segunda-feira, 20 de abril de 2020

DIA DA PROCISSÃO DA BOA NOVA – Helder Salgado


Caras amigas e amigos
Todos nós naturais do Concelho e muitos forasteiros, sentimos uma pesada mágoa, de não podermos, devido a este famigerado surto, assistir à Festa dos Prazeres, Festa da Boa Nova.
Os meus pais tinham duas portas abertas ao público, e, eu como o filho mais velho, nestes dias, apanhava cá uma estafa de se lhe tirar o chapéu.
Lá vai o tempo dos famosos bailes abrilhantados pela nossa orquestra Bass, alternando com a Monte Carlo, de Badajoz ou a Pax Júlia, de Beja. Mesmo quem não era dançarino, deleitava-se a ouvi-lhas tocar.
As procissões, já sem o brilho e respeito de outrora, ainda conseguem algum esplendor.
E, como tristezas não pagam dívidas convido-os a fazerem-me companhia nesta procissão, que não tem a ver com a procissão de António Lopes Ribeiro, declamada pelo João Villaret, e muito menos com a da Nossa Senhora da Boa Nova. A festa é outra.

Procissão além da fé.
Saindo lá de baixo
Ou cá de cima
Dispersa ou em cacho
Segue a sina
Descalça ou calçada
Dirigida, acompanhada
Vão anjinhos
Pessoas concentradas
Nos caminhos
Engravatados, enfiados
Nos fatinhos
Novos ou a ferro passadinhos
Mais parecem medir meças
Aos vizinhos
E assim vai saindo a procissão.
E nas borlas dos andores
Mãos carolas
Cheios de cor
Quais doutores
Ao lado das raparigas
Pintadas
Vermelhadas, prateadas
Mais parecem importadas
Com decotes malcriados
Estrangeirados
Com valores
E assim vão caminhando os andores.
Com pena, cheios de pena
Coitadinhos
De asas carregadas
Pequeninos
Pés doridos, apertados
Do calçado
Já maldizem o caminho
E assim vai
Obrigado pelo pai
O pobre anjinho
Sempre juntos aos andores
Carregados cheios de dores
Estropiados, bem fadados
Já cansados
Mas lá vão
E assim se vai compondo a procissão.
E a guarda?
Bem fardada
Douradinha e aprumada
Com olhos de observador
Nas paragens do andor
Ao cair o dinheirinho
Sem pressas no caminho
Não se perca o devedor
E assim se vai aliviando tanta dor.
Toca a banda sarabanda
Uma marcha
De tanto ouvida
Já gasta, que agasta
Quem a ouve
E quem vê
Os foguetes lá no ar
A iluminar
Ideias tacanhas
Cheias de manhã
Parafusos, obtusos
E confusos
Logo param de rezar
E para o céu a olhar
Agradecidos, extasiados
Alguns petrificados
Já se julgam no altar
E assim vai entrando a procissão.
Hélder Salgado


Amanhã, Segunda Feira devido à extensão do texto continuaremos com uma memória que será surpresa para muitos.
Estes textos foram, pela graça neles contido, escolhidos para a ajudar a passar este tempo com um pouco de alegria.
Obrigado por me ter lido.
Hélder Salgado.

Trena, 19-04-2020.

Sem comentários: