terça-feira, 17 de março de 2020

A CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE NA RÁDIO DIANA/FM


                                                                                    CLÁUDIA SOUSA PEREIRA
                           É preciso é que todos fiquem bem…
Habituámo-nos a ouvir a quem já viveu muito (advérbio e quantificador algo incerto e de preferência o mais elástico possível, pronunciado com prolongado “u” na primeira sílaba) expressões de fé mesmo sem Deus lá dentro.
“É preciso é que todos fiquem bem” podia ser uma delas. Mas é, de certezinha, uma espécie de refrão pronunciado por uma personagem, o Capitão Andrade, de um conto de Mário de Carvalho de que terei de falar numa das aulas à distância a dar nestas semanas do resguardo, preventivo da quarentena ou, na pior das hipóteses, da baixa.
Estamos a viver o segundo momento verdadeiramente transformador da história da Humanidade deste século. O segundo em vinte anos. A coisa anda a ritmo de bytes, esperando que à velocidade se junte a capacidade de memória. Dos dois – 9/11 e COVID19 – ficará, de certezinha, o mesmo que ficaram de todos os outros, uma moeda cunhada nas duas faces por representações diferentes do mesmo tema: o medo. O vencido e o instalado, o ultrapassado pelos integrados e o instrumentalizado pelos apocalípticos (para usar a referência a uma obra de autor que revisito e cito constantemente, Umberto Eco).
O medo do desconhecido e o medo do Outro, também eles duas versões do mesmo adversário, que unem e separam, que nos fazem avançar e recuar no caminho do progresso. Caminho sem fim à vista nem limites de velocidade.
Só quando tudo estiver resolvido, poderemos procurar culpados e heróis. Para já remetemo-nos à nossa condição de personagens de enredo que parece saído de um exercício de escrita criativa e colectiva, cujos autores escolhidos estão à prova e só no fim se saberá se temos arte ou outra coisa. Mas sempre com o risco, que ouvimos tantas vezes aos bons escritores, de as personagens deixarem de obedecer ao seu criador e ganharem vida própria. E no fim só “é preciso é que todos fiquem bem”. Vamos ficando nós por aqui, a trocar umas impressões sobre o assunto. Cuidem-se, porque se isto corre mal a alguns pode e vai correr mal a muitos.
Até para a semana!


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