quarta-feira, 5 de abril de 2017

PÁGINA CULTURAL



  Baseado em Textos do Dr. Alexandre Laboreiro.


                         Aprender a Ser
 «Todo o homem está destinado a ser um sucesso e o universo fez-se para sustentar este sucesso».
 R. Buckminster Fuller
(Arquitecto, escritor e inventor norte-americano)

Tem constituído, ao longo da História do ser humano, uma constante  -  ligada, é certo, à Inteligência superior que ilumina o Pensamento, a Acção, o Sentimento, a Inspiração nas relações do Homem com o Meio e com o Tempo  -  a preocupação de imprimir ao curso da sua vida, uma evolução no sentido do Progresso (abrindo caminho ao desenvolvimento da Técnica, da Ciência, da Arte, das Letras): preocupações, contudo, instiladas por um cuidado de construir um Saber que faça do Homem, alguém sensibilizado por um constante desejo de aprender a ser (enquanto intenção de permanente enriquecimento como Pessoa).
E, não há dúvida, o processo, por excelência (através dos tempos) na formação do Homem, tem sido a Educação.
Ora, in “A Educação Que Ainda é Possível”, diz-nos o Professor Espanhol José Gimeno Sacristán que a educação que conhecemos pode manter-se como agora funciona, burocratizando-se progressivamente, defendendo-se e regressando a posturas do passado, reduzindo o seu papel de motor cultural e de agente de integração. Pode encobrir as suas contradições e a sua incapacidade de universalizar o direito de todos a educar-se por igual servindo e segregando segmentos da população, “descentralizando” o sistema educativo à medida de cada classe e grupo social e cultural. Pelo contrário, pode reconstruir-se a partir das suas próprias e melhores tradições. Sabemos que as instituições escolares não estão sós na tarefa de educar e ensinar, pelo que se costuma pedir às famílias, meios de comunicação, etc., que colaborem com as escolas e com os professores. Sem negar a importância deste pedido, deveríamos extrair todas as consequências desse facto, hoje mais visível. Se as instituições escolares não estão sozinhas, não queiramos que funcionem como se o estivessem, e que tudo o mais se cole ao estabelecido por ela, restituindo-lhe a sua centralidade na educação. Devemos, pelo contrário, fazê-las funcionar doutro modo. As instituições que servem a escolarização, não se propõem “agarrar” o monopólio da informação e, igualmente, não se intitulam o único meio de transmiti-la, satisfazendo interesses ou gerando-os. Porém, a escola constitui  -  em certa medida  -  “uma varanda sobre o mundo”: podendo contudo ser aproveitada a variedade cultural dos seus alunos e encarregados de educação  -  quer no enriquecimento da actividade em sala de aula, quer como participantes preponderantes em palestras sobre temas educativos, ou na preparação de exposições culturais em redor da temática da educação, ou mesmo como colaboradores ou organizadores do Jornal de Escola (enquanto órgão de relevância pedagógica na abordagem da importância da Escola  -  nas suas múltiplas facetas de análise)  -  pretendendo, não fazer do jornal escolar um exemplo de jornalismo de excelência, mas sim um elo de ligação Escola-Família, ou mesmo Escola-Região.                                              
Por sua vez, a obra de divulgação didáctica “Educação  -  um Tesouro a descobrir” (editada pela UNESCO) diz-nos em determinada altura: «Para dar à educação o lugar central que lhe cabe na dinâmica social, convém, em primeiro lugar, salvaguardar a sua função de cadinho, combatendo todas as formas de exclusão. Há que conduzir, ou reconduzir, para o sistema educativo, todos os que dele andam afastados, ou que o abandonaram, porque o ensino prestado não se adapta ao seu caso. Isto supõe a colaboração dos pais na definição do percurso escolar dos filhos e a ajuda às famílias mais pobres para que não considerem a escolarização dos seus filhos como um caso impossível de suportar».
Numa antologia de Ensaios (“Aprender a Ser”), escritos pelo ensaísta francês Edgar Faure, diz-nos ele  -  a determinado passo  -  o seguinte: «Toda a educação, a começar pela educação familiar, tem uma função de socialização a cumprir para com a criança  e o adolescente. A escola continua e continuará a entregar-se a um papel de formação cívica, nomeadamente nos países que recentemente conquistaram ou recuperaram a sua identidade nacional, e de formação ideológica nos países onde uma revolução julga ser seu dever conquistar os espíritos e lutar, em todas as frentes, contra os bastiões do passado. O essencial não é saber qual o lugar que este género de instrução ocupa no ensino, mas para que fins tende, implicitamente pelo menos: favorecer o aparecimento de indivíduos tendo a sua maneira própria de conceber judiciosamente as suas relações com o mundo, ou condicionar os indivíduos submetidos a modelos impostos e fácil de governar? Estimular a formação de espíritos apaixonados pela liberdade e dotados de senso crítico, ou consagrar as hierarquias? O facto é que, em muitas circunstâncias, é preciso para a criança e para o adolescente forças fora do comum ou capacidades excepcionais de evasão, ou ainda uma sólida impermeabilidade, para guardar intactos a curiosidade e o sentido inventivo, que são faculdades primordiais do espírito humano».
É que  -  como inicia o livrinho “Para onde vai a Educação?”  -  escrito pelo psicólogo Jean Piaget  -  somos defrontados com a seguinte constatação: «O desenvolvimento do ser humano está subordinado a dois grupos de factores: os factores da hereditariedade e adaptação biológica, dos quais depende a evolução do sistema nervoso e dos mecanismos psíquicos elementares, e os factores de transmissão ou de intervenção sociais, que intervêm desde o berço e desempenham um papel de progressiva importância, durante todo o crescimento, na constituição dos comportamentos e da vida mental. Falar de um direito à educação é, pois, em primeiro lugar, reconhecer o papel indispensável dos factores sociais na própria função do indivíduo».
Abrindo um breve parêntesis no léxico que vimos apresentando, não resisto a registar um pequeno comentário que Fernando Rosas nos oferece sobre o lugar da Cultura na sociedade portuguesa, no âmbito do Estado Novo. Diz-nos ele in “Salazar e o Poder”: «A Cultura que, a este respeito o Estado Novo, subliminarmente, sempre inculcará entre a população, é a de que ela, para sua própria segurança, se devia afastar da política  -  “a minha política é o trabalho”  -  e deixar as decisões sobre a governação do país a quem estava pela ordem natural das coisas, hierarquicamente destinado a esses altos desígnios»: visando, como se depreende, fazer concluir como a política salazarista pretendia afastar o povo da Cultura, e dos aspectos culturais: perseguindo os intelectuais (escritores, poetas, pintores, escultores, professores, arquitectos, jornalistas)  -  que determinantemente não seguiam as linhas culturais do Estado Novo. Daí, serem grandes os números de intelectuais presos, perseguidos, demitidos dos empregos  -  vendo as suas obras literárias proibidas. Prevalecia a vontade sua, do que era a verdade  -  pela repressão.
Bartolomeu Valente, in “Educar para o Provir”, ajuda-nos a explicar aqueles momentos de Fé, num tempo e espaço redentores  -  que iluminam o espírito de crença em “porvires” de cultura, justiça, liberdade.
Diz-nos ele: «O alcance transformador de uma potente liberdade interior servida por uma consciência muito lúcida gera rumos de tal modo inesperados e prenhes de potencialidades que provocam o espanto. Em geral, conseguem, suscitar processos libertadores de enorme vastidão no espaço e no tempo. Mas aqui também não são as novas condições criadas que são libertadoras; antes a exemplaridade do génio que as promove, o fascínio dele  que solicita os demais sujeitos a assumirem-se e desdobrarem o processo encetado indefinidamente. E só porque estes aderem, e tomam deles próprios o ideal proposto e desmultiplicam consequentemente as transformações em curso, é que isto é libertador».
José Alexandre Laboreiro
In Folha de Montemor . Outubro 2016
Transcrição autorizada pelo Autor
         





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