CLÁUDIA SOUSA PEREIRA
Natal feat. Família
Como esta é a crónica das “Boas Festas!” pareceu-me
que não ia mal falar também da política que tem dedo directo nas questões da
família. Pensemos, então, para falar a propósito das discussões na AR sobre a
guarda dos filhos partilhada com residência alternada como primeira solução dos
pais divorciados e do quase já chumbo a uma proposta que dizia querer tornar
inequívoca a vitimização da criança que assiste a situações de violência
doméstica. O ponto que realço é o facto das posições parlamentares no que
respeita à família, essa velha e importantíssima instituição da sociedade, não
quererem parecer ser uma questão ideológica. Mas são. Os mais conservadores
tendem a evitar falar no assunto, como se falar fosse provocar ou incentivar e,
como tal preferem mandar esconder o lixo debaixo do tapete e ir enfiar a cabeça
na areia. Os progressistas radicais digladiam-se entre si para encontrar a
purpurina que mais abrilhante, o que não deixo de encarar até nas linhas do meu
próprio curso de vida, um falhanço. Mesmo que dessa queda, nos levantemos e
continuemos, pés na terra e sonhos nos lugares onde estes vivem, a puxar-nos
para a frente.
A propósito do
estatuto de vítima da criança que é espectadora inevitável do que se passa na
sua vida familiar, houve quem quisesse vir pôr-lhe uma marca na testa, quando
instituições públicas e particulares complementares se articulam para resolver
situações concretas. Lembro que a APAV, por exemplo, na sua página web
esclarece exactamente estas questões e podemos perceber que o trabalho,
discreto como deve ser, é feito. O pior mesmo é lutar contra preconceitos que
estigmatizam as vítimas. Pergunto-me o que de novo traria, às práticas já
decretadas, esta proposta em vias de chumbo para melhorar a vida destas
pequenas grandes vítimas?
Já a situação do
privilégio da guarda partilhada com residência alternada é, na minha opinião
progressista mas não radical, a consequência melhor numa situação não ideal,
mas à partida algum dia idealizada. Um divórcio é sempre uma situação de
falhanço de uma família que pensaria ficar unida durante o infinito e mais além,
e em que a partilha de tarefas e responsabilidades se desejou uma realidade.
Não sendo possível quando juntos, quando havia brilho e violinos, pode até
melhorar, quando do divórcio ou separação, na relação entre cada um dos
progenitores e a criança. A proposta não torna quem não é boa pessoa em melhor
pessoa, com tudo o que de impreciso, imprevidente e piroso qb a expressão
proferida em tom imperativo e irrefutável “boa pessoa” seja. Mas evita que,
quem seja Pai ou Mãe, e cumpra as responsabilidades a que essa função ou papel
que escolheu, não tenha exactamente os mesmos direitos. Para se avaliar esse
desempenho será necessário muito mais do que análises à ocitocina, progesterona
ou testosterona. Até me pergunto que detalhes sórdidos, e desconhecidos porque
não presenciados sequer pelos miúdos, terão os episódios contados por Pai ou
Mãe em litígio pela guarda dos filhos… Episódios certamente a acrescentar aos
da história que também desconhecem, porque pré-natal, e onde, à partida, se
contava (ou cantava) que “era amor para a vida toda”.
Um divórcio ou uma
separação que altera nas rotinas as relações que, no conjunto mínimo de três
pessoas – como no presépio (onde para alguns burro e vaca não são só
figurantes!) – não precisa de implicar sentimentos entre laços que,
naturalmente, são mesmo “para a vida”. Se, e só se, isso acontecer, o que será
evidente e perceptível até pelos círculos mais chegados, o presépio poderá
dispensar que os lugares previstos das suas figuras sejam mesmo eliminados e
não deixados para poderem ser ocupados à vez. E que essa vez não seja só pelas
festas. Votos de bom Natal, boas entradas e até para o ano!
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