Transcrição da crónica diária transmitida aos microfones da :http://www.dianafm.com/
Que Vergonha!
Martim Borges de Freitas
Sexta, 22 Abril 2011 10:10
Não sei o que se passa com o meu país. Acho que chegámos ao limite dos limites.
Em 2005, depois de um governo PSD/CDS, de má memória, José Sócrates ganhou as eleições com maioria absoluta – a primeira do PS. Quis, então, fazer-nos crer que o país, seguindo a lógica de Durão Barroso, estava de tanga. Com o apoio explícito de Vitor Constâncio, então governador do Banco de Portugal, engendrou até o truque de anunciar o valor do défice das contas públicas que haveria de existir em 31 de Dezembro de 2005, quando estávamos ainda a meio desse ano. Como quem diz: “vejam como eles deixaram o país!”. É verdade que houve decisões tomadas pelo governo, cujo Primeiro-Ministro disse que o país estava de tanga, absolutamente incompreensíveis. Sou militante do CDS, cumpre-me reconhecê-lo. Mas é bom não nos esquecermos das primeiras palavras do governo de Sócrates. Ora, como quem com ferro mata, com ferro morre, bastará consultar o que o governo então disse para, se fosse esse o problema, termos um guião actualizadíssimo para a campanha eleitoral em que estamos mergulhados.
Acontece que, depois daquele número de Sócrates, tudo lhe foi correndo de feição, ao ponto de, já em pleno ano de 2008, as sondagens lhe garantirem uma renovação da maioria absoluta, com folga. Mas as decisões que estavam a ser tomadas, seguindo uma cartilha já antiga e que também envolve governos onde não estava o PS, pressupunham a existência de dinheiro, de muito dinheiro. Dinheiro que o país não tinha e dinheiro que o país não gerava. Até que chegou a crise financeira internacional, crise sobre a qual o governo não detinha qualquer controle. Como se pode hoje constatar, o que a crise internacional veio pôr a nu foi não apenas o estado do país, mas o errado modelo de desenvolvimento escolhido para o país. E, claro, a errada resposta do governo às crises. Poderá o governo ter respondido da forma como respondeu, porque tinha eleições em 2009 – e a democracia de opinião, como acontece sempre em democracia, prevaleceu; e poderá o governo ter respondido da forma como respondeu, porque a primeira resposta da União Europeia à crise internacional, também errada, foi a de induzir os governos a abrirem os cordões à bolsa. Mas, se até às eleições poderemos admitir, a custo, bem entendido, que qualquer outro governo teria feito o que este fez, já o que se passou após as eleições de 2009 é inaceitável. É inaceitável quanto à resposta dada pelo governo, mas é igualmente inaceitável relativamente a todos os agentes políticos que tinham capacidade de decisão objectiva, ou seja, os partidos do arco da governabilidade e também o Presidente da República.
Não é quando o mar está calmo que se vê a qualidade dos timoneiros. Digo-o com um misto de tristeza e de frieza. Conhecido o valor do défice das contas públicas de 2009, estava dado o alerta. Nada ter sido feito aquando da discussão do Orçamento de Estado para 2010, porque todos os partidos, a começar pelo partido do governo, entenderam colocar os seus interesses partidários próprios acima do interesse nacional, foi fatal: o PS, porque simulou querer uma coligação que não queria, o PSD, porque andou a medir se Passos Coelho poderia ser derrotado internamente ou não e o CDS, porque preferiu negociar com o governo a sua agenda focada ou, como então dizia, o seu caderno de encargos. Era nesta altura que se deveria ter definido a resposta adequada. Houve quem o tivesse preconizado e defendido publicamente. Preferiu-se empurrar o problema para a frente e aceitar-se a data das eleições presidenciais como próxima paragem e eventual apeadeiro. A partir daí, foi o descalabro, a que as eleições presidenciais não puseram cobro. Depois delas, tem sido o delírio: um Presidente da República que, já depois de o voltar a ser, tem escolhido não o ser; um governo que se caiu no alçapão foi porque escolheu construí-lo; e um PSD e um CDS que escolheram fazer cair o governo no alçapão, sem que, acto contínuo, tivessem garantido que não cairiam com ele.
Depois chegou o FMI. E o FEEF. A ordem é irrelevante. O que não é irrelevante é a vergonha, a vergonha por que todos estamos a passar e que, de dia para dia, se tem vindo a agravar.
Enfim, se ainda acredito que é possível regenerar os actuais partidos políticos e com eles a actividade política, a verdade é que o episódio relativo ao convite formulado a Fernando para encabeçar a lista do PSD pelo círculo de Lisboa, mostra bem o quão difícil será tornar a política na actividade (N)nobre que já foi!
Lisboa, 18 de Abril de 2011.
Martim Borges de Freitas
Sem comentários:
Enviar um comentário