CLÁUDIA SOUSA PEREIRA
Aquilo que é
impactante é aquilo que é o top
Ora
bem: esta é a expressão que parece vir a substituir o pobre autoritário, e por
isso ridículo em tantas ocasiões, “É assim” na expressão de argumentos em
conversas mais ou menos formais. Começar a crónica que intitulo “Aquilo que é
impactante é aquilo que é o top” pode parecer que quero fugir ao tema político
do orçamento, ao cíclico terror sempre anunciado de um dos sempiternos
geo-conflitos mundiais, ao horror dos incêndios na Austrália sem SIRESP para
culpar mas com alterações climáticas a que se continuam a fazer orelhas moucas
nos lugares cimeiros dos destinos políticos do Planeta. Pode parecer que quero
fugir a isto tudo e mais algumas coisas, mas não. É apenas pegar nestes e
noutros assuntos por um outro lado. E é voltar aos media como instrumento,
instituição e fim em si mesmos na sociedade contemporânea.
Oiço muito a
Comunicação Social para me manter a par das notícias e conhecer opiniões e
contraditório sobre as mesmas, optando por ignorar a maioria das vezes as imagens.
Percebo que os meios audiovisuais sofram muito mais agora com a necessidade de
usar o que se chama no jargão “encher chouriços”. O truque de manter o
microfone com som quando a imagem não mexe para evitar que o público “saia da
sala” leva a conversas pouco interessantes, por vezes a roçar o “lá-lá-lá” das
cantigas com falta letra e sem que esse refrão reduzido seja portador de
sentido e, como tal, não redundante.
Verifico é que a
redundante e irritante expressão “aquilo que é”, nas suas variações de pessoa,
género e número, tomou de assalto o discurso captado pelos microfones. E
proferido por gente com níveis de habilitações e, alguns com posições
relevantes, que me levam a pensar que quem a usa julga tratar-se de um factor
distintivo no requinte do uso da língua. Não é. Pode não significar ignorância
ou pobreza de vocabulário, claro, como o repetir de certos adjetivos, mas sim
um tique de pouco à-vontade ou nervosismo, o que para alguns pode ser
compreensível e será para muitos, corrigível. Já o que tem correcção mais
difícil é quem pense que é mais do que os outros por enrolar com as palavras
quem quer ouvi-lo ou ouvi-la. Isso acontece também com o uso para tudo e mais
alguma coisa dos tais adjectivos, normalmente na moda e a parecer modernos ou
eruditos como, respectivamente, “top” e “impactante”.
O que é que isto tem
a ver com o OE2020, o conflito no Irão ou as alterações climáticas? Alguma
coisa tem, certamente. O facto, pelo menos, de ser através dos mass media e da
Comunicação Social que tomamos conhecimento e formamos opinião sobre o que vai
pelo Mundo. E que se não usarmos algum tempo a pensar até sobre a forma como
isso que vai pelo Mundo chega até nós, exercitando o nosso espírito crítico,
talvez acabemos a usar sem nos darmos conta a opinião de outros que acham que
têm mais jeito para a dar. Acham e parece que têm, quando ouvimos estas virais
formas de expressão na boca de toda a gente, desculpem-me a generalização
provavelmente injusta. Às vezes, os sintomas de casos graves chegam com
estranhos e aparentemente insignificantes sinais.
Até para a semana.
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