quinta-feira, 2 de julho de 2020

CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE NA DIANA/FM


EDUARDO LUCIANO
                             Criminalizar a Vida
Antes de dizer ao que venho deixem-me esclarecer que não sou dos que acham que a situação não é grave, que a pandemia não é para levar a sério ou que devemos viver sem seguir as orientações das autoridades de saúde.
A crise sanitária é violenta, em particular para os socialmente mais frágeis e para os mais velhos e as medidas de protecção devem ser levadas a sério.
Dito isto, deixem-me agora dizer-vos que o limite da protecção não pode ir para além do razoável tendo em conta que os seres humanos têm de continuar a viver.
Há uma onda persecutória, alimentada pelas cadeias de desinformação, contra tudo e todos, em particular os que insistem em usar a rua para as suas actividades. Sejam jovens que procuram fazer o que é normal para a sua idade, sejam aqueles que continuam utilizar a rua para denunciar desigualdades, lutar por direitos ameaçados ou afirmar posições políticas.
Esta onda não afoga todos. Um grupo de jovens a beber cerveja à porta de um bar num bairro pobre é insultado pela generalidade da populaça, mas uma festa privada numa qualquer quinta de gente bem tem a condescendência de quase todos.
A palavra “criminosos” anda de boca em boca sempre que uma imagem mostra um qualquer ajuntamento, mas sai do linguajar quando o aglomerado é no supermercado ou nos transportes públicos.
É urgente contrariar esta voz comum que criminaliza comportamentos sem avaliar a sua perigosidade apenas porque parece que são riscos desnecessários.
São permitidos comportamentos de risco para sobreviver e criticados comportamentos com o mesma dose de risco se o objectivo é ir para além do limiar da sobrevivência.
Alguém nos quer confinados ameaçando-nos de morte, independentemente da forma responsável como nos comportamos.
A irracionalidade do medo começa a instalar-se de tal forma que até gente que tínhamos como inteligente decidem comportar-se como verdadeiros esbirros de uma nova inquisição.
No meio disto tudo há quem insista em continuar a fazer o quem de ser feito, a assumir os combates que têm de ser combatidos, a rir apesar dos dramas, a afirmar a sua humanidade apesar dos riscos. O risco zero não existe, ninguém é imortal e a maioria de nós quer viver o mais possível.
Há comportamentos irresponsáveis? Claro que sim. Sempre houve. Mas tornar criminoso o acto de viver não ajuda em nada o necessário combate a uma pandemia que provoca mortes desnecessárias.
Viver sempre foi e será um risco.
Há gente à espreita para aproveitar o medo da pandemia para cavalgar uma onda que sabemos onde irá desaguar.
Vamos lá viver, trabalhar, lutar, com todas as precauções mas com a determinação que faz com que a terra dos sonhos não seja a página de um livro, um filme ou uma música. A terra dos nossos sonhos tem de ser o nosso dia-a-dia. Viver não pode ser crime. Crime será sempre desperdiçar a vida.
Cuidem-se mas tentem não viver à espera da morte.
Até para a semana


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