A FRANÇA E O
DRAMA DE NÃO HAVER ESCOLHA
A
propósito da segunda volta das presidenciais francesas há quem se recuse a
discutir a questão da ausência de escolha. Tudo é simplificado de uma forma
atroz. Se de um lado está a fascista Le Pen então é preciso votar no outro
lado, seja ele qual for. Não vale sequer a pena colocar a questão de como se
chegou aqui, a este pântano onde a escolha é a mesma fatia do pão, com ou sem
manteiga.
Estes simplificadores sentem-se
confortáveis com a escolha do menos mau, porque ambos pertencem à mesma área
política, ambos estão do mesmo lado ideológico da fronteira e como tal com mais
ou menos tristeza lá vão votar para impedir a chegada ao poder do fascismo sem
máscara.
Para a massa imensa que não se
sente representada por nenhum dos candidatos a coisa assume contornos de uma
violência atroz. Imaginem as pessoas da esquerda consequente em Portugal a
terem de escolher entre o “centrista” Paulo Portas e um qualquer dirigente de
um qualquer grupo de neo nazis.
Não faço ideia o que faria se
fosse cidadão francês, nem é isso que está em causa. Sei que jamais faria fosse
o que fosse que facilitasse a chegada ao poder de Le Pen, mas seria capaz de
apelar ao voto em Macron ou ficar-me-ia pelo acto de votar?
Lembro-me do que foi o drama
pessoal para muitos democratas o facto de ter de escolher, nas eleições
presidenciais de 1986, entre o dirigente do único partido que votou contra a
constituição e aquele que muitos consideraram como o pai da contra revolução.
Tudo foi explicado e tornado a
explicar. Que a dinâmica revanchista da campanha de Freitas do Amaral iria
resultar num perigo maior para a democracia, que corríamos o risco de voltarmos
aos tempos em que assaltavam sedes do PCP e os atentados terroristas aconteciam
diariamente. O PCP convocou um congresso extraordinário para decidir o que
fazer perante a escolha que se perfilava. Ainda assim vi muita gente de
lágrimas nos olhos na hora de votar, gente que teve de tapar a fotografia do
candidato em que votava para suavizar a dor de uma escolha que não era a sua.
Compreendo por isso o drama de
muitos eleitores franceses nesta hora tão difícil em que a escolha não é entre
dois caminhos mas entre duas formas de continuar o mesmo caminho, não sendo
irrelevante o carácter abertamente xenófobo e racista da candidata da Frente
Nacional.
Não tenho dúvidas que é
necessário travar Le Pen e que isso passa por eleger Macron. O que me preocupa
é que a barricada vai recuando tanto, mas tanto, que um dia destes os franceses
estão a escolher entre a filha e a neta do velho fascista.
Quem diria aos franceses que
ainda chegaria o tempo de uma decisão ainda mais surreal do que aquela que
tiveram de tomar quando a opção era entre Chirac e Jean Marie Le Pen.
Como foi possível chegar aqui?
Como foi possível chegar ao ponto dos mais pobres se sentirem representados
pelos seus verdugos? Como é possível ouvirmos imigrantes a defenderem como suas
as ideias de um partido anti imigração?
Tem que haver um caminho
alternativo a esta espiral, num tempo em que um candidato social-democrata é
apelidado de extrema-esquerda pela comunicação social dominante.
Até para a semana
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