EDUARDO LUCIANO
COMUNICAR COISA NENHUMA
Dois homens foram detidos no último domingo. A razão que levou às
detenções prendem-se com factos ocorridos em Maio e tiveram, nessa altura,
honras de primeira linha noticiosa que durou duas semanas.
Hoje
é quinta-feira e as televisões, jornais, rádios e sítios de notícias continuam
a falar do assunto com imagens de portões de postos policiais, nucas de
familiares e polícias, opiniões de idiotas que condenam hoje o que glorificavam
ontem e que tiram conclusões sobre factos que poderão não o ser.
Não
é a primeira vez que se regista este comportamento perante uma detenção para
interrogatório de figuras que andaram ao colo dos que agora pretendem fazer-nos
espreitar pelo buraco da fechadura, para sabermos em pormenor coisas que não
têm importância nenhuma para a nossa vida colectiva, mas desta vez subiram mais
um patamar na capacidade de chafurdar no chiqueiro que alimentam diariamente.
São
os únicos culpados? Claro que não. Quem avisa esta gente do que vai acontecer,
para que estejam à porta do suspeito com o circo montado, tem mais
responsabilidade do que os responsáveis do espectáculo. Quem permite e promove
espectáculos em torno da nomeação de um juiz, como aconteceu recentemente
noutro processo, devia saber que este não é o caminho da transparência mas do
fim da justiça como um bem a ser preservado como pilar da civilização.
Todos
sabemos a quem serve tudo isto. Basta pensar que enquanto estamos todos de rabo
para o ar a espreitar pelo buraco da fechadura, para tentar saber de que cor
são as paredes da cela onde detiveram as figuras, o ministro do ambiente sugere
que a forma de baixar a factura da electricidade é reduzir a potência
contratada e isso nem sequer é alvo de qualquer movimento de indignação.
A
anestesia tem o condão de permitir que nos escarafunchem nas feridas sem que
sintamos dor e é isso que nos servem dia e noite em doses cavalares de
voyeurismo, mau jornalismo, manipulação básica e indigência intelectual.
É
por isso que quando entramos num café e olhamos para a televisão pendurada na
parede, dizemos já estou farto de ver a cara destes personagens e ainda assim
não desviamos o olhar.
Já
vi hipnotizadores menos eficazes.
Até
para a semana
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