segunda-feira, 24 de setembro de 2018

VASCULHAR O PASSADO - Augusto Mesquita

                         Tentativa para salvar  o nosso Centro Histórico
 A Notável Vila de Montemor-o-Novo situava-se inicialmente na parte interior do Castelo, que abrigava o palácio dos alcaides, os paços do concelho (junto aos quais se realizava o mercado), o pelourinho, a cadeia, o matadouro, cisternas, convento da saudação , as igrejas de Santa Maria do Bispo, de Santa Maria da Vila, de Santiago e de S. João Batista, e naturalmente as habitações dos nossos antepassados.
            A pacificação do território e a altitude a que se encontra o Castelo, fez com que a população procurasse a proximidade com a estrada real, que passava pelo sopé do monte, provocando um fenómeno de abandono do recinto fechado em favor da actual localização, não obstante D. Manuel em 1508, ter concedido grandes privilégios aos moradores do Castelo, para impedir o seu abandono.
            Em 1571 existiam 800 fogos no sopé do monte, enquanto o velho burgo se encontrava já praticamente despovoado. No arrabalde se situavam então a maior parte dos conventos e ermidas, os hospitais, os paços do concelho, o pelourinho, a cadeia, as estalagens, as atafonas, os lagares e várias fontes.
Estas construções edificadas no século XVI, e outras que se seguiram, foram classificadas  como Centro Histórico.
            Segundo a Investigadora e Professora Catedrática Teresa Barata Salgueiro, os centros históricos para alem de serem “as partes mais antigas  da cidade”, constituem-se como uma “sucessão de testemunhos de várias épocas, monumento que nos traz vivo o passado, nos dá a dimensão temporal com a sequência dos factos que estruturam as identidades”.
            O centro histórico de uma cidade, é regra geral a área mais antiga, que se tornou progressivamente o centro da cidade moderna, e que coincide normalmente “com o núcleo de origem do aglomerado, de onde irradiaram outras áreas urbanas sedimentadas pelo tempo, conferindo assim a esta zona uma característica própria cuja delimitação deve implicar todo um conjunto de regras tendentes à sua conservação e valorização.
            Ora, é justamente o reconhecimento desse valor que levou a Câmara Municipal de Montemor-o-Novo  a admitir em 1984 para o seu Quadro de Pessoal o arquitecto portuense José Manuel Garrett de Castro Guimarães para ocupar o cargo de Chefe da Divisão de Administração Urbanística e coordenar os primeiros trabalhos de planeamento urbanístico, no rol dos quais se inclui o primeiro PDM, ratificado pelo Conselho de Ministros reunido em 30 de Julho de  1993.
            Com o objectivo de estabelecer um conjunto de regras que visam orientar a transformação do conjunto urbano do nosso Centro Histórico, definindo condições essenciais para a sua renovação, recuperação e rentabilização, mantendo o carácter essencial da sua arquitectura e imagem urbana, o Zé Garrett (como era carinhosamente tratado), elaborou a proposta de Regulamento Municipal das Edificações Urbanas, que inclui as disposições aplicáveis ao Centro Histórico, a qual viria a ser aprovada pela Câmara Municipal e Assembleia Municipal.
            Muitas autarquias já se tinham antecipado à CMMN nesta preocupação de defesa destes legados que nos mostram como se vivia em épocas passadas, criando os seus Centros Históricos e normas que regulam a sua conservação. O número de autarquias com Centros Históricos aprovados, levou à fundação em 22 de Julho de 1988 na cidade de Lamego, da Associação Portuguesa dos Municípios com Centro Histórico (APMCH), à qual se associou a CMMN. Esta associação escolheu o dia 28 de Março data do nascimento de Alexandre Herculano, o seu patrono, como o Dia Nacional dos Centros Históricos 

                                                        Propostas para o centro histórico
Reconhecida a importância da recuperação/reabilitação das zonas antigas e também nos recursos financeiros ou programas de apoio à recuperação, a Câmara Municipal de Montemor-o-Novo com o objectivo de retirar das experiências de uns os melhores resultados para todos, convidou todas as Câmaras do país para participarem no Espaço/Debate sobre Centros Históricos, que se realizou no Auditório da Biblioteca Municipal Almeida Faria em Setembro de 1993. Neste encontro de trabalho sobre centros históricos, participaram 141 autarquias e 26 Gabinetes de Apoio Técnico.
            Programa do Encontro: Dia 23 (quinta-feira) – 09,30 às 10,00 horas – entrega de documentação; 10,00 às 10,30 horas – intervenção de abertura; pausa para café; 11,00 às 13,00 horas – casos de intervenção global e recuperação de Centros Históricos com comunicações das Câmaras Municipais de Beja, Braga, Lisboa, Montemor-o-Novo e Porto. Almoço oferecido pela CMMN. Das 15,00 às 16,30 horas – sistemas financeiros de apoio à recuperação de edifícios com intervenções das Câmaras Municipais de Lisboa, Loures, Mértola, Montemor-o-Novo e Porto. Pausa para café: 17,00 às 19,00 horas – visita de trabalho seguida de jantar convívio com animação.
            Dia 24 (sexta-feira) – 09,30 às 10,30 horas – o mobiliário urbano em zonas antigas com comunicações das Câmaras Municipais de Évora e Guimarães; pausa para café; 11,00 às 13,00 horas – 1.ª Sessão Debate – mesa redonda. Almoço oferecido pela CMMN. Das 15,00 às 18,00 horas – 2.ª Sessão Debate – mesa redonda. Pausa para café; 18,30 às 19,00 horas – conclusões; intervenção de encerramento.
            A intervenção de abertura esteve a cargo do Presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, José Vicente Grulha, enquanto a intervenção de encerramento esteve a cargo do Presidente da Associação Portuguesa de Municípios com Centros Históricos, Dr. Júlio José Saraiva Sarmento.
            Conclusões:
            O Espaço/Debate sobre Centros Históricos, organizado pela Divisão de Administração Urbanística da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, reunido nos dias 23 e 24 de Setembro de 1993 no Auditório da Biblioteca Municipal, recomenda e conclui:
            1. Que os estudos, regulamentos e acções a desenvolver no âmbito da reabilitação urbana tomem em conta a existência da área da intervenção como uma parte do todo que a envolve de forma a proporcionar intervenções equilibradas no todo construído;
            2. Que as intervenções assumam, sempre que possível um carácter de projectos de desenvolvimento e de participação alargada a todos os agentes activa e passivamente;
            3. Que os Gabinetes Técnicos alarguem o seu âmbito profissional a áreas complementares tal como a arqueologia (“classificação do subsolo”), a comunicação e informação e outras que permitam um estudo integrado o mais aprofundado e particular possível;
            4. Que o  Governo e a Assembleia da República regulamente e/ou publique a legislação necessária ao enquadramento das intervenções nas zonas de reabilitação urbana, nomeadamente o Plano de Segurança;
            5. Que os meios financeiros a aplicar nesta área sejam agrupados num sistema único, flexível, e hierarquizado em termos de objectivos, e que permitam a sua adaptabilidade caso a caso, pelos órgãos do Poder Local, sendo estes os verdadeiros motores das iniciativas de reabilitação;
            6. Que as acções em curso atendam a efeitos mobilizadores das dinâmicas locais, induzidos por acções de demonstração que englobem melhorias no âmbito do mobiliário urbano, da segurança urbana e dos outros factores da intervenção em espaços públicos;
            7. Grande parte dos imóveis localizados nos Centros Históricos, pela sua dimensão, idade e estado de conservação, constituem bem de reduzido valor económico, frequentemente pertencentes a vários particulares o que gera situações de indefinição quanto à sua propriedade e obstaculiza qualquer acção de recuperação. Nestes termos recomenda~se ao Governo e Assembleia da República a adopção das medidas legislativas adequadas à necessária e urgente ultrapassagem deste problema que é crucial para a recuperação de muitos Centros Históricos;
            8. Que os Serviços de Cartografia Militar que possuem um valioso Arquivo Histórico e Arquitectónico de muitas cidades e vilas do país que forneçam, através do respectivo organismo de tutela, cópias aos respectivos municípios;
            9. Que a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Municípios com Centros Históricos estejam representados nos Órgãos Institucionais que regem o Património;
            10. Que a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Municípios com Centros Históricos, desenvolvam o conjunto de estudos e propostas legislativas, institucionais e financeiros que possam atender às recomendações acima mencionadas e às anteriormente formuladas em “Encontros” deste género, com vista a apresentá-los aos Órgãos do Poder para a sua posterior discussão, aprovação e aplicação;
            11. Que os materiais a utilizar na recuperação de edifícios correspondam ou sejam compatíveis com os materiais e tecnologias empregues na sua construção.
            O Espaço/Debate teve o apoio da Associação de Municípios de Évora e o patrocínio das seguintes entidades: Banco Espírito Santo, Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Montemor-o-Novo, Crédito Predial Português, Estabelecimentos Baldeira, Grafimonte, José Joaquim Cornacho & Filhos, Ld.ª, Representações Matos e Silva Borges, Ld.ª.
           
O bom filho a casa volta - poucos anos depois de se ter aposentado, em Junho de 1998 o Arquitecto Zé Garrett regressa a Montemor, desta vez como Coordenador do Gabinete Técnico Local criado no âmbito do Programa de Recuperação de Áreas Urbanas Degradadas . O PRAUD-GTL, de cariz instrumental, apoia os municípios mediante a comparticipação de 75% da remuneração dos técnicos que integram os GTLs, criados junto das autarquias, com vista à realização de acções de preparação e de acompanhamento de operações de reabilitação ou renovação de áreas urbanas, nomeadamente para a elaboração de estudos, projectos e planos.
            O GTL, composto por uma equipa multidisciplinar, elaborou entre 1998 e 2000 a Carta de Sensibilidade do Património no âmbito do Plano de Pormenor de Salvaguarda e Reabilitação do Centro Histórico, bem como levou a então Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, em 1999, a produzir o documento “Montemor-o-Novo – Inventário do Conjunto Urbano”.
            Algumas das propostas contidas no referido plano, deram origem a projectos de execução elaborados posteriormente, e que foram integrados no programa “Montemor, Pedra a Pedra”, como por exemplo, a remodelação das ruas “Condessa de Valenças”, e “Quebra Costas”, e ainda, a iluminação cénica de valorização do Castelo – Palácio dos Alcaides, torres e muralhas do nosso ex-libris.
Augusto Mesquita
Setembro/2018

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