sexta-feira, 23 de outubro de 2015

DUQUES E CENAS - Colaboração do Prof João Luís Nabo

                                                Os ditos da fofa (parte 1)



 Já me ando a repetir. Mas no preciso momento em que alinhavo estas ideias não sei se o meu futuro e o futuro dos meus vão estar dependentes de um governo dito de direita, se de um governo dito de esquerda. E isso preocupa-me. Ambas as possibilidades me preocupam. Gostaria de acreditar que qualquer um serviria para nos oferecer a estabilidade de que precisamos para a nossa vida. No entanto, pensar assim é atingir um nível de estupidez a que não me posso permitir. A minha fofa, consciente das minhas preocupações, regressou um bocadinho ao passado para concluir umas coisas que se para nós são óbvias, já tal não são para a maior parte dos portugueses que sofre, indiscutivelmente, de amnésia, autismo e síndrome de Estocolmo. E disse-me ela, um dia destes, à hora do jantar: “Se o governo PS de Sócrates pôs as máquinas a trabalhar e escavou o pântano, o governo PSD/CDS de Passos e Portas alargou o perímetro do dito e empurrou-nos lá para dentro. Por isso, como é possível os portugueses quererem, feitos borregos, que qualquer deles governe o país?” Calou-se pensativa. E exclamou entre duas garfadas de arroz de pato: “Ah! Já sei! O sofrimento nesta terra de passagem é garantia de salvação eterna!”
Sim. Nem no tempo do Salazar havia tanto misticismo e tantos mártires em regime de voluntariado.


                                Os ditos da fofa (parte 2)


Após quinze anos de propaganda eleitoral na televisão portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa (MRS) candidata-se ao mais alto cargo da nação. Isto se ainda existir nação quando chegarmos a Janeiro. E julgo que a sua primeira tarefa, em defesa dos valores da pátria e dos direitos dos portugueses (se ainda houver portugueses) é demitir o Governo, dissolver a Assembleia da República e convocar novas eleições. Se MRS for coerente com o que pareceu pensar e defender ao longo destes anos, vai ser esse o primeiro gesto de salvação nacional. Costa, Passos, Portas e outros estão manchados por anos de mau uso do poder público, por incumprimento constante e contínuo da sua palavra, pela mentira descarada e sem vergonha, pela falta de sentido cívico e social para com todos os que mais precisam.
A fofa, sempre atenta às minhas preocupações, levantou os olhos do cachecol amarelo-fluorescente que estava a tricotar e atirou, convencida: “Eu sei como é que esses políticos podiam recuperar a dignidade e o prestígio.” Saí do meu momento de repouso e abri, tímido, o olho direito. Sentindo-me atento, continuou: “Eu cá convidava os três para virem até cá e passearem o Balú.” Abri os dois olhos, acreditando que ela não estava a sentir-se grande coisa. E concluiu: “Quando as pessoas começassem a ver esses três em boa companhia, sei que muita coisa poderia mudar. Não é, Balú?” Desta vez, foi o labrador, pachorrento, que abriu um dos olhitos, soprando um uff!! ensonado. Eu fechei os meus e consegui pensar ainda antes de voltar a adormecer: “É capaz de ter razão… Amanhã telefono aos tipos.”

                                   Os ditos da fofa (parte 3)


As sondagens levadas a cabo antes das eleições são cada vez mais fiéis aos resultados oficiais. A malta cola-se ao televisor nas noites eleitorais não para saber quem ganhou, mas para comparar as percentagens atribuídas a cada força partidária com os números apresentados previamente pelas sondagens. E é, de facto, impressionante. Há uma diferença mínima, é certo, mas que não influencia o resultado final. A minha fofa andou a cismar nisto, porque desde a hora do almoço que não me dirigia a palavra. Chamei-a: “Vou mandar o Cloreto deste mês à D. Maria Manuel. Queres lê-lo?” Ouvi-lhe os passinhos curtos e leves, porém circunspectos: “Pode ser…” E leu. E concluiu: “Se as sondagens reflectem antecipadamente o resultado eleitoral, não vale a pena o povo ir às urnas. Não se consegue mudar nada…” Tinha razão.
Ouviu-se a campainha da porta. “Deixa-me ir abrir”, disse ela. “São aqueles três de que falámos há pouco.” Para mim: “Vai buscar o Balú e põe-lhe a trela.” Ainda a ouvi cumprimentar: “Boa tarde, senhores doutores. Esperem um bocadinho que o Balú já está quase pronto para o passeio. Aí vem ele. Ah! Doutor Portas, tem aqui uns saquinhos de plástico para… enfim, o senhor sabe… Pronto, divirtam-se e bom passeio. E se o Balú não obedecer às vossas ordens não lhe prometam nenhum osso extra. Ele é muito mais inteligente que muitos portugueses…”

João Luís Nabo - Professor


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