O Emagrecimento do Estado
José Faustino
Terça, 24 Outubro 2006
Por esta altura da discussão do Orçamento de Estado vem sempre à baila o exagero da despesa pública e as várias maneiras de emagrecer o monstro.
Penso que tudo devia ser repensado, devendo-se empreender uma profunda reforma do Estado e elaborar um orçamento de base zero, tendo por principio as reais necessidades da administração e não a mera adaptação dos números para o ano seguinte, em função das circunstâncias.
Também me parece que as preocupações do Parlamento não se deviam concentrar apenas no orçamento, seria igualmente importante analisar as contas à posteriori, no final de cada ano, e avaliar a execução orçamental.
Para diminuir a despesa pública será necessário tomar dois tipos de medidas, as que valem pela sua importância quantitativa e as de importância qualitativa.
As medidas quantitativas, têm muito mais importância pelos efeitos práticos que produzem, as medidas qualitativas valem, sobre tudo pelo exemplo que dão à sociedade. São uma referência e um exemplo para os governados e uma sólida base de sustentação moral para os governantes.
Quando é necessário tomar medidas duras e pedir sacrifícios, como é o caso, é bom que todos sejam abrangidos, começando desde logo pelos que ocupam os mais elevados escalões da hierarquia do Estado onde se incluem, em primeiro lugar os cargos políticos. Como diz o povo: os bons exemplos devem vir de cima.
A primeira medida de fundo que devia ser tomada seria a própria organização política e administrativa do País.
Devia ser reduzido o número de funcionários da Presidência da Republica, a Assembleia da Republica deveria reduzir, pelo menos, para metade o seu número de deputados e, consequentemente, o número de funcionários dos grupos parlamentares. Justificar-se-á tanta gente para representar no parlamento uma reduzida população de um pequeno país como o nosso?
O Governo devia ser reduzido no número de ministérios. Fará sentido haver um ministério da agricultura e pescas separado das restantes actividades económicas? Justificam-se os ministérios da cultura e dos assuntos parlamentares? E o do ambiente? Esta não será uma matéria transversal a todos os outros ministérios?
Depois, era bom que o governo mantivesse a estrutura mesmo quando muda de cor partidária, a manutenção da estrutura governamental deveria ser a regra e a sua alteração apenas a excepção.
Num país tão pequeno, serão necessárias tantas câmaras municipais e juntas de freguesia, com milhares de eleitos e funcionários? Creio que não.
Com a redução do número destes órgãos autárquicos, para além da poupança que originaria, muito se ganharia em eficácia.
Os próprios executivos autárquicos só teriam a ganhar com a redução do seu número de elementos.
Também seria bom que se abandonasse definitivamente a ilusão da regionalização, pois nada trará de positivo e só servirá para aumentar a despesa.
Estas medidas, para além da redução significativa da despesa que originariam, teriam a grande vantagem de dar um bom exemplo à população, pois os principais atingidos seriam aqueles que ocupam cargos de eleição e nomeação politica. Depois, então sim, seria muito mais fácil pedir sacrifícios, nessa altura até já se poderia falar, com autoridade moral, em reduzir o número de funcionários públicos se, por ventura, isso ainda fosse necessário.
Será sempre muito mais fácil exigir sacrifícios aos outros quando os próprios políticos forem os primeiros a sacrificarem-se.
Ao contrário, fica-se sempre com a impressão de que os sacrifícios são sempre para os outros e que os políticos e os seus amigos se lhes vão escapando.
Ser de esquerda hoje
Domingos Cordeiro
Terça, 24 Outubro 2006
Por imperativo constitucional todos os portugueses têm direito à protecção na saúde.
Dito desta forma, a intenção do governo em cobrar, a partir de 1 de Janeiro, uma taxa diária de 5 euros até ao limite de 10 dias, pode parecer uma medida não só injusta como atentatória da filosofia que conduziu á criação do sistema nacional de saúde.
Afigura-se-me que quem assim pensa não tem razão.
Diga-se, desde já, que a criação do sistema nacional de saúde tem a marca indelével do partido que neste momento suporta o governo.
Foi através de um governo e de um ministro socialista, António Arnaut, que o serviço nacional de saúde conheceu a luz do dia.
Ora, para uma analise séria e objectiva da questão importa dizer que a Constituição da Republica Portuguesa previa até à quarta revisão constitucional que ocorreu em 1997 que: o direito à protecção da saúde é realizado por um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito.
Após esta revisão passou a constar que: o direito à protecção da saúde é realizado através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito.
Isto é, já em 1997 o legislador havia percebido que o acesso á saúde, como bem geral e gratuito não passava, como não passa, de uma mera utopia.
Vale isto por dizer que aqueles que criticam o governo por esta medida, com o argumento de que o serviço nacional de saúde é para ser gratuito não têm razão.
Ainda que esta taxa de internamento só tenha que ser paga por quem ganhe quinhentos ou mais euros por mês percebe-se que aqueles que a ela ficarão obrigados não a aceitem de bom grado.
Sabe-se, contudo, que 55% dos portugueses ficarão isentos de tal taxa.
E, pese embora a fase de aperto económico em que vivemos, muito pelo facto de o país ter vivido, durante anos e anos acima das suas posses dizer, que quem ganha por mês quinhentos euros ou menos é um miserável é, no mínimo, um insulto para muitos portugueses.
Percebo, como já referi, que se trata de uma medida impopular, diria mesmo, muito impopular.
E, sendo assim, importa perguntar porque razão, pretende o governo levá-la por diante?
Não seria melhor deixar tudo na mesma evitando desta forma perder apoiantes?
O que resulta da posição do governo é, em meu entender, muito simples.
Fez a avaliação que tinha que fazer e constatou aquilo que é, há muito, por demais evidente: o serviço nacional de saúde vem-se confrontando, ano após ano, com uma série de problemas que agravam exponencialmente a despesa com a saúde, de entre os quais destaco os seguintes: os portugueses nascem menos e demoram mais a morrer; os tratamentos são cada vez mais sofisticados e eficientes e, consequentemente, cada vez mais caros.
Vale por dizer que a progressão da despesa é de tal ordem que se não houver, numa perspectiva de solidariedade entre portugueses, uma contribuição por parte daqueles que o podem fazer, o sistema pode colapsar.
O que está na mente do governo é evitar que o sistema entre em colapso.
O que está em causa é, pois, não a transformação do sistema nacional de saúde, num sistema caritativo, destinado a miseráveis mas antes salvando-o da rotura, permitir que o mesmo cumpra com o seu papel de sistema estruturante do estado de direito democrático, por muito que isso custe àqueles que gostariam de assistir ao seu desmantelamento.
Criticar esta taxa que, como bem foi referido pelo Ministro da Saúde, vai pouco além do custo de um maço de cigarros, é esquecer que o que está em causa é o princípio da solidariedade de quem mais tem para com aqueles que menos têm, principio que é, foi e será sempre uma bandeira daqueles que se dizem de esquerda.
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