EDUARDO LUCIANO
Tentar enterrar o SNS, ou a
hipocrisia feita comunicação
Vamos de férias das crónicas, mas a central de informação que tem
vindo paulatinamente a minar a confiança no Serviço Nacional de Saúde com uma
verdadeira barragem de notícias, pequenas, pequeníssimas e grandes, não parece
disposta a abrandar o seu trabalho.
Gente que sempre
se opôs à existência do SNS anda agora preocupadíssima com as suas falhas e
deficiências, explorando até à exaustão qualquer problema que surja no mais
recôndito centro de saúde.
Gente que defende
que os privados dão melhor resposta desde, claro está, que os encharquemos de
dinheiro público que poderia ser utilizado para investir seriamente no SNS, vem
agora chorar lágrimas de crocodilo pela ausência de pessoal, pela vetustez e
sobrelotação de instalações.
Gente que quando
esteve no governo cortou em tudo e mais alguma coisa, clama agora contra a
falta de investimento e o depauperar das condições em que o serviço é prestado.
Gente que mandou
encerrar centros de saúde, atreve-se agora a lamentar que a ti Maria tenha de
fazer 60 km para ir ao médico e sem a garantia de ser atendida.
Gente que defende
a existência de um seguro de saúde obrigatório, deduzo que com diversos
patamares de assistência conforme as capacidades do segurado, agita-se com o
mau funcionamento desta ou daquela unidade de saúde, esquecendo que já existe
um “seguro obrigatório” sob a forma de desconto para a segurança social e outro
sob a forma de impostos sobre o rendimento.
O Serviço
Nacional de Saúde, construção possível pela Constituição de Abril e a que se
opuseram desde sempre os herdeiros do tempo da outra senhora, vive dificuldades
e constrangimentos que só podem ser honestamente analisados à luz do que foram
as políticas de saúde dos governos do famoso arco.
Subfinanciamento,
envelhecimento da sua estrutura profissional, ausência de investimento em todas
as áreas, das infra-estruturas à contratação de pessoal, promiscuidade entre
serviço público e iniciativa privada com claro prejuízo para o serviço público,
foram as pedras do caminho que levam hoje a tal gente a afirmar que a
universalidade e gratuitidade não é sustentável.
Os trabalhadores
do SNS, dos médicos aos assistentes operacionais, que enfrentaram com as suas
lutas as arremetidas dos diversos governos continuam nos dias de hoje a
assinalar problemas e a propor soluções, sem deixarem de, no seu dia-a-dia,
reinventarem respostas para os utentes que deles dependem para o acesso a
cuidados de saúde, sem que tenham de exibir qualquer apólice de seguro
contratada a quem faz da doença uma questão de oportunidade de mercado.
Ou me engano
muito ou vamos ter até Outubro um cerrado ataque ao SNS e o que mais me custa é
que as dificuldades e insuficiências são reais e muitas delas criadas pelos que
agora pretendem tirar partido das suas consequências.
Vamos então
interromper estas crónicas até Outubro com o desejo e a convicção de que os
eleitores percebam que os ganhos (ainda que modestos) desta legislatura só
podem ser aprofundados com o reforço do tal partido quase centenário, que na
noite eleitoral de 2015 afirmou que era possível afastar a direita do poder.
A minha prima
Zulmira, mulher de sequeiro, não vos deseja bons banhos mas deseja-vos um
óptimo Artes à Rua, porque vêm aí dias e noites fantásticas.
Até Outubro
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