EDUARDO LUCIANO
A previsibilidade
Era mais do que expectável que
começariam a chegar as mensagens directas ou subliminares com o objectivo de
cavar divisões entre os que vivem do trabalho.
É
sempre assim em momentos de crise. Atirar os que ganham 1000 contra os que
ganham 500 como forma de proteger os que sem trabalhar ganham milhões.
Os
“opinadores” do costume já começaram a lançar as habituais atoardas contra os
que têm emprego público, os que trabalhando no sector privado estão a ser
poupados ao desemprego ou à perda de rendimentos e desta vez até os
pensionistas são alvo da fúria supostamente igualitária destes justiceiros
cegos de um olho.
O
apelo do esforço distribuído por todos não passa de uma forma pouco inteligente
mas muito apelativa de desviar os olhares da fonte das desigualdades e dos que
acumularam riqueza mais do que suficiente para que todos tivessem uma vida
digna.
À
boleia deste esforço vem o ataque aos que sabem ler, mobilizando os que não
sabem, com a palavra intelectual a soar a insulto nas suas bocas, sabendo que
isso, com a simplificação da linguagem até ao nível do grunhido, lhes garante
simpatias dos que mais tarde ou mais cedo serão devorados quando as liberdades
forem suprimidas.
Tudo
isto está a acontecer de forma muito rápida e à boleia do mais implacável dos
medos: o medo de morrer.
Seria
previsível que assim acontecesse mas ainda me consigo espantar por tal onda
estar a arrastar pessoas que pela sua formação e por terem tido oportunidade de
ver mundo deveriam estar vacinadas contra este vírus.
Os
tempos que que vão seguir a esta pandemia vão de ser de luta, arrisco eu, de
vida ou de morte da liberdade. Já chegámos aquele ponto em que apoiantes da
ditadura fascista afirmam ameaçadoramente “quando isto virar…”. E esta é a
fronteira que não pode ser ultrapassada sob pena de termos fogueiras de livros
na praça pública e de homens e mulheres privados da liberdade.
É
agora que talvez alguns descubram que a cultura é um elemento fundamental na
construção da barricada da liberdade e que a possam valorizar como até aqui não
o fizeram.
Temos
hoje as pessoas que vivem da actividade cultural numa situação particularmente
difícil, no limiar da sobrevivência, quando parece ser a cultura que mantém o
sentido de humanidade de quem está retido em casa, através da música, dos
livros, dos filmes, das visitas virtuais a museus, do olhar sobre uma qualquer
reprodução de pintura a que já não se dava atenção desde o dia em que foi
pendurada.
Talvez
agora percebam o valor do dinheiro investido na cultura e talvez agora
compreendam como é errada a mensagem de menos cultura e mais alcatrão.
Como
disse lá atrás os tempos que se aproximam são de vida ou de morte não apenas da
ideia de liberdade, mas da liberdade como a desejamos.
Vemo-nos
por aí. Do mesmo lado da barricada, espero eu.
Até
para a semana
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