quinta-feira, 6 de agosto de 2020

O SABER NA IDADE MÉDIA - SAIBA COMO OS NOSSOS ANTEPASSADOS APRENDERAM A CONTAR!

 A SABEDORIA MEDIEVAL NAS PONTAS DOS DEDOS

A queda do Império Romano deixou a Europa e boa parte do Próximo Oriente submersos no mais generalizado analfabetismo, porque a imensa maioria dos homens eram escravos.
Apenas as classes altas que dirigiam a sociedade e os exércitos haviam recebido instrução, por vezes aprimorada. Mas essas categorias cultas pereceram ou desapareceram nas invasões dos bárbaros.
Foi o trabalho santo, heroico e paciente da Igreja, notadamente as suas escolas monacais, episcopais ou paroquiais que foram tirando a Europa da noite da ignorância até transforma-la num farol de cultura universal.

O trabalho educador demorou séculos considerando as devastações das sucessivas invasões bárbaras e dos muçulmanos cheios de ódio destrutor.
Houve um período intermediário de séculos até os povos serem satisfatoriamente instruídos. Como faziam então, os primeiros medievais com suas contas sabendo pouco escrever ou ler?
O mais incrível é que o faziam com os dedos da mão, porém com uma habilidade e uma complexidade de nos fazer passar vergonha.
A habilidade era tão surpreendente que foi objeto de uma reportagem especial do jornal portenho “La Nación”.
Nós também contamos com os dedos, mas não vamos além dos 10 das duas mãos. Os medievais conheciam combinações por onde com esses 10 podiam facilmente calcular até 9.999.
Os mais habilidosos podiam fazer cálculos na casa do milhão pondo as mãos em diversas partes do corpo, algo
muito útil para os que mexiam com dinheiro.
Na verdade, o método não era exclusivamente medieval e já existia na Antiguidade. O escritor romano do século V Marciano Capela descreveu “a dama da Aritmética”, como uma “mulher de extraordinária beleza, e a majestade de uma nobilíssima antiguidade”, no seu livro “De Nuptiis”, no qual personificou as sete artes liberais.
E descreveu uma “dança” que a dama Aritmética executava com as mãos: a complexa e muito prezada arte de contar com os dedos. Tudo isso se teria perdido se não fossem os monges católicos.
O livro De temporum ratione ou “Como contar o tempo” de um monge do início do século VIII é o mais interessante.
O religioso vivia num dos cantos mais remotos do mundo conhecido, no mosteiro de Jarrow, no nordeste da Inglaterra.
Mas as suas obras iluminaram a civilização ocidental durante milénios, e a sua fama de estudioso de renome internacional remonta até hoje: foi São Beda, o Venerável, Doutor da Igreja.
O referido tratado marcou o compasso da Europa até à reforma gregoriana de 1582 ensinando a ciência do cálculo do tempo e a arte da construção do calendário.
“A base do calendário cristão é a Páscoa. Essa data tem que ser identificada meses ou anos antes para harmonizar o culto divino e desencadeou grandes debates do Atlântico a Alexandria”, explica o historiador da ciência.
“Devia cair no domingo após a primeira lua cheia ou equinócio, e tinha que ser marcada com antecedência, já que toda a liturgia católica depende dela.
“Era preciso combinar o ciclo solar e o ciclo lunar e os dias da semana.
“São Beda resolveu como fazê-lo usando os dedos das mãos! Assim chegava à data correta da Páscoa em questão de segundos.
“Não foi à toa que seu manual enciclopédico foi impresso e copiado por centenas de anos”, escreveu o professor Seb Falk.
São Beda mostra que as mãos, esses aparelhos portáteis por excelência, servem como computadores modernos e ensinou como contar até 9999.
“Assim como, quando escrevemos, temos uma coluna para as unidades, outra para as dezenas, centenas e milhares, ele dedicava o dedo mínimo, o anelar e os dedos médios da mão esquerda às unidades e o indicador e o polegar às dezenas; na mão direita, o polegar e o indicador indicavam as centenas e os outros três dedos, os milhares”.
“Diferentes combinações desses dedos em posições diferentes permitiram representar todos esses números”, escreve Falk.
São Beda forneceu dicas para aprender a contar: dizendo os números em voz alta enquanto mostra suas mãos e os alunos se acostumam a gestos às vezes difíceis de reproduzir, até memoriza-los.
Pode se usar as mãos para adicionar, subtrair, multiplicar como um ábaco.
“Era uma linguagem de sinais usada pelos feirantes para se comunicar de maneira eficaz em meio ao ruído e à distância”, explica Falk.
“Os monges utilizavam para se comunicarem em mosteiros onde o silêncio é regra, e para memorizar textos filosóficos e fórmulas matemáticas”. Nesse caso os números eram substituídos pelas letras – a letra “a” era representada pelo 1; a “b” pelo 2, etc.
E também servia de código secreto em caso de perigo.
Se alguém quiser alertar um amigo que está entre traidores mostra com os dedos 3, 1, 20, 19, 5 e 1, 7, 5; nessa ordem as letras significam caute age (haja com cautela).
Esse código manual também foi valioso para o estudo de algo muito precioso na vida monástica: a música.
“A música foi estudada de uma maneira muito científica; para monges era uma ciência matemática.
“Eles pensavam constantemente sobre a relação entre as diferentes harmonias, nas proporções aritméticas entre as diferentes notas da escala musical.
“Para esses filósofos tudo havia sido criado por Deus com algum motivo, e a ‘harmonia das esferas’ e da ‘música universal’ não era uma metáfora”.
Os monges haviam recuperado os escritos do grego Pitágoras, pai das matemáticas, que postulava que o Universo era governado de acordo com magnitudes numéricas harmoniosas e que o movimento dos corpos celestes seguia proporções musicais.
Assim os dedos serviam para os mais complicados cálculos astronómicos.
Mas também para erigir catedrais de altitudes vertiginosas e formas ousadas que perduram até hoje.
Se o sistema dos dedos distorcesse um pouco esses prédios teriam desabado há tempo.
“Os planetas tocavam um tipo de música criada pela velocidade em que giravam, que era como uma frequência: quanto maior a frequência, maior a nota. (Este conceito aliás foi assimilado por Aristóteles e comentado por Santo Tomás de Aquino)
“Para lembrar as diferentes notas musicais e configurações de harmonia, eles usavam as mãos”, prossegue o historiador da ciência.
Naquela época, a memória era uma ferramenta indispensável, porque os materiais de escrita eram muito caros, os livros eram escassos e muito prezados.
Talvez os mais preciosos sejam os do Venerável São Beda que nos transmitiu a dança digital científica que durante séculos serviu para a contagem da melodia cósmica e a construção da Cristandade.


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