CLÁUDIA SOUSA PEREIRA
Uma crónica sobre tapetes 2
Ficámos todos de novo incomodados, alguns
ao ponto da repugnância, com quem o povo holandês elegeu para também o
representar na comunidade em que Portugal e mais 26 países se organizam. Estas
provocações rasteiras dos Países Baixos não são novas, remontam aos tempos em
que da Europa saíam conquistadores em movimento de expansão pelo resto do
Mundo. Questões de poder, ambições colectivas, vertidas depois em variadissimas
outras manifestações de exortação de nacionalismos. Revelam competição mais do
que solidariedade, individualismo mais do que empatia, oportunismo mais do que
humanismo. São obsessões identitárias muito, demasiado, vulgares. Estávamos era
à espera que agora, volvidos uns séculos, unidos numa mesma roda sob uma mesma
ameaça, não houvesse esse espírito e alguns se levantassem para puxar o tapete
aos outros.
Neste choque, aliás com origem previsível
na dedução pelo tal histórico dos comportamentos, há quem critique o nosso PM
por ter dito o que disse onde disse, porque devia tê-lo feito não em praça
pública, mas em trabalho discreto de bastidores; os mesmos que, às tantas,
querem que outros ministros andem aí a comprometer-se, aos microfones que lhe são
espetados à frente, com respostas rápidas. De preferência com promessas que
possam vir a ser cobradas com juros mais à frente. Respostas que, na realidade
do que é gerir, têm de ser muito trabalhadas antes de ser só “a” resposta a
quem espera e desespera. A ansiedade do costume, agravada com o medo e, a
esmagadora maioria das vezes, com a única preocupação em ver o seu problema,
muito seu, resolvido.
O choque por reacções institucionalmente
não solidárias entre membros de um mesmo colectivo também o tive quando, em
tempos de saída da troika, no tal nível local que parece, só parece, agora
menos importante, quando, na oposição, assisti a uma reacção “à la holandesa”
pelo actual presidente da Câmara de Évora, que trazia, e traz, na lapela o
comunismo. Na ânsia de resolver a situação financeira da sua máquina, a que
geria para servir o seu burgo, e que se encontrava em tão maus lençóis como
outras tantas autarquias do nosso país, perante a proposta da Associação
Nacional de Municípios para a criação de um Fundo de Apoio Municipal, do qual
Évora, depois de contribuir, poderia também beneficiar, respondeu com argumento
semelhante ao tal ministro holandês de agora: que não lhe parecia bem que os
municípios bem geridos tivessem que suportar os desvarios de outros. Vêem
diferença? Eu não.
Pois é, pelos vistos, há muita gente
pronta a alinhar com quem a solidariedade fica no saco do aspirador e, quando
se tem de arrumar a casa onde todos vivemos – seja ela Europa ou Portugal – a
primeira reacção é tirar o tapete para não ter de o limpar. É uma solidariedade
selectiva, a que se pratica se resolver o seu problema, muito seu, e sem
problemas em sacudir os outros borda-fora.
Votos de boa Páscoa, a tal que diz tanto a
muitos crentes que a celebram com oração própria. Aos outros, solidariamente,
também lhes envio votos idênticos, apesar de saber que este ano os festejos –
em modo praia, passeio e convívio – serão crucificados. Perdão, sacrificados.
Até para a semana.
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