CHICO
BUARQUE, O PERSEGUIDO. E A AGITADA VIAGEM A LISBOA
Um poema esconde quase sempre uma história que é muitas das
vezes desconhecida do grande público. É o caso da famosa «Tanto Mar», da
autoria do Chico Buarque, que faz parte da «Ópera do Malandro», e que o autor
dedicou à revolução de Abril. Antes de embarcar para Portugal,
para festejar e conviver com os heróis da revolução e participar num programa
de televisão com Teresa Silva Carvalho, Carlos Paredes, entre outros, deixou ao
critério da censura Brasileira, que continuava a viver em ditadura, o musical e
peça de teatro em questão.
Por esta crónica de Miguel
Carvalho ficamos a saber que: Chico Buarque era grande admirador de Amália, que
se tornou um admirador de Zeca Afonso com quem conviveu amiúde “assim como José Mário Branco, Sérgio Godinho
e mais uns quantos que estavam então a despertar muito interesse no Brasil. O
problema é que esse era um amor distante, quase platónico, impossível de ser
correspondido. “Não se vendem esses discos lá, simplesmente não existem no
Brasil”, lamentava Chico, aguardando por dias melhores. Era,
pois, preciso, continuar a navegar, mesmo
que houvesse léguas e dois regimes a separar-nos.
”Depois de saciada a sua sede de
liberdade em Portugal, Chico Buarque seguiu para Cuba, e depois regressou a
casa. “As más notícias não tardaram. Detido à chegada ao Brasil e levado à
sede da polícia federal, o compositor e cantor teve de explicar-se a propósito
das suas andanças por Lisboa, Havana e outras capitais de países com os quais o
Brasil fardado não tinha relações diplomáticas. “A coisa está preta”, admitiu
Chico Buarque à saída do interrogatório, citado pela Imprensa. “Eles querem
saber tudo. Ir a Cuba não é crime, que eu saiba, e se o motivo da minha prisão
for esse e o facto de me ter encontrado com exilados por lá, posso dizer que
esbarrei num número muito maior de brasileiros em Lisboa”, afirmou, sem se
intimidar. Nessa
ocasião, a polícia política do Brasil apreendeu 78 discos e 92 livros a Chico
Buarque, comprados em Lisboa, Roma, Paris e Havana.” E Sobre a famosa «Tanto Mar»,
esclarece-nos a crónica: “inventar uma desculpa, dizendo que o tema havia sido feito para
Moçambique. Na realidade, explicara ele, não era mentira, pois a antiga colónia
fazia parte de um todo em transformação. “As relações diplomáticas com Portugal
estavam meio abaladas e havia um maior interesse em estabelecer relações com a
África ex-portuguesa. Por isso, achei que poderia ser uma boa tática para
passar na censura. Mas cheguei tarde e a música foi censurada mesmo. Então
gravei e mandei a música para cá - a gravação brasileira é só o fundo musical,
sem a letra, enquanto o disco português é completo”, explicou Chico Buarque, em
1978, ao Expresso.” “Agora,
apesar de Bolsonaro, das festas que murcharam e de retrocessos vários, o que
pode um Prémio Camões para resgatar, de novo, esse tanto mar que, afinal, nos
une, em nome das palavras libertadas?”
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