MARIA HELENA FIGUEIREDO
CATALUNHA: TEMPO DE INCERTEZA
A
questão da Catalunha já não é apenas uma questão interna de Espanha.
É uma questão da
Europa, é uma questão da democracia e do respeito pelos direitos individuais
dos cidadãos.
É ainda uma
questão do reconhecimento do direito dos povos à autodeterminação, um direito
que a Constituição Portuguesa consagra no seu artº 7º.
Aqui chegados, 42
anos após a morte de Franco e do fim da ditadura, quando se esperava que a
democracia estivesse consolidada, a Espanha volta a ter presos políticos,
levando a concluir que, afinal, o franquismo não se extinguiu e tem ainda hoje
sucessores em Rajoy e no Partido Popular.
A aspiração da
Catalunha à independência é antiga, de séculos. Franco esmagou de forma brutal
qualquer tentativa de organização dos catalães, proibindo até que falassem a
sua língua. Mas nem mesmo assim conseguiu fazer desaparecer o sentimento de
nação.
É precisamente
desse sentido persistente de nação que resulta a legitimidade para os catalães,
como qualquer outra povo, poderem de forma democrática decidir se querem
continuar a integrar o Estado espanhol ou, antes, se querem ser eles próprios
um Estado.
O estatuto de
autonomia aprovado pelas Cortes em 2006 poderá ter apaziguado,
transitoriamente, o sentimento independentista, mas não o apagou. E por isso,
se vai reacendendo regularmente.
Também há muito
que os catalães vêm reclamando o direito a fazer um referendo sobre o caminho
que, enquanto nação que são, pretendem seguir e a pôr em causa o quadro
constitucional espanhol.
Na consulta
popular de 2014, não vinculativa, em que se pronunciou pouco mais de 1/3 dos
eleitores catalães, cerca de 80% deram uma resposta positiva à independência.
Mas ao contrário
do que, por exemplo aconteceu no Reino Unido relativamente à Escócia, o Governo
espanhol não teve a capacidade de interpretar o sentimento dos catalães e a
Espanha continua a negar-lhes o direito de democraticamente se pronunciarem em
referendo.
E é quando, de
forma pacífica, o Parlamento catalão, eleito democraticamente, delibera a
realização de um referendo que, Rajoy, num claro exercício de poder
autoritário, inicia uma escalada de violência, deslocando milhares de polícias
para a Catalunha. Numa acção de brutal repressão contra os cidadãos na rua,
como há muito não se via na Europa, as forças policiais carregaram sobre os
votantes tendo-se registado mais de 800 feridos no dia 1 de Outubro, dia do
referendo.
Incapaz de abrir
caminho a uma solução política para uma questão que é iminentemente política,
Rajoy acciona os mecanismos da Constituição de suspensão da autonomia e
dissolução do parlamento regional.
Oito
ex-conselheiros catalães, incluindo o vice-presidente da Generalitat foram
presos, 6 parlamentares catalães, um deles o presidente do Parlamento, estão
sob vigilância policial, um mandato de captura europeu foi lançado para
detenção do ex-presidente do Governo regional dissolvido e de quatro seus
ex-conselheiros, que se apresentaram já às autoridades belgas.
Um tribunal belga
decidirá se extradita ou não para Espanha Puigdemont e os restantes catalães
que o acompanham. Veremos o que acontece nos próximos dias.
Muitos dirão que
foi violada a Constituição espanhola, mas estes são processos em que a
legitimidade prevalece sobre a legalidade e é legitimo os catalães quererem
determinar-se.
O futuro da
Catalunha e dos catalães é cada vez mais incerto. Como será incerto o futuro da
Espanha se a cegueira do autoritarismo de Rajoy e a incapacidade de construir
soluções persistirem.
Até para a semana
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