segunda-feira, 7 de outubro de 2013

COLABORAÇÃO DR: JOSÉ LABOREIRO

                  Umas curtas palavras em jeito de recensão crítica

 «A Pátria está na liberdade e a riqueza mais segura no valor de cada um.»

(Viriato  -  citado por Diodoro Sículo) 
 Foi editado recentemente (com a coordenação de Jorge Fonseca e de Teresa Fonseca, e com a chancela das Edições Colibri) um interessante livro, em que são abordados cinco aspectos da História da I República em Portugal -  obra historiográfica que tomaria, precisamente, o título de “Cinco Olhares sobre a República”: tendo os trabalhos de pesquisa incidido sobre o movimento maçónico no Concelho de Montemor-o-Novo; sobre os parlamentares eleitos pelos círculos eleitorais do Alentejo; em redor do movimento emancipador das Mulheres - enquanto catarse da difusão da ideologia republicana; ou abordando os alicerces do Partido Republicano Nacionalista; terminando com o estudo do impacto da I Grande Guerra, no Concelho de Montemor-o-Novo. Ora, estes estudos, agora reunidos em livro, constituiriam os textos das Conferências proferidas na Biblioteca Municipal Almeida Faria e no Arquivo Municipal (em Montemor-o-Novo): palestras que celebrariam o Centenário da República em Portugal (num propósito cultural e cívico da cidade de Montemor-o-Novo).
            Lamentamos o facto de não ter sido possível inserir a conferência do Prof. Fernando Rosas, no livro que vimos referindo  -  uma vez que consideramos (embora todas elas nos tivessem preenchido o espírito) a conferência mais conseguida, mais entusiasmante e arrebatadora (porque mais articulada na relação causa-efeito da multiplicidade de factos e condicionalismos da História da I República)  -  ausência de Fernando Rosas na edição da Antologia, explicada aliás, durante o lançamento do livro na Biblioteca Almeida Faria.
            Incide este estudo antológico, com certo particularismo, sobre o “interland” de Montemor-o-Novo: atitude feliz, uma vez que Montemor-o-Novo vivenciou as esperanças e as expectativas do Movimento Republicano  -  como o comprova os cerca de 80 topónimos de Ruas, Travessas, Largos e Praças deste Concelho, designações toponímicas de inspiração republicana. Como feliz foi a edição desta Obra Historiográfica  -  uma vez que uma comunidade que apaga a sua memória, é uma comunidade morta; ou, por outras palavras, um país sem História não tem qualquer importância aos olhos dos outros países, no concerto das nações (como nos diz Joseph Hours in “O Valor da História”). É certo que foi curta a vigência da I República (com alguns desencontros e sombras que não permitiram a consecução dos ideais que acompanharam os republicanos do “31 de Janeiro”, da propaganda republicana em finais da Monarquia, dos parlamentares republicanos nas Cortes, do “5 de Outubro”, das vítimas da “noite sangrenta” de 19 de Outubro de 1921, dos que enfrentaram as incursões monárquicas (armadas pela monarquia espanhola), dos que generosamente combateram os alemães (e a sua ideologia arrogantemente ultra-conservadora) em França, na Bélgica, e no alto-mar). «O sonho comanda a vida»  -  dir-nos-ia mais tarde Gedeão. E, realmente, é mais fácil governar um povo sem sonho, alienado, sem mente pensante  -  daí as ditaduras.
            O propósito da I República era precisamente ginasticar as inteligências, instruir, consciencializar, aculturar, tirar a venda dos olhos aos 80% das pessoas analfabetas que recebera da Monarquia  -  no propósito de uma vida mais feliz. E, para isso, surgiram as Universidades de Lisboa e Porto, o desenvolvimento dos Politécnicos, apareceriam as Universidades Populares, a expansão do Ensino Primário, aparecem os livros de bolso, surgem revistas culturais (como a “Seara Nova”), divulgam-se Conferências, Concertos de Música Erudita (a baixo preço), Exposições de Artes Plásticas, Espectáculos de Ópera; com o Republicanismo, surge uma plêiade de escritores de cunho autenticamente democrático e português (como Junqueiro, Gomes Leal, António Patrício ou Raul Brandão, entre outros), surgem os livros infantis, emergem grandes oradores (como Cunha Leal, António José de Almeida, Afonso Costa, Alexandre Braga, Ramada Curto), surge uma Imprensa Livre; no campo da Ciência, surge o Instituto do Cancro, progride imenso a Psiquiatria, Ricardo Jorge faz avançar grandemente o combate às doenças infecto-contagiosas; os estudos aeronáuticos avançam com Gago Coutinho, Sacadura Cabral, Brito Pais e Sarmento de Beires. Avançam as leis de Família, as leis sindicais, a lei do divórcio.
            Durante os curtos 16 anos  -  altamente perturbados pelos inimigos da Democracia (os facciosismos, sobretudo os monárquicos e os dos proprietários mais poderosos)  -  muito foi feito (teremos de admitir) no campo da criação de consciências autónomas, de valores éticos e cívicos: sobretudo contra as circunstâncias, como  -  aquando da implantação da República  -  a da grande fuga de capitais, por parte das grandes famílias monárquicas. Só uma forte convicção política, cívica e ética republicana, poderia construir uma consciência democrática, que sobreviveria ao 28 de Maio de 1926 (o emergir da Ditadura do Estado Novo). E com a Ditadura, foram os Republicanos os únicos que pegaram em armas para recuperar a Democracia  -  anotaria e sublinharia Fernando Rosas, aquando do lançamento do seu recente livro “Salazar e o Poder”.
            Alain Touraine (in “Carta aos Socialistas”) adverte: “Aos conceitos de solidariedade e de subjectivação é necessário acrescentar o de diversidade. Trata-se aqui de um reconhecimento da alteridade, pois o “Alter” é aquele que é simultaneamente semelhante ao “Ego” e diferente dele. Reconhecer as diferenças não resolve nenhum problema e agrava muitos deles, ao passo que reconhecer a diversidade permite ver em cada indivíduo a presença do universal e necessariamente a do particular. É descobrir nos outros um esforço de subjectivação, que associa competências técnicas, uma imagem da liberdade, portanto direitos humanos fundamentais e uma pertença social.”
            Constitui esta advertência, um acto democrático  -  que não existiu, nem na fuga de capitais, nem nas incursões dos inimigos da República, nem no golpe de 28 de Maio que degenerou numa ditadura de 48 anos. Agostinho dos Reis Monteiro (in “Educação e Constituição de Abril”) põe em destaque o papel da Escola na formação do cidadão, essencial para enfrentar os ataques à Democracia; apontando ele que circunstâncias como segregação escolar, discriminação escolar, insucesso escolar, enfim o “massacre dos inocentes”, poderiam  -  enquanto autoritarismo opressivo  -  ser dirimido pelo trabalho de grupo, pelo esforço de dar lugar à livre expressão, pela instituição de assembleias gerais onde todos poderiam expor os seus pontos de vista e assumir responsabilidades.
            E seria esta a metodologia, que a I República pretendia institucionalizar  -  e que os inimigos da República inviabilizaram  -  face ao arrojo ideológico democrático.

José Alexandre Laboreiro



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