terça-feira, 2 de junho de 2015

CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE NA RÁDIO DIANA/FM

                                        Fair play e “no hard feelings”

Terça, 02 Junho 2015
Fair play significa jogar limpo e, em português, chega a ser “ter espírito desportivo”. O todo transforma-se na parte para se estender a várias áreas, ou seja, parte-se do princípio que o fair play é uma das características, muito particular, do desporto e usa-se como exemplo de comportamento para as restantes áreas da vida em sociedade e até privada. O fair play acaba a significar um modo leal de agir.
Por outro lado, e reconhecendo no mundo do desporto – mas não só – as posições entre adversários e apoiantes de adversários que, por vezes, se inflamam e levam a discussões a roçar os limites da ofensa em torno do assunto – e este detalhe é importante, porque se deveria no espírito do fair play ficar-se por esse assunto –, a expressão americana “no hard feelings”, que significa sem mágoas ou ressentimentos, entrou no léxico para além do desporto onde também começou. Por isso, às vezes usando outra área como metáfora também dizemos e ouvimos dizer “Amigos, amigos, negócios à parte”.
Ora o que se está a passar no mundo do futebol, mesmo ao mais alto e vasto nível mundial, com o já chamado “Fifagate”, o caso de corrupção na FIFA, fez-me refletir, e partilhar convosco, sobre uma mão-cheia de questões. O momento de ironia de toda esta história está também no facto de um dos lemas da FIFA ser “My Game is Fair Play” e de haver uma iniciativa baptizada com a expressão “fair playfinanceiro” criada pela UEFA, que tem como objetivo estabelecer um padrão de decência e honestidade financeira no futebol
Antes de mais dizer-vos que me parece que a conotação do fair playprimordialmente com o mundo do desporto tem a ver com o estabelecimento de regras rígidas para que o jogo, elemento necessário à condição da competição, possa funcionar com a equidade no tratamento das partes que jogam. E, bem entendido, com a penalização respectiva e também bem definida, da prevaricação e não cumprimento das regras. É rígido? É. Mas é assim que se defende quem, podendo ser o mais fraco ou estar em situação fragilizada, tem igualdade de tratamento.
Também me parece verdade, e numa segunda questão, que não é por se saber as regras e dizer muitas vezes que se age e deve agir de acordo com elas que não há, e muito, prevaricação. Há até os muito habilidosos em usar as palavras e os actos a que essas se referem de tal maneira que, contornando e prevaricando, parece que não o estão a fazer. Por vezes a técnica é mesmo a de vestir a pele de cordeirinho, alinhar no mesmo rebanho, e, abocanhando aqui e ali, ir agindo como um lobo sem o parecer.
Depois, este princípio de equidade, que a regra do jogo e o seu cumprimento em fair play devem garantir, quando é quebrado é, normalmente, quando se reverte o adágio popular do “Amigos, amigos” que, à frente de qualquer fair play faz funcionar o jeitinho e a atençãozinha ao que fôr, ou passar a ser, não se sabe até quando e onde, nosso amigo.
O que podemos dizer sobre esta inversão do fair play, agora neste caso concreto, no seu mundo primordial mas espelhando outros mundos, toda a vida aconteceu – com ou sem capitalismo, porque tem a ver com poder, com ilusões de imortalidade, com princípios de educação e civismo, com o sentido de comportamento ético que ou se pratica, e é visível, ou não e, talvez um dia, também seja visível e o crime não compense.
Este caso do “mundo da bola”, que também não é novidade, não nos deve é pôr a ter “hard feelings” com o mundo do desporto e da competição. Ensina-nos só, aos espectadores e seus verdadeiros amantes, que são vários os caminhos que alguns escolhem e que podemos escolher. É que a divertirmo-nos – origem do vocábulo “desporto” – também aprendemos.

Cláudia Sousa Pereira

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