EDUARDO LUCIANO
UNIVERSOS DIFERENTES EM PERFEITA HARMONIA
No passado sábado o Teatro Garcia de Resende recebeu um
espectáculo de homenagem a Paco de Lucia, integrado no festival “Flamenco
Heritage” que contou com apresentações em cidades como Lisboa e Madrid.
Neste
espectáculo emocionante cruzaram-se duas formas de expressão musical classificadas
como património da humanidade, o fado e o flamenco, com interpretes
excepcionais como Hélder Moutinho e Pedro Castro que se cruzaram com Gerardo
Nuñez e os seus parceiros que elevaram o flamenco a um nível de erudição e
paixão que nos prenderam às cadeiras durante todo o espectáculo.
Poderão
pensar que tal fusão foi proporcionada por cedências de parta a parte
descaracterizando o fado e flamenco para que pudessem conviver.
Estão
errados nesse pensamento. Foi uma fusão sem concessões, sem abdicar da genuidade
de cada uma das expressões, num convívio perfeito de universos que, sendo
diferentes, partilham de um património comum: a paixão com que garantem a
proximidade dos intérpretes, numa demonstração de honestidade identitária rara
nos tempos que correm.
O
tributo à genialidade de Paco de Lucia manifestou-se na excelência dos
executantes e no respeito mútuo pelas diferenças que enriquecem os que se
aproximam de forma livre e sem preconceitos.
Aquele
espectáculo do último sábado é uma verdadeira metáfora sobre a forma como é
possível fazer conviver as diferenças quando a inteligência, a paixão pela vida
e a capacidade de entrega nos leva à compreensão de outros universos que, sendo
humanos, não nos podem ser estranhos.
Aquele
espectáculo foi a demonstração prática de que a única impossibilidade surge
quando nos cristalizamos nas nossas crenças e abdicamos de convicções em favor
da confortável rigidez de dogmas construídos à medida das nossas necessidades
supostamente identitárias.
São
essas posturas cheias de certezas absolutas que levam à derrota de ideais e a
construção de um mundo cheio de tonalidades cinzentas e algumas dores. A minha
prima Zulmira, que é mulher pouco dada a grandes construções teóricas, já está
para ali a sorrir e a pensar “pois sim, filho, deves estar a falar da dor de
cotovelo e da dor de corno”.
Bem,
deixemos de elucubrações intelectuais e vamos ao que interessa: não se esqueçam
de participar na manifestação do próximo sábado e de exigir o necessário
aumento do salário mínimo para seiscentos euros, já a partir de Janeiro.
Até
para a semana
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