.

Helder

seja pela tua prosa seja pelas tuas poesias, só tens que continuar assim.Dando-te aos outros para também te dares aos Amigos,à vida e a ti próprio.

Escreve mais que a gente gosta muito.

Um abraço


António Neves Berbem

Anónimo disse...

Os jovens na linha???????

Vocês homens maduros não se entendem...vem agora falar dos jovens!?

Há comentários muito infelizes,realmente.