Quinta, 31 Março 2016
Perante os actos terroristas que
vitimaram dezenas de pessoas na Bélgica, no Iraque e no Paquistão, muito se
escreveu e disse nas últimas semanas.
Escreveu e disse de forma desigual, como se o preço de uma vida fosse
diferente em função das diversas proximidades com quem escreve. Como se a morte
de um iraquiano, de um paquistanês ou de um sírio fosse mais suportável do que
a de um europeu, ou um ataque terrorista fora desta nossa caixa fosse algo cuja
normalidade nos resignássemos a aceitar.
As intervenções na comunicação social
andaram entre a miserável exploração do sentimento de medo e a as explicações e
justificações mais básicas para o sucedido, colocando o acento tónico no
presente e na condenação, sem explicação, da mortandade absurda de gente cujo
único “crime” foi estar à hora errada no sítio errado.
Sempre que alguém lembrava as origens e
os financiadores, ou recordava a hipocrisia dos que choram hoje os mortos
quando ontem criaram, armaram e financiaram os grupos que aparentemente
deixaram de conseguir controlar, logo surgiam vozes que, de forma manipuladora,
entendiam aquelas análises como justificativas destes actos de terror.
O facto de nada justificar os cobardes
ataques terroristas em qualquer parte do mundo, não pode significar que se
deixe de destapar o véu sobre as suas origens, os seus chorosos cúmplices e
mesmo aqueles que ingenuamente acreditaram em fantasias, como a existência de
armas de destruição em massa no Iraque, na bondade da destruição da Líbia, ou
em heróis da resistência na Síria.
Preocupam-se agora os nossos
“especialistas” em terrorismo em encontrar formas de cooperação policial, em
descobrir e sugerir novas formas de controlo de fronteiras ou, os mais
atrevidos e xenófobos, em transformar qualquer homem ou mulher, de aspecto
vagamente árabe, em potencial suspeito, mas se lhes sugerirmos que o caminho passa
pelo fim do financiamento directo ou indirecto das redes que tanto jeito dão
aos exportadores de “democracia”, para zonas onde as matérias-primas são mais
apetecíveis à voragem do capital, logo assobiam para o lado e fingem não
entender.
Apostam tudo no reforço da segurança, no
aumento de constrangimentos à circulação de pessoas e bens, parecendo não
entender que o hipotecar da liberdade é o primeiro objectivo do terror.
Além disso, por mais segurança que seja
instalada, haverá sempre forma de a furar e tornar inútil, como ficou
demonstrado pelo desvio de um avião para Chipre, por um homem desarmado que
afinal apenas pretendia juntar-se à ex-mulher.
É preciso ir ao fundo da questão. É
preciso revisitar o financiamento da guerra civil no Afeganistão, revisitar a
fotografia daqueles quatro mentirosos nas Lages, a invasão do Iraque e da
Líbia, o treino e financiamento da “resistência síria” e outras tantas
aleivosias em nome de algo que já nem nos lembramos.
Derrotar o terrorismo não passa por
lamentar mortos ou pôr bandeirinhas nas redes sociais. Isso apenas serve para
aplacar a nossa indignação.
Para derrotar o
terrorismo é preciso pôr fim à hipocrisia que chora os mortos enquanto vende as
armas que os executam.
Até para a semana
Eduardo Luciano
1 comentário:
5 estrelas para este texto: simples, claro, objectivo e a propósito.
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