domingo, 27 de dezembro de 2015

DUAS CRÓNICAS ATRASADAS MAS MUITO ACTUAIS TRANSMITIDAS NA RÁDIO DIANA/FM

                                                      
                                                           Contos de Natal

Quinta, 24 Dezembro 2015
Nos contos de Natal está frio lá fora e quente dentro das casas e os pobrezinhos são muito felizes em torno da ausência de bens materiais.
Nos contos de Natal não há diferenças de classe porque cada um é feliz à sua maneira e quem conta os contos de Natal valora sempre a bondade e o desejo de partilha de forma diferente, para que os pobres sejam muito mais felizes que os ricos, nesse singelo dia.
Não há conto de Natal onde os ricos sejam heróis, excepto naqueles em que o rico, num rasgo de profunda bondade, acende a lareira da casa do pobre de estimação ou dá o presente sonhado pela criança andrajosa com que se cruzou nesse dia de paz e harmonia.
Os contos de Natal são o único lugar onde os pobres continuam a ser pobres e não passam a “carenciados”. Fazia lá sentido um conto em que se valorizasse a virtude da “carência” em vez da virtude da pobreza.
Sim, porque nos contos de Natal a pobreza é a virtude suprema que permite aspirar a um estado de felicidade que só os despojados podem perceber e que só por absoluta falta de jeito não percebem nos restantes dias do ano.
A minha prima Zulmira acha que os contos de Natal são encomendados pelos ricos para que haja um dia do ano em que os pobres tenham pena dos seus corações empedernidos.
Deve ser por isso que os tempos vão mudando, as formas de viver se alteram, os brinquedos sofisticam-se e os hábitos alimentares se alteram, mas o guião do conto de Natal é sempre o mesmo e o infeliz Ebenezer Scrooge tem sempre o mesmo pesadelo nessa noite, para compensar os sonhos das outras noites.
Neste Natal o conto manteve a mesma estrutura narrativa, mas talvez tenha ido um pouco mais longe. Acho que é a primeira vez que a malta que costuma ser feliz na noite de Natal se junta para fazer com que o infeliz Ebenezer possa sentir o calor da solidariedade, da fraternidade, da compaixão, do desapego aos bens materiais, contribuindo modestamente com mais de três mil milhões de euros para o seu santo Natal.
Ficaremos todos mais pobres afirmam uns mal dizentes furiosos com a solidariedade forçada, sem perceberem que se trata de um contributo para sermos mais felizes nos próximos natais, que passaremos cheios de compreensão para com a tristeza e infelicidade daqueles que têm de viver com os bolsos cheios dos recursos que foram desviados da saúde, da educação, da cultura, da protecção social e de outras coisas que só servem para que não percebamos as virtudes do Natal dos pobres.
“O gajo está azedo”, dirão alguns que ainda estão a ouvir ou a ler estes disparates. Nada disso, acreditem. Estou só um bocadinho farto do Conto de Natal. Ou melhor, das consequências do Conto de Natal.
Tenham uma óptima noite, mas não se esqueçam que o Scrooge não mudou de essência e no dia 26 já lhe passou o efeito do espírito de Natal.

Até para a semana

Eduardo Luciano

                                                                            BANIF

Sexta, 25 Dezembro 2015
Estava preparado para abordar as eleições espanholas nesta crónica quando estoura a notícia da semana. E o tema que abordarei não poderá ser outro que não o do BANIF.
Ultrapassámos o razoável. É o 4º banco que cai. Depois do BPN, do BPP e do BES, surge agora o BANIF.
Absolutamente inadmissível. Absolutamente incompreensível.
Como é que um banco, um pequeno banco, com cerca de 4% da quota de mercado, pode causar prejuízos de tal dimensão, perdas que serão sempre superiores a 3000 milhões de euros, seja pela liquidação do banco, seja pela sua resolução.
Onde tem andado a supervisão? Longe certamente. Aliás já nos vamos acostumando a que seja este o princípio.
Como é possível que os bancos tenham assumido um volume tal de compromissos que se vieram a considerar incobráveis (a que chamamos lixo tóxico) e onde está a responsabilidade dos conselhos de administração.
As contas têm que ser prestadas. Começa a ser um hábito a culpa morrer solteira e em que não vale a pena divulgar muito.
É assumir os custos e ponto.
E seria bom conhecer quem beneficiou desses avultados empréstimos, que não os pagou, e quem e com que base os autorizou.
Já não há pachorra para ouvir justificar o injustificável.
De tudo o que fomos ouvindo julgo que apenas valerá memorizar aquilo que foi dito pelo banqueiro António Horta Osório, e que reproduzo:
“O tema do BANIF é um assunto chocante e tem que ser devidamente explicado” porque “cada família portuguesa está a por mais de mil euros no banco depois de inúmeros sacrifícios que os portugueses fizeram” devendo “ser feita uma auditoria independente que mostre aos contribuinte portugueses exactamente que negócios foram feitos ... e dado que o mal está feito os contribuinte portugueses merecem pelo menos saber com transparência e com rectidão o que aconteceu ...”
Não poderíamos estar mais de acordo com estas afirmações.
Quer pela sua clareza, quer pelo teor de responsabilização que transmitem.
Culpas da gestão nas as haverá, politicas também não. Os “culpados” serão os contribuintes que terão que pagar para salvar as várias faces, dos depositantes, dos accionistas, dos gestores, dos políticos. Lamentavelmente é assim.
Este ano foi esta a prenda de Natal para os contribuintes portugueses.
Qual será a próxima?
Rui Mendes


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