1992: A ENTREVISTA ESQUECIDA DO “CAPITÃO” JAIR BOLSONARO
Em 1992,
Bolsonaro chegara até onde era possível, “democraticamente”. Um quarto de
século volvido, que democracia será possível, com ele? Cheguei até onde se pode chegar democraticamente”. Há, nesta frase
de Jair Bolsonaro, todo um programa. Não só pelo que afirma, mas também por
aquilo que esconde, insinua ou deixa adivinhar. Qualquer leitor mais distraído
garantiria que a declaração do atual presidente do Brasil poderia ter sido
proferida ontem. Mas, na verdade, tem quase 26 anos.
Bolsonaro foi entrevistado a 9 de maio de 1992 para o semanário Expresso pela
sua correspondente no Rio de Janeiro, Iza de Salles Freaza. Nessa rara conversa com um jornal português,
percebe-se o óbvio: a democracia já era um obstáculo para o então capitão na
reserva. O mais recente chefe de Estado brasileiro estava então longe de saber
que a democracia – ou a degradação dela e das suas instituições - ainda haveria
de lhe revelar um universo de possibilidades, do qual só sabemos, por agora, o
começo.
Nesses anos que se
seguiram ao final da ditadura militar (1985), ele ficara famoso por liderar a
contestação dos quartéis, dentro dos quais crescia a indignação e a revolta por
causa das perdas salariais em tempo de infantil democracia. Com discursos
inflamados, Bolsonaro, eleito deputado federal, mobilizara a chamada Marcha
pela Dignidade da Família Militar, deixando pistas para o que podia acontecer:
“A paciência dos militares está a atingir os seus limites. E quando chega a um
determinado ponto eles não costumam fazer manifestações. Com a barriga vazia
ninguém raciocina bem. A fome é a pior conselheira”.
No congresso,
temia-se um golpe à peruana ou à venezuelana, atirando o país para tempos ainda
frescos na memória coletiva do Brasil. “Um militar não faz greve, faz
levantamento”, avisara José Genoino, ex-guerrilheiro do Partido Comunista
Brasileiro (PCB), que, curiosamente, seria condenado por corrupção no âmbito
dos escândalos que minaram o PT nos últimos anos. Esses receios, que
contagiaram o presidente Collor de Melo, acabariam por garantir um aumento de
80 por cento aos militares, em nome do sossego do país e da tranquilidade nas
casernas. “Estamos só no começo”, advertira Bolsonaro ao Expresso,
deixando então cair: “Eu não conspiro, mas se houver uma revolta, toda a gente
sabe onde estarei”, ameaçara, em nome do povo e contra o país de “oportunistas
e corruptos”, porquanto “a voz do povo é voz de Deus”.
Em 1992, Bolsonaro
chegara até onde era possível, “democraticamente”.
Um quarto de
século volvido, que democracia será possível, com ele?
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