LER, VER VS
FALAR, OLHAR
Nunca
se leu tanto como agora. Tanto não quer dizer bem ou mal, quer dizer isso
mesmo: muita gente que para comunicar tem de codificar e descodificar uma
mensagem através do verbo ou palavra, neste caso a escrita que permite a
presença à distância no espaço ou no tempo. Quando há umas décadas, na
massificação do audiovisual pela televisão, as gerações mais velhas receavam o
cataclismo da palavra escrita, foram-se esquecendo de aprender, para ensinar, a
ler as imagens e outros sinais que, usando códigos, diferentes, requerem as
mesmas características do verbo inicial: informação, sentidos, procura de
reacções para fins diversos.
A mesma visão apocalíptica surge
agora com os ainda renitentes à utilização das redes sociais, o que os afasta
de conhecerem melhor o que é uma parte considerável da sociedade em que vivem
todos os dias. Respeitando essas posições, reconhecendo que isso não transforma
essas pessoas em indivíduos menos eruditos e interessantes, apenas o lamento
pelo que, de certa forma, estão a perder e pelo que com a sua intervenção,
erudita e interessante, poderemos estar a perder, nós “os digitalizados”.
Seriam mais a contribuir para a “humanização do digital”.
Decorreu na semana passada em
Copenhaga a Digital Media Europe 2017, uma conferência anual (ainda que não
tenha descoberto desde quando se realiza) que trata dos negócios que se fazem
através de plataformas digitais e onde o jornalismo teve um lugar de discussão
importante, nomeadamente pelas circunstâncias a enfrentar que condicionam todas
as plataformas que comunicam com as massas: a capacidade de vender e vender-se,
termos feios para alguns, ainda líricos, mas acertados no incontornável
capitalismo vigente em toda a parte, que não precisa de ser desenfreado se o
conhecermos, estivermos atentos e tomarmos bem conta dele. O que passará sempre
por um comportamento ético estabelecido, ou seja, pela educação.
Nessa conferência falou-se também
da uniformização da experiência dos utilizadores nas redes sociais e como se
tornou indiferente a marca por detrás do conteúdo. Assistimos a isso o tempo
todo. Anunciam-se livros, carros, viagens, roupas, líderes, sentimentos,
experiências, que partilhamos, não se percebendo a uma primeira incauta
impressão, em muitos casos, se são para contagiar os outros ou querer elevar-se
acima dos outros. Ficamos, vezes demais, sem perceber se alguns de nós, dos que
nos expomos, por diversos motivos, com várias intenções e em círculos mais ou
menos alargados, querem ser lidos e vistos ou se apenas que nos oiçamos falar enquanto
olhamos para nós, eles e elas. Essa é a marca que podemos assumir e imprimir
nos outros. E os outros devem, por isso, ler com atenção para perceberem se
estão apenas perante algo que distrai ou chama a atenção. Ambas válidas, a
distracção e a atenção, nos seus lugares próprios.
Vamos recomeçar a assistir, neste
Verão eleitoral, a um aumento da venda de líderes pelas redes sociais.
Assistiremos também a diversas paródias desses mesmos anúncios e a outras
coisas que querendo ser sérias parecem paródias. As melhores serão as que
fizerem com qualidade isso tudo. E aprenderemos certamente alguma coisa com
elas. E até haverá quem lhe baste aparecer para já ter ganho, mesmo que quem
assista a essa aparição não tenha, de facto, tido uma visão. O que como todos
fomos percebendo, neste Maio de 2017, de há 100 anos para cá pode confundir-se,
mas não é a mesma coisa.
Até para a semana.
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