Na
década de 30, estavam no auge os corredores José Maria Nicolau (Benfica),
vencedor em 1931 e 1934, e Alfredo Trindade (Sporting), vencedor em 1932 e
1933.
Mas,
reza a história, que nesse ano de 1935 o ferreirense Luís António Passanha
Pereira, homem de grande fortuna, era dirigente do Sporting Clube de Portugal.
Por desentendimento com outros membros da direcção e como desagravo, resolve
transferir a equipa de futebol sportinguista para a sua terra natal com o
intuito desta competir a nível nacional. Só não conta com os regulamentos das
estruturas federativas do futebol português, que não lhe permite efectivar essa
mudança de imediato.
Na
impossibilidade da tarefa, resolveu-se então pela equipa de ciclismo, fazendo
com que quase toda a estrutura do Sporting, transitasse para Ferreira do
Alentejo, assim como César Luís a nova coqueluche benfiquista.
Era,
portanto, enorme a expectativa quanto ao comportamento deste ciclista no início
da VI Volta a Portugal em Bicicleta, cuja primeira etapa terminava na Pista do Estádio 1.º de Maio.
Depois
desta introdução, vou recorrer ao texto que o meu saudoso conterrâneo Viriato
Camilo escreveu na “Folha do Sul” sobre a primeira visita da Volta a Portugal
em Bicicleta a Montemor-o-Novo.
À medida que os dias foram
decorrendo, e se aproximava o dia 25 de Agosto, foi aumentando o interesse e o
entusiasmo pelo começo da grande prova ciclista, a VI Volta a Portugal em
Bicicleta, cuja primeira etapa, Lisboa (Cova da Piedade) – Montemor-o-Novo,
terminou na pista do Estádio 1.º de Maio.
Por
toda a parte da vila, e este ano mais do que em qualquer outro, talvez por
Montemor registar pela primeira vez a passagem da caravana, não se ouvia senão
falar nos nomes dos mais populares e categorizados “ases” do ciclismo
português. Nicolau, Trindade César Luís, Marquês, etc, etc., são figuras tão populares de tanto
relevo no desporto, que já não há ninguém que não discuta os seus nomes e as suas
proezas de grandes estradistas.
Assim,
em agrupamentos de entusiastas, onde acaloradamente se discute a “Volta”, é
fácil ouvir-se: “Quem vence este ano é o Nicolau!” “Quem ganha é o Trindade!”
“Quem triunfa é o Marquês!...” E é um nunca acabar, porque cada qual, na ânsia
de levar o seu favorito, considera-o, como possível vencedor.
E
nós então, prosseguindo, rimo-nos dos ferrenhos partidários e do seu louco
entusiasmo, que chega a ser comunicativo, e perguntamos a nós próprios: “mas
quem diabo será o vencedor, da VI Volta?” E sem dar-mos quase por tal,
recordando o nome deste ou daquele corredor mais afamado, como possível e
provável triunfador, sentimo-nos admirador do César, do Trindade, do Nicolau...
e até da “Volta”... que nos vai dando volta ao “miolo”!...
No
Estádio 1.º de Maio, onde os ciclistas da Volta terminam a 1.ª etapa, estão-se
fazendo as necessárias reparações da pista.
As
obras de alargamento de uma das entradas para melhor e mais fácil ingresso dos
corredores no estádio, também devem ser iniciadas em breve.
Até
que chegou o grande dia... Muito
calor, fazendo subir a temperatura, já elevada, entre a multidão que, desde a
entrada da Rua de Lisboa, se ia acotovelando nos passeios, impaciente e
nervosa. Os mais avisados, chegando cedo, arremataram os postos estratégicos
que permitiam melhor e mais ampla visão da corrida. Qualquer indício móvel,
susceptível de se confundir com ciclistas, fazia com que o público, ao mais
pequeno movimento, deixasse o passeio...
Até
que algo aconteceu. Primeiro os carros de apoio e da direcção da prova. Depois
quem seria? O festejado César Luís? Depressa as dúvidas se dissiparam logo que
aquele homem, pedalando num ritmo regular e galgando as últimas centenas de
metros que o separavam da meta, surgisse mais de perto. O barulho da multidão
aumentava com a excitação, tanto mais que o sinal possível de identificar, a
cor da camisola, não ajudava porque a visionada era branca.
Por
fim, hei-lo: o “desconhecido” José Marquês, a reboque de uma fuga a partir de
Vendas Novas, resolveu atacar, deixando para trás três deles(Cabrita Mealha,
Ezequiel Lino e João Rainha) e só um, César Luís lhe foi na peugada. Mas
Marquês ganhara grande balanço: fazendo a extraordinária média de 35,200
Km/hora nos 136.200 Km medidos entre a capital e Montemor, deixara todo o mundo
estupefacto ao vê-lo passar sem o reconhecer. Até que chegado ao Estádio 1.º de
Maio, entrou pelo portão da direita, ao lado das cabinas, rolou os dentes
cerrados, em grande estilo, pela pista que circundava o campo de futebol e
cortou a meta com naturalidade.
Passados
alguns minutos, dá-se então uma explosão sonora pela Rua Nova acima: César Luís
surgira ao fundo, executando a curva e contornando o lago. Prepara a subida da
Rua Nova, erguendo-se do selim e balanceia em cada pedalada, levando a
bicicleta ora para um lado, ora para o outro. Duas câmaras de ar cruzam-lhe o
corpo, que vem suado, tal como a máscara do rosto, amassado de pó cinzento.
Cada metro percorrido é um esforço heroico ajudado pelos incitamentos do
público. Este, por pouco não o agarrava e o depositava lá em cima, naquele
morro que não acaba. Terminado, enfim, o sacrifício, César Luís, após o
espectáculo alucinante protagonizado no cenário da Rua Nova, encaminha-se para
o estádio no cumprimento do ritual da chegada.
O
ciclista José Marquês, foi o vencedor da I etapa da VI Volta a Portugal em
Bicicleta, que teve o seu final na desaparecida pista de ciclismo do Estádio
1.º de Maio, envergando por isso a camisola amarela.
Numa
parada de estrelas onde pontuavam, por exemplo, o benfiquista José Maria
Nicolau e o rival Alfredo Trindade, os Leões de Ferreira do Alentejo,
impuseram-se aos demais, consagrando na vitória da Volta a Portugal desse ano
de 1935 outro grande nome do ciclismo português - César Luís.
César Luís interrompe os
duelos entre Nicolau e Trindade, e vence a 6ª Volta a Portugal, em
Bicicleta, triunfando em 2 etapas e andando 9 dias de amarelo, deixando José
Marquês do Campo de Ourique em segundo lugar a 17 m e 02 s de distancia.
No
dia 16 de Agosto de 1972, Montemor-o-Novo foi palco da final da 19.ª etapa da
35.ª Volta a Portugal em Bicicleta, Tavira – Montemor-o-Novo, com organização
do Grupo União Sport, a qual foi ganha pelo ciclista do Sangalhos, Manuel Lote.
À
noite, no Estádio 1.º de Maio, procedeu-se à entrega de 68 prémios aos
ciclistas. O artista e locutor Miguel Simões, afirmou: Montemor-o-Novo
conquistou a “Camisola Amarela” na generosidade manifestada, pelo número e
valor dos prémios oferecidos aos “voltistas” e pela carinhosa e bem organizada
hospitalidade com que os recebeu. Depois deste acto, no Salão da Sociedade
Círculo Montemorense “Pedrista” foi oferecido aos jornalistas e aos cargos oficiais
da volta, um abundante beberete a que assistiram as entidades oficiais da Vila.
Também
o jornalista de “A Bola”, Santos Neves, atribuiu a Montemor-o-Novo a “Camisola
Amarela” e elogiou a forma como os jornalistas foram apoiados no desempenho do
seu árduo trabalho. Não nos podemos esquecer que em 1972 não existiam
telemóveis, e os telefones existentes na então Vila de Montemor-o-Novo, eram em
número muito reduzido. Foram colocados ao dispor dos jornalistas, a velhinha
sede do GUS, que se situava no número 5 da Rua Capitão Pires da Cruz, e o
telefone, as instalações das Sociedades Carlista e Pedrista e respectivos
telefones, assim como os telefones dos comerciantes, Senhores Jaime Nogueira e
Américo Mira.
Desenvolveu
um trabalho notável no apoio aos homens da comunicação escrita e falada, o
elemento da Comissão Organizadora, o meu saudoso amigo António Gabriel Calhau
Teixeira.
Augusto Mesquita
Agosto/2019
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