quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

A CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE NA DIANA/FM


                                                                      EDUARDO LUCIANO
                               Sem tema
Esta não é uma crónica sobre a eutanásia, porque é irrelevante a minha opinião sobre o assunto e porque já abordei o tema numa crónica anterior.
Mas a propósito do tema gostava de abordar a questão das “consultas populares” pedidas sempre por adeptos do não a uma qualquer iniciativa legislativa.
Foi assim com a regionalização, foi assim com a interrupção voluntária da gravidez e volta a ser assim com a questão da eutanásia.
Essa rapaziada muito respeitadora da voz do povo em questões que normalmente não se resolvem com um sim ou não, só se lembram desse instrumento quando a sua opinião não coincide com a opinião da maioria parlamentar do momento, ou seja, a representatividade só é válida se coincidir com a sua muito particular opinião sobre o assunto.
A propósito da exigência de um referendo vêm argumentos de que existe medo de ouvir o povo, por parte dos que andam pelas redes sociais a elogiar um tempo em que não havia eleições livres nem direito legal de organização política.
Muita gente bem-intencionada e honesta embarca neste comboio que de alguma forma lhes permite não ter opinião tendo apenas uma fuga: o povo que decida, não percebendo o serviço que presta ao avanço dos fascismos de diversa índole.
Apesar de não parecer o mesmo assunto, o facto de um jogador de um clube de futebol ter abandonado o campo de jogo como protesto a insultos racistas vindos da bancada enquadra-se na mesma escalada.
De repente, estações de televisão que dão tempo de antena a representantes de ideologias proibidas constitucionalmente, aparecem como se fossem anti-racistas e dirigentes de clubes que alimentam claques onde se acoitam organizações criminosas aparecem a repudiar o racismo e jornais que trazem para a primeira página notícias de crimes onde a identificação dos alegados criminosos começa pela cor da pele, origem étnica ou bairro de residência, lamentam o sucedido.
Toda esta gente passa o tempo a acender a fogueira para agora gritar que há fogo e a exigir uma resposta eficaz.
O caldo é o mesmo e o perigo é real quando vemos gente que repudia a democracia usar as suas ferramentas para acabar com ela. Quando exige que o “povo se pronuncie” sobre aquilo que apenas diz respeito a cada um pretendendo impor uma moral única. A sua.
Como disse no início esta não é uma crónica sobre a eutanásia, coisa demasiado séria para se opinar em quatro minutos porque muito mais do que isso levaria a demonstrar a diferença entre os diversos sentidos de eutanásia, suicídio assistido e morte assistida e um dos caminhos que levam à supremacia dos que querem “ouvir o povo” e dos que acham que os insultos racistas são normais é a simplificação da linguagem, o empobrecimento discursivo, a ignorância sobre conceitos, a transformação de um qualquer debate em algo tão contrastante como o sim e o não.
Não sei se tenho alguma certeza na vida, mas julgo poder afirmar que se não os pararmos agora vamos voltar aos tempos em que a liberdade era uma linha no horizonte e parecia inalcançável.
Até para a semana


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