EDUARDO LUCIANO
BALANÇO PARA O REGRESSO
Regressamos e como diz o escritor nunca regressamos ao mesmo
sítio. Ainda que pareça que nada mudou nas semanas em que estivemos longe deste
espaço de comunicação. Houve de tudo um pouco, desde virgens ofendidas com este
ou aquele suposto drama supostamente político à muito recente indignação com os
jeans que um governante envergava numa visita de estado a um país africano.
Tivemos
a omnipresença de um presidente em calções a distribuir afectos como se fossem
doses de protector solar, um incêndio tenebroso numa serra algarvia com todos
os aproveitamentos possíveis e imaginários dos dramas das pessoas que foram
atingidas como se cada fogo fosse uma oportunidade de queimar em lume brando o
adversário, ou melhor, o cúmplice, pela situação criada.
Foram
apenas algumas semanas e temos a sensação que o regresso encontra uma realidade
mais hostil e menos saudável como se tivéssemos dado mais uma voltinha numa
espiral que nos leva até um inferno conhecido.
Por
esse mundo fora começam a surgir episódios que seriam impensáveis há algum
tempo e avanços de forças que uns trataram com bonomia porque entendiam
inofensivas e outros alimentaram como instrumentos de combate para garantir a
sobrevivência do sistema.
Estes
últimos, de forma hipócrita, tecem agora loas preocupadas contra o que chamam
de “populismo” ameaçador da sua forma de vida, quando antes apoiaram e
financiaram o surgimento de movimentos que lhes foram de uma enorme utilidade
para garantia de privilégios perante a luta de explorados e espoliados dos
quatro cantos desta terra quase redonda.
Entre
nós vamo-nos convencendo que somos excepção, que não existe risco de deriva
fascista mascarada de justicialismo e que a nossa extrema-direita se fica pelo
“bem educadinho” CDS.
Basta
ouvir comentadores nos canais televisivos, ler comentários nas redes sociais,
ouvir as queixas indignadas contra o vizinho do lado que de boa vontade
exterminariam, para perceber que existe uma imensa massa de gente a ser
empurrada para a desesperança e que apenas espera por um qualquer homem ou
mulher providencial “que venha por isto na ordem” para se voltarem a imolar no
mesmo fogo que nos consumiu durante metade do século passado.
O
mundo unipolar do capitalismo parece caminhar para o regresso à barbárie num
tempo em que o desenvolvimento tecnológico, se usado em prol da humanidade,
prometia mais liberdade e uma distribuição mais justa do rendimento.
Como
em tudo na vida existe um outro lado. O lado dos que resistem, dos que não navegam
em ondas de visibilidade, não se vendem pela possibilidade de uma boa imprensa
ou se recusam a usar o léxico da moda para parecerem obedientes ao pastor de
serviço.
Haja
esperança e valorizemos os avanços conseguidos lutando para os reforçar e conquistar
novos territórios de progresso.
Nada
de desânimos só porque o Bolsonaro sobe nas intenções de voto no Brasil ou os
neo nazis suecos obtiveram um resultado eleitoral significativo.
Se
até o Tom Waits interpreta, no disco do guitarrista Marc Ribot, a velha canção
de resistência antifascista Bella Ciao, é porque há cada mais vez mais gente
disponível para estar do lado certo da vida.
Até
para a semana
Sem comentários:
Enviar um comentário