EDUARDO LUCIANO
O velho anormal
O futebol luso regressou. Os milhões de epidemiologistas que
teorizavam nas redes sociais foram substituídos por milhões de treinadores de
futebol e especialistas em corrupção desportiva e encriptação de conteúdos de
correio electrónico.
As indignações contra quem está sentado na esplanada, as fotografias de
máscaras no chão, as imagens de praias cheias se fotografadas de determinado
ângulo, a inveja dos que não podem sobre os que podem, voltam a ser
substituídas pelo grunhir dos comentadores pagos para serem adeptos acéfalos
dos clubes desportivos em torno de interesses que estão longe serem os seus.
Que fique claro: eu
gosto do jogo e até acho graça a algum clubismo que acaba com os amigos
abraçados apesar de terem cachecóis de cores diferentes. O que não gosto é da
estupidez promovida em horas intermináveis de televisão, com gente escolhida
para defender o indefensável enquanto vai promovendo formas básicas de
pensamento de onde resultam apoiantes dos movimentos pró fascistas cá do burgo.
Espero que o regresso do futebol não engula também as ondas de indignação
pelos aproveitamentos da crise sanitária para a promoção de despedimentos e de
confinamento de direitos laborais, porque não se avizinha nada de bom com o
convite do primeiro-ministro a um suposto guru que terá como tarefa propor um
programa de lançamento da economia.
O senhor defende um pacto entre as empresas e o Estado com o Estado a sair
de cena logo que possível. Não há um pingo de novidade nesta ideia. O pacto que
defende consubstancia-se na velha prática do malvado Estado, que somos todos
nós, injectar dinheiro nas empresas directa ou indirectamente até voltarem aos
níveis de lucro habituais para depois sair de cena.
Nessa altura o Estado, todos nós, volta a ser o malvado que só quer
impostos para gastar em saúde, educação e outras coisas de onde deve sair
porque não tem nada de se meter em actividades que podem ser negócios
lucrativos nas mãos da iniciativa privada, com o pequeno incómodo de passarem
apenas a estar ao alcance de quem as pode pagar.
Na sua longa entrevista de ontem a um jornal diário, foi claro ao dizer ao
que vem e qual é a sua perspectiva estratégica. É o que é. Estranho, ou talvez
não, é um primeiro-ministro que se arroga adepto da social-democracia escolher
um colaborador com tais ideias, para desenhar um plano de relançamento da
economia.
Ou muito me engano ou teremos novas propostas de flexibilização das leis
laborais e mais precariedade e menos rendimento a distribuir pelo trabalho.
Aposto convosco que vão ser essas as conclusões do plano e aproveito para
apostar em como o Benfica vai ser campeão.
Até para a semana
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