CLÁUDIA SOUSA PEREIRA
Entre rasteiras e
rasteiros não muda só uma letra
Dias confusos virão aí para quem alguma vez achou que, quando se
chegava a lugares de poder, era porque se tinha um determinado nível. Claro que
não estou a pensar naquela atitude típica de quem se esvai em sangue azul, ou
azulado, ou seja mesmo só um snob. O snob é o grau obtido “sabe-se lá porquê”,
tradução muito livre e cómica que ouvi sobre o título atribuído “honoris
causa”. E que bem aplicado é a certos casos! Os snobs são, para mim, os últimos
e mais fundamentalistas marxistas, os que julgam que a explicação da máquina do
Mundo está nas classes. Mas adiante.
Toda a gente que
já teve alguma actividade na Política, mais do que só o importante e político
gesto imprescindível de votar para participar, não terá dúvidas de que, nesse
mundo, para além da inteligência é necessária muita resistência. Nos dias que
correm, estou em crer que para alguns dos que estão atentos ao que se passa na
Política, e que é só com quem consigo ter uma conversa em que sinta que estamos
mesmo a trocar impressões e opiniões, a resistência será a de não cair na lama
em que novos líderes partidários, mesmo de velhos partidos, se vão movendo.
As boas
estratégias e tácticas político-partidárias sempre viveram da pequena e
cirúrgica rasteira que se pregava a adversários ou inimigos. Nem que fosse não
fazer nada, com pose e elevação, e deixá-los espetarem-se sozinhos depois de
tropeçarem nos próprios pés. Mas isso parece chão que já deu uvas. O que está a
dar é mesmo chegar ao nível baixo de cultura política dos cidadãos e deixá-los
lá. Deixá-los, não. Convencê-los a ficarem lá, contentes com o seu
descontentamento, através de argumentos rasteiros, em discursos rápidos e
fluidíssimos, que soam tão clarividentes como “a lógica da batata” e que os
fazem sentirem-se ali bem, enquanto eles caminham em ombros no seu percurso de
grandes líderes. Mas rasteirinhos, rasteirinhos.
Por outro lado, aos que
detêm o poder no contra-poder também já ouvi discursos a pedirem já só uma
palavrinha … de afecto, talvez. O que me parece uma forma de contestação assim
a dar para o chamado romance cor-de-rosa e, lá está, com um discurso também
muito rasteirinho. Como nunca, parece-me cada vez mais útil, para além das
entrelinhas, começar-se por ler mesmo as linhas com que nos vão cosendo os
destinos do País.
Até para a
semana.
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