segunda-feira, 6 de maio de 2019

A CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE NA DIANA/FM


                                                                                 MARIA HELENA FIGUEIREDO
                                      Um quase número de circo
Assistimos a semana passada a uma encenação política eficaz, quase um número de circo.
Imagine-se um trapézio, sem rede, e os trapezistas a ensaiar o voo mortal. Os trapezistas ora se encontram ora se desencontram, preparando o momento em que um deles se laça em voo e outro o agarra. Às vezes corre mal e é a morte do artista.
Esta semana foi mais ou menos isso que aconteceu com o projecto de lei para a recuperação integral do tempo de serviço dos professores.
De um lado, António Costa no seu trapézio, do outro o CDS e PSD, prontos a lançar-se em voo, esperando recolher a ovação e os votos dos professores. Esqueceram-se foi de ver se haveria rede ou se o parceiro não tinha as mãos escorregadias.
O processo de recuperação integral do tempo de serviço dos professores não é novo e Bloco de Esquerda e PCP sempre tiveram posições coerentes em sua defesa.
Já em Dezembro de 2017 a Assembleia da República tinha aprovado com os votos do Bloco de Esquerda, PCP, Verdes e o PS uma recomendação para que o Governo negociasse com os sindicatos a contagem de todo o tempo de serviço para progressão na carreira e valorização remuneratória. Os Orçamentos de Estado para 2018 e 2019, aprovados pelo Partido Socialista, Bloco de Esquerda, PCP e PEV consagraram igualmente esse princípio.
Foi isso que aconteceu aos trabalhadores das carreiras gerais que viram o tempo de serviço que tinha sido congelado pelo Governo do CDS e do PSD contar para progressões futuras.
Os trabalhadores das carreiras especiais não tiveram igual tratamento. E relativamente aos professores dos 9 anos, 4 meses e 2 dias em que o tempo de serviço esteve congelado, o Governo recusou-se a considerar na negociação cerca de 6 anos de trabalho e reconheceu apenas 2 anos, 9 meses e 18 dias, o que, sublinhe-se, para além de injusto, não respeita as Leis do Orçamento.
Ora, a Assembleia da República chamou a si o diploma do Governo e na semana passada, PSD e CDS, resolveram fazer o pino e de grandes defensores da austeridade passaram a defensores da recuperação de rendimentos.
E assim em Comissão, não ainda em Plenário, foi aprovada, por todos os partidos, excepto o Partido Socialista, a recuperação integral do tempo de serviço dos professores, ainda que de forma faseada e sem impacto imediato no orçamento.
Os impactos futuros esses deverão ser negociados, numa solução idêntica à que o Partido Socialista dos Açores já aprovou para os professores da região.
Só que o Governo que tinha começado a dramatização com o Ministro Centeno a apontar impactos orçamentais exagerados recuperação do tempo de serviço, com um afã como não lhe vimos quando o Novo Banco pediu mais 450 milhões de euros, acabou com António Costa a ameaçar demissão do Governo se Assembleia da República aprovar a recuperação integral do tempo de serviço.
Uma demissão que a 4 ou 5 meses de eleições legislativas não terá impacto efectivo na governação e que por isso mesmo não se justificaria e a generalidade das pessoas não percebe.
Mas em contrapartida, mesmo sendo só uma ameaça, tem um efeito eleitoral assinalável, para um PS que quer ter uma maioria absoluta.
A 3 semanas das eleições europeias e quando as sondagens a serem-lhe cada vez mais desfavoráveis, Costa cria uma crise governativa e responsabiliza o PSD e o CDS, recentrando e capitalizando a seu favor o descontentamento de parte do eleitorado destes partidos quanto à posição tomada. De quebra aponta também “irresponsabilidade” no aumento da despesa pública.
Apanhados em contramão, Cristas já veio dizer que quer nova votação em Comissão e Rui Rio que quer estabelecer condições que tornam impossível a recuperação efectiva do tempo congelado aos professores.
E se é certo que qualquer que seja a posição que venham agora a tomar, CDS e PSD mostraram já que apoiaram as reivindicações dos professores apenas para retirar dividendos políticos, fazem-nos lembrar que os trapezistas imprevidentes acabam por ter quedas fatais.
Até para a semana!



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