EDUARDO LUCIANO
Um festival de marionetas
Quase um mês depois da última
crónica tenho uma colecção de temas sobre os quais me poderia debruçar. De
Berardo à abstenção, do PAN à moda supostamente ecologista, da atracção pelos
partidos aparentemente neutros do ponto de vista ideológico ao inchar de alguns
sapos e rãs, dos julgamentos sumários no telelixo aos especialistas em mortes
anunciadas, dos que fazem política buscando nas redes sociais o que está a dar
aos que são tão desonestos que acham impossível existir gente diferente.
Olhando
para todos estas possibilidades não consigo deixar de fazer a ligação entre
tudo isto a arte dos marionetistas que por estes dias invadem as ruas da minha
cidade.
Berardo,
com as suas declarações na Assembleia da República, deu-nos a ilusão de ser um
manipulador de marionetas do bloco central de interesses e foi apedrejado por
todo o bicho careta que exigiu a devolução de medalhas, mas se olharmos com
muita atenção percebemos que é uma peça menor de um sistema que se condecora a
si próprio através de figuras mais ou menos boçais mais ou menos alarves mas
sempre dispensáveis quando o que está em causa é a sobrevivência do
capitalismo.
Os
que se decidem pela abstenção invocando que o voto de nada serve porque são
todos venais e corruptos, sem se darem ao trabalho de ouvir (ler seria bem mais
complexo) o que uns e outros têm para dizer ficam com a ilusão de que cortam os
fios que os ligam ao marionetista sem perceberem que apenas cumprem o desígnio
que este lhes atribuiu no momento presente.
Os
“novos ecologistas” que são manipulados para saírem em defesa do planeta, sem
perceberem que sem porem em causa o sistema de produção assente no lucro
estarão apenas a fazer cócegas à fúria predadora e destruidora do capitalismo,
também se recusam a ver os fios grosseiros que determinam a sua acção.
Neste
jogo, o telelixo manipula quem se prende em frente ao televisor para saber quem
matou quem, ou quem quer casar com o agricultor, ou a desgraça mais próxima,
ficando a marionete a pensar pela cabeça do manipular primário que por sua vez
pensa pela cabeça do manipulador que é dono do teatro, que por sua vez pensa
pela cabeça do dono da rede de teatros, que por sua vez pensa pela cabeça
anónima de quem quer garantir a subsistência do sistema.
Talvez
no fim da linha estejam os moralistas cheios de auto comiseração que vêem
desonestidade em todo lado e que são tão desonestos, mas tão desonestos que nem
conseguem imaginar outra forma de estar atribuindo aos outros intenções que só
eles seriam capazes de praticar. Apesar de conhecerem Freud não lhe reconhecem
a autoria da frase que por vezes um charuto é só mesmo um charuto.
De
que estive eu a falar? De marionetas. A propósito de quê? Do regresso da Bienal
Internacional de Marionetas de Évora que se iniciou com um desfile fantástico
onde marcaram presença muitos cidadãos, marionetas, marionetistas e cabeçudos
de diversas matizes.
Até
para a semana
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