sexta-feira, 17 de novembro de 2006

CRÓNICAS DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM

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Crónica de 17 de Novembro de António Leitão

Sexta, 17 Novembro 2006
No domingo passado, ainda eu estava um tanto ou quanto melancólico depois das castanhas e do vinho novo, eis que subitamente, por puro acaso, apanho a voz vibrante do nosso Primeiro-Ministro José Sócrates no rádio do carro.
A minha mulher ia ao volante e eu, com a bela paisagem do Outono a passar-me ao lado, pude ouvir o que foi um belo discurso, entusiástico, pleno de força, que me pareceu sincero, capaz de atingir o pleno no Congresso do PS. Isto apesar das acusações de “pouca esquerda” que lhe são feitas e da insistência doentia no discurso optimista sobre o futuro da economia em Portugal que, sendo visivelmente enganador, irrita qualquer um e não contribui para que tomemos as nossas decisões difíceis no momento certo. Em tempos de globalização e neoliberalismo, podemos estar certos de que não há nenhum paizinho para nos proteger.
2 dias depois, vi e ouvi o Dr. Silva Lopes na TV, numa entrevista sobre os seus 30 anos de vida político-económica activa em Portugal. Uma pessoa lúcida, cheia de experiência, sem papas na língua. Para compreender melhor o futuro da economia em Portugal, todos nós o deveríamos ouvir com frequência e tentar perceber porque é que ele, não sendo comunista, declara que não é liberal; porque é que ele acha que os tão falados compromissos com o País que gestores de topo gostam de fazer visam fundamentalmente obter vantagens nas privatizações, em troca de promessas que não podem cumprir; ou porque é que lhe parece indispensável que a educação dos jovens seja exigente para que o País possa melhorar.
Lembrei-me do nosso Presidente Prof. Cavaco Silva, que continua mês após mês sem dizer nada que nos interesse.
Mas, voltando à bela manhã de Outono e ao discurso de José Sócrates, não pude deixar de reparar que as suas ideias passavam bem na rádio, com a vantagem de não lhe vermos a cara, bem melhor do que na TV, em que aproveita cada segundo de antena para repetir sempre as mesmas frases de propaganda. Os seus especialistas de marketing continuam a apostar na superficialidade da comunicação. E é pena, porque percebe-se que José Sócrates é capaz de fazer bons discursos, com substância a que os portugueses poderiam aderir de forma mais profunda.
Ainda me lembro de grandes discursos que ouvi na minha infância, de um ditador chamado Salazar, ouvidos em silêncio e com muita atenção por toda a gente. Porque as suas palavras não eram vãs. Ele era sério e metia medo. Não queria agradar. Raramente era visto, mas sabia tudo o que se passava, estava muito bem informado. Como se tudo visse. “Ver é um acto divino” (Feuerbach). Visão e poder são dois atributos que sempre aparecem em correlação. Não há nada mais inquietante para um animal do que ver-se observado por outro. E de cima vê-se sempre melhor.
Nestes tempos de fim de festa, a política em Portugal está-se a tornar um assunto sério, com efeito directo sobre a vida das pessoas. Precisamos de políticos em quem se possa confiar, de quem não suspeitemos que têm intenções escondidas contrárias aos nossos interesses. Ouvimos José Sócrates e perguntamos: Será que ele tem mesmo o génio que parece, e a coragem para pedir os sacrifícios necessários? Será que ele é mais do que o resultado de uma boa máquina de propaganda? Será que ele é capaz de dar o exemplo? Reparem que temos, pela 1ª vez, um Primeiro-ministro que não cai nas sondagens. Se a resposta é sim, aposto que os seus discursos vão continuar a melhorar e que vamos passar a vê-lo mais raramente.

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