segunda-feira, 30 de março de 2020

MEMÓRIAS DA JUVENTUDE - Chico Manuel

                                           MAU OLHADO
O BARROTE era empregado de balcão na loja do COMICHOSO, por sinal a loja mais frequentada da Vila.
O BARROTE gostava de lhe empinar os seus copos, e volta e meia deixava-se enrolar ou pelo branco ou pelo tinto.
O BARROTE era pobre e a sua habitação, não tinha as melhores condições: casa de banho não havia, e, para ir para o seu quarto tinha que passar pelo dos pais.
Numa noite de copos na Taberna do ZECA
o amigo BARROTE chegou-lhe demais, e quando se foi deitar, pé ante pé, para não acordar os pais, que já dormiam a sono solto, fez o mínimo barulho, até para não saberem as horas tardias a que chegava a casa como também para não verem o estado em que vinha.
O pior é que depois de estar já em vale de lençóis, o vinho resolveu armar uma briga com o que tinha comido, e o local da briga não podia ser outro senão o estômago do desgraçado.
Voltas para aqui, voltas para ali, a cabeça também achou por bem interferir, e o tecto começou a andar à roda. - Bem, vou vomitar, pois se não ponho tudo cá fora, já sei que isto nunca mais acaba. Se vou ao quintal, tenho que passar pelo quarto dos meus pais e vai ser o bom e o bonito, se vai para o chão ainda pior. - Aí meu Deus?
Mas a salvação estava ali, mesmo debaixo da cama, o penico, pois com certeza… vai tudo para o penico, e amanhã faz-se o despejo no quintal e ninguém fica a saber.
O amigo BARROTE agarrou no cujo dito, enfeixou-lhe a cabeça em cima, tapou-se com o lençol e pronto. Só que a briga no estômago parou, e o nosso amigo ferrou a dormir.
De manhã, quando acordou e se foi pentear ao espelho, tinha um círculo desenhado na cara, redondinho, redondinho tal qual as bordas do penico.
Por vontade dele nesse dia não ia para balcão…mas os pais é que não foram na conversa, até para que te sirva de emenda.
Nesse dia a loja do COMICHOSO, esteve sempre cheia com pessoal que queria ver o BARROTE, mais a mais que a VELHA AMÉLIA, jurava a pés juntos que aquilo tinha sido obra do Diabo, ou então MAL OLHADO.

Xico Manel

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